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Brasil

Cidade encantada

Um texto sobre Belo Horizonte, minha cidade que faz 114 anos

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Outra vez teve um sonho diáfano de retornar à cidade grande, outra vez viveu e esqueceu o remorso porque grande era a espera. Acordou sonhando o sonho que teve. Pescou em recortes sem saber onde começou e se terminou. Era uma casa em Belo Horizonte. Um verdadeiro parque de diversões de gramado verdinho, verdinho. Jabuticabeira empapuçada de menino e de mel, duas mangueiras que eram casas, um abacateiro lindo, grande e desafiador, um Ipê enorme reinava, de cores não identificáveis. Talvez as flores fossem vermelhas, quiçá róseas ou púrpuras.

Havia uma cisterna de pedras, sempre fechada. Galinhas, gatos, cachorros e até um veado-campeiro. Um laguinho e mães. Mil quartos, salas, cozinhas e gente. Gente velha, nova, grande, pequena e não nascida. Comida, só muita. Fumacinha de molho de tomate, ravióli, nhoque, cebola. A panela de pau mexia o doce de abóbora e outra recebia a laranja e o açúcar para o doce. Na geladeira, arroz doce e a nata para a manteiga. No congelador, sorvete de leite condensado. De repente, um galo de briga voou em suas costas. Não menos, virou jantar. Ordens da avó, dona da casa.

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A porta da garagem levava a um outro mundo: a rua e o seu povo que passava e passeava devagar. Rápido, tudo muito rápido e já era noite. E a casa havia mudado. Virou apartamento. E o quintal se desfez. À noite em BH havia uma substância magnífica que exalava de uma flor chamada “Dama da Noite”. Ele gostava dessa noite transformada pela solidariedade de uma prostituta em forma de uma flor cheirosa que só se mostrava na ausência do dia, quando abria sua pétala branca e odorava seu perfume. A Dama da Noite era uma mineirinha belorizontina de peles macias, parador dos sentidos e bálsamo para o espírito. Abrir e fechar de pétalas, as flores. Flores que eram recheadas de sorriso e caminhavam pelo mundo de pés descalços.

Eram Claudias Cardinales que flutuavam de vestido alvo em um filme de Fellini a transportar para outro lugar nessa mesma cidade. Uma Pasárgada sem Rei. A explosão de um beijo em uma pétala que se abria e fechava em seus dedos e mãos e bocas e línguas e que se abria e fechava. Belo Horizonte era a cidade das meninas mais lindas do seu mundo. Um encanto de fuga e encontro. A experiência da morte com Richard Bach no mergulho em um lago frio num dia de sol escaldante. Em outro de repente não era dia nem noite.

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No retrovisor do carro enxerga-se uma imagem envolta em uma nuvem cinza que permeia esse templo que um dia foi vasto e ficou no imaginário. A poluição. E os farrapos humanos se escondem em uma Pasárgada ao avesso. A cidade avança em sentido contrário à lentidão dos olhos inocentes. Olhares que percebiam cada esquina dessa cidade das esquinas. Cada face feliz dos homens e dos jardins, das mulheres perfeitas e dos amigos das ruas e dos bares. Cada tempo é de viver. Cada plano é de estar, ser. O tempo passa. Neste momento, o tempo passa. Daqui a pouco, vai ser ontem. Ouço minha vó e sua colher de pau mexendo o doce de abóbora.

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