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Brasil

Para Bolsonaro, a floresta em pé traz atrasos para o país, diz filha de Chico Mendes

“A visão do governo é que as conquistas ambientais nada significam. O Brasil precisa desenvolver de qualquer jeito, e todas as iniciativas de desenvolvimento sustentável e inclusivo para este governo significa um grande atrapalho”, afirma a ativista Angela Mendes à jornalista Marilza de Melo Foucher

(Foto: Cristina Uchôa/Glauco Faria)
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Por Marilza de Melo Foucher, especial para o 247 - Integrante da direção do Conselho Nacional para Populações Extrativistas e militante do Comitê Chico Mendes, a ativista ambiental Angela Mendes critica em entrevista ao 247 os retrocessos nas conquistas ambientais registrados durante o governo de Jair Bolsonaro. Para ela, o atual governo não se importa com as conquistas e se importa apenas com desenvolvimento, sem sustentabilidade. 

Angela Mendes é filha de Chico Mendes, conhecido mundialmente pelo seu compromisso sócio-político e ambiental, militante sindicalista e ambientalista que foi brutalmente assassinado em dezembro de 1988 em Xapuri-Acre, por ordem de um grande proprietário de terras. 

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Nesta conversa, ela relata a luta de seu pai e lança seu grito de alerta nacional e internacional contra as políticas sociais e ambientais nefastas para a Amazônia, que colocam em perigo as populações extrativistas, ribeirinha e indígenas. Ela denuncia também a destruição dos direitos fundamentais no território nacional. Confira a íntegra:

Me fale um pouco sobre sua trajetória.

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Sou Angela Mendes, filha de Chico Mendes, líder militante sindicalista e ambiental assassinado brutalmente em dezembro de 1988 por ordem de um grande proprietário de terras no Acre. Eu sou tecnóloga em gestão ambiental, milito no Comitê Chico Mendes e faço parte da direção do Conselho Nacional das Populações Extrativistas- CNS. O Comitê Chico Mendes é uma articulação em rede de amigxs, companheirxs militantes e sindicalistas criada pós assassinato de Chico para mobilizar a sociedade brasileira e internacional em torno da punição para os assassinos dele e seu companheiro Ivair Higino, morto 6 meses antes. O Conselho Nacional das Populações Extrativistas- CNS é um movimento criado no I Encontro Nacional dos Seringueiros, liderado por Chico Mendes em Brasília, no ano de 1985, objetivo continua sendo a organização e apoio na luta por políticas públicas para a população extrativista. Todos os anos do 5 ao 22 de dezembro o Comitê Chico Mendes organiza a Semana Chico Mendes.

Na terra de Chico Mendes, Bolsonaro ganhou as eleições para a Presidência do Brasil. Como explicar tal retrocesso?

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Na verdade, o Acre nunca deu a vitória para candidatos de esquerda. Aqui, Lula e Dilma sempre perderam as eleições e por último, Haddad. Nos últimos 20 anos a FPA-Frente Popular do Acre dominou o governo estadual com o PT na liderança, mas eu acho que precisamos dos analistas políticos para explicar isso, particularmente, eu não consigo encontrar uma resposta para essa pergunta, uma vez que tanto Lula quanto Dilma beneficiaram muito o Acre com programas importantes em seus governos. O estado do Acre mudou completamente com os governos petistas.

Hoje todos as conquistas ambientais parecem ameaçadas. Você poderia explicar o impacto desta nova visão anti-ambiental do governo Bolsonaro?

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Em primeiro lugar, deve ser enfatizado que a luta de Chico Mendes e seus companheiros resultou na criação de reservas florestais extrativistas florestais, que são áreas de uso para a conservação da biodiversidade e desenvolvimento sustentável. Esta iniciativa pioneira de reservas extrativistas gerou outros tipos de reservas, como reservas marinhas, reservas de desenvolvimento sustentável e florestas nacionais, projetos de assentamentos extrativistas e que juntos protegem 13,8 da Amazônia Brasileira e suas populações tradicionais. A produção extrativista concilia o desenvolvimento sustentável com a preservação dos recursos naturais e garante o bem viver equilibrando as energias da Amazônia, assim é a vida na floresta.

A relação dessas populações com a floresta vai além da questão de espaço geográfico, existe um forte componente espiritual, ancestral e cultural que faz essa ligação, assim como os povos originários. 

Para implementar as políticas públicas ambientais e sociais para as populações tradicionais do campo, floresta e das águas foi criado o Ministério do Meio Ambiente e especificamente para cuidar da gestão das Unidades de Conservação federais, entre elas as de uso sustentável surgiu o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade-ICMBio. Toda essa trajetória trouxe o Brasil para o patamar dos Países que mais evitava o desmatamento e referência na pauta ambiental mundial, liderando processos e iniciativas inovadoras. 

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Hoje, a visão do governo Bolsonaro é que todas essas conquistas nada significam, o Brasil precisa desenvolver de qualquer jeito, e todas essas iniciativas de desenvolvimento sustentável e inclusivo para este governo significa um grande atrapalho. A floresta em pé traz atrasos para o país. Por esta razão o governo de extrema direita de Bolsonaro se concentrou em desmantelar todo o arcabouço da política socioambiental brasileira, desestruturando o MMA-O Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade- ICMBio. O governo atual   aprovou inúmeros dispositivos de lei que visam enfraquecer a legislação ambiental, deste modo, ele satisfaz os setores do agronegócio e da mineração que tanto mal tem causado ao meio ambiente e à população, trazendo morte de rios e pessoas. Também é alvo da sanha anti-meio ambiente os povos Indígenas que há milênios cuidam da floresta e ouvimos de Bolsonaro que “índio não terá mais um centímetro de terra demarcada”. 

Isto representa um impacto negativo para mais de um milhão de meio de pessoas que vivem na floresta e traz insegurança, aumenta os conflitos e ameaças. Seu discurso anti-ambiental e em favor do agronegócio, desde o período de campanha acendeu uma luz verde para o avanço dos desmatamentos e conflitos pela posse da terra. Ele nomeou um Ministro de Meio Ambiente que tem forte ligação com as mineradoras e o setor do agronegócio e foi indiciado por improbidade administrativa e tem outros inquéritos em andamento. 

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O Ministro tem desmontado sistematicamente a agenda ambiental e países que fazem doação para garantir a redução do desmatamento já ameaçam abandonar o Brasil, o que em si já é um grande prejuízo, pois são recursos aplicados para fortalecer a cadeia produtiva de produtos da sócio-biodiversidade, incentivar a geração de renda através de processos sustentáveis, garantindo o desenvolvimento socioeconômico e ambiental da região com  base sustentável e responsável, garantindo os modos de vida das populações e sua relação ancestral com a floresta.

Os prejuízos com esses atos insanos do Ministro e os projetos de Leis que estão tramitando no Congresso Brasileiro através da bancada ruralista com aval do governo serão enormes considerando os últimos acontecimentos onde grandes empreendimentos da mineração tem causado danos irreparáveis ao meio ambiente e a vida humana como os casos de Mariana e Brumadinho, Barcarena, Tapajós e na zona costeira da Bahia.

Seu pai criou empates para frear a destruição da floresta no Estado do Acre. O que eram essas ações conhecidas por ‘mpates’?

O empate era um movimento pacífico de resistência em que um grupo de seringueiros se dirigia ao local do desmatamento para tentar através do diálogo e do convencimento fazer com que os operadores das motosserras desistissem de desmatar, normalmente eles, os serradores eram protegidos por jagunços armados; Meu pai organizou os seringueiros em uma resistência não violenta. Homens, mulheres e crianças formaram barricadas humanas para impedir que os fazendeiros, os madeireiros com seus tratores e motosserras destruíssem as árvores de seringa. Meu pai foi assassinado por causa de suas ideias e das ações dos “empates” para tentar acabar com o desmatamento da floresta. Essas ações pacíficas foram realizadas em muitos lugares no estado do Acre e ganharam adesões e legitimidade do povo. Seu sucesso lhe valeu muitos inimigos e ele sabia que ele havia se tornado um alvo humano. Foi por causa do Empate no seringal Cachoeira que impediu o novo proprietário Darly Alves de entrar nas terras que havia comprado para transformar em fazenda de gado que meu pai foi assassinado. Foi quando o estado enviou uma brigada policial para garantir a entrada de Darly.  Vale ressaltar que este último empate houve uma forte participação de mulheres e crianças das redondezas, a polícia repressora ofereceu um acordo e acabou permitindo com que o grupo ficasse no local até sair a sentença judicial contra Darly. Hoje, o antigo seringal cachoeira é projeto de assentamento extrativista.

Nessa época atuava aqui no Estado a União Democrática Ruralista-UDR, entidade dos ruralistas e cujo testemunho de Genésio Ferreira no livro PÁSSARO SEM RUMO escreveu que os representantes dessa entidade se reuniam frequentemente na fazenda de Darly para traçarem os planos de execução de Chico Mendes.

No atual contexto político, que tipo de ações militantes sua associação pensa desenvolver? Os empates voltarão?

O Comitê Chico Mendes, em 2017 criou seu Núcleo Jovem e vem trabalhando com ações de Educação e conscientização ambiental e direitos humanos nas escolas e comunidades, a interação com  as crianças e os jovens têm nos mostrado que é esse o caminho, o empate moderno vem na mudança de hábitos e paradigmas, no empoderamento e incentivo ao protagonismo dos jovens, na força que eles têm de mudar o mundo, assim como Chico deixou na mensagem da carta que ele escreveu para os jovens do futuro (você acha no google) e são esses jovens revolucionários que farão o empate do século XXI. O CNS também aposta muito nos jovens, tanto é, que desenvolve já a alguns anos no Amazonas o Projeto Jovens como Protagonistas do Fortalecimento Comunitário, e junto com o Comitê Chico Mendes e a WWF-Brasil também trouxe para os jovens da Resex Chico Mendes no Acre este projeto importantíssimo.

Que mensagem você gostaria de passar para os nossos leitores?

O meio ambiente brasileiro está sendo atacado de todas as formas possíveis, desde a liberação extremamente grande de agrotóxicos (que não são permitidos em outros países), exploração de áreas protegidas, facilitação de licenciamento ambiental e muitas outras ações coordenadas pelo governo. A destruição acelerada do meio ambiente pode acarretar sérios problemas em breve, não só para o Brasil, como para o mundo. Nesse momento, diante de tantas atrocidades, a mensagem é que nós, defensores do meio ambiente e da vida devemos alertar a população brasileira para as catástrofes que se anunciam. Temos que nos mobilizar pensando nas gerações futuras. Se hoje não conseguimos ecoar nossas vozes no Brasil, precisamos que o mundo nos ouça e nos apoie. Diante da insanidade de nossos governantes não podemos cruzar os braços. Os governos democráticos, antigos parceiros do Brasil não devem negociar com um governo racista, fundamentalista  e de extrema direita, chegou a hora de pressionar antes que seja tarde, em breve o governo Bolsonaro terá suas mãos manchadas do sangue de vítimas da sua insanidade, porque ele além de estar acabando com o meio ambiente também está através de medidas populistas criando o cenário para aumentar o número de mortes de acidente de trânsitos, onde o Brasil já é o quarto colocado num ranking mundial ele resolveu tirar a multa de quem não conduzir criança em cadeirinha, tirar a obrigação de exame toxicológico para caminhoneiros, entre outras aberrações. A pressão internacional é muito importante para garantir os direitos básicos no território nacional, e o acesso ao bem-comum tais como a água, alimentação, educação, saúde e ar que respiramos.

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