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Brasil

Sequestro de bebês foi uma das faces perversas da ditadura

A ditadura civil e militar, no Brasil, instalada em primeiro e dois de abril de 1964, como na Argentina [1976-1983], sequestrou bebês e raptou filhos de dissidentes políticos. Para entregá-los a militares e até a civis. Explosiva, a denúncia é do jornalista Eduardo Reina. Somente sob a Guerrilha do Araguaia, conflito que ocorreu de 1966 a 1975, teve um saldo trágico de 11 vítimas

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Por Renato Dias, da Editoria do DM Revista 

A ditadura civil e militar, no Brasil, instalada em primeiro e dois de abril de 1964, como na Argentina [1976-1983], sequestrou bebês e raptou filhos de dissidentes políticos. Para entregá-los a militares e até a civis. Explosiva, a denúncia é do jornalista Eduardo Reina. Somente sob a Guerrilha do Araguaia, conflito que ocorreu de 1966 a 1975, em terras de Goiás, atual Estado do Tocantins, no Maranhão e ainda no Pará, organizado pelo PC do B, o Partido Comunista do Brasil, inspirado nas ideias de Mao-Tsé-tung, líder da revolução socialista na China, em 1º de outubro de 1949, teve um saldo trágico de 11 vítimas. Dois são filhos de guerrilheiros, relata o pesquisador dos anos de chumbo. Tempos sombrios aqueles. No País e na América Latina. O total levantado até hoje é de 19 casos. Com mais duas apurações em andamento. Uma Política de Estado, define-a. De um Estado de Terror, observa, indignado. O segredo dentro do segredo da ditadura civil e militar brasileira, resume o escritor, de 55 anos.

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Leia a íntegra da entrevista:

A Argentina aponta a existência de 500 bebês sequestrados sob a ditadura civil e militar País - 1976-1984. Quais os números no Brasil -1964-1985?

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Eduardo Reina - Até agora consegui levantar a existência de 19 casos de sequestro e apropriação. De filhos de oposicionistas ao regime civil e militar [1964-1985]. Há outros casos que tive contato nas duas últimas semanas e que  precisam ainda ser apurados.

Os bebês da Guerrilha do Araguaia [ 1966 – 1975] totalizam quanto?

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Eduardo Reina - São 11 casos relativos à Guerrilha do Araguaia. Sendo seis filhos de camponeses, que eram adolescentes. Dois filhos de guerrilheiros e outros três sequestrados que não têm relação direta com os guerrilheiros. Há o caso de Juracy, sequestrado por engano [pensavam que ele era o filho do líder dos guerrilheiros Osvaldão] e Miracy, irmão de Juracy. Existe também o sequestro de Yeda, irmã por parte de mãe de Giovani - este sim filho de Osvaldão, com uma mulher da localidade.

Existem filhos de guerrilheiros urbanos na lista?

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Eduardo Reina - Na lista dos 19 não há filhos de guerrilheiros urbanos. Mas há o caso de Iracema, de Pernambuco, cuja mãe era filiada ao PCB. Moravam em Recife.

Como a tortura, tratava-se de uma Política de Estado?

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Eduardo Reina - Sim, era uma Política de Estado. De um Estado de Terror. O sequestro dos filhos de oposicionistas era o segredo dentro do segredo da ditadura civil e militar brasileira. As vítimas de sequestro eram um butim de guerra nas mãos dos militares. Tinham prioridade máxima de captura.

Humberto Castello Branco, Arthur da Costa e Silva, a Junta Militar, Emílio Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Baptista de Oliveira Figueiredo sabiam das operações?

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Eduardo Reina - Pelo que pude ler em livros de militares e com entrevistas de alguns dos presidentes militares, eles deviam conhecer essas operações. A cadeia de comando toda tinha conhecimento do que estava sendo realizado.

 

 

Existem documentos comprobatórios dos sequestros?

Eduardo Reina - Há documentos de algumas das vítimas que mostram o crime. Por exemplo. Juracy Bezerra de Oliveira foi levado do Araguaia para Fortaleza. Lá, o tenente Antônio Essílio o registrou como filho legítimo. Mas na certidão de nascimento aparece o nome da mãe biológica de Juracy, Maria Bezerra de Oliveira. O certificado de batismo de Juracy, numa igreja na região do Araguaia, registra o nome da mãe biológica e do pai biológico. O próprio Juracy conta a história dele, sequestrado por engano. Certidão de nascimento de Rosângela Serra Paraná aponta irregularidades desde a data de nascimento até o suposto local de nascimento. O documento cita local de nascimento como Rua Marques de Abrantes, 160, Flamengo, Rio de Janeiro, em 1963. Mas o local onde teria ocorrido o nascimento dela pertence à Rioprevidência desde 1958. Nada a ver com a família apropriadora. Assim como muitos casos na Argentina, a mãe apropriadora de Rosângela não podia ter filhos. O pai era militar, de uma família inteira de militares. O pai apropriador prestava serviços a Ernesto Geisel.

 

Como chegou às fontes?

Eduardo Reina  - Longa e árdua procura. Duas décadas de pesquisas. Elas se intensificaram a partir de 2015. Pós-2016 consegui ter acesso às vítimas e a seus familiares.

 

Os bebês eram adotados por militares ou civis próximos à caserna?

Eduardo Reina- Os dois casos.

 

Qual a reação psicológica das vítimas após descobrirem as suas reais identidades?

Eduardo Reina – É muito complicado. Essas pessoas ainda têm muito medo de represálias. De eventuais consequências. Sofrem muito com as lembranças. Rosângela foi muito maltratada pela família apropriadora. Iracema tem sequelas pelo corpo da tortura que sofreu no DOI-CODI em Recife, quando ficou presa com a mãe. Juracy tem sequelas na mão esquerda, com três dedos atrofiados por causa da tortura que sofreu quando foi sequestrado. Lia Cecília adora a família que a adotou. Lia é filha de Antônio Teodoro de Castro, o Raul, guerrilheiro no Araguaia. Foi levada para um orfanato em Belém, que pertencia a um militar da Aeronáutica. Foi adotada por um casal que administrava o local. Lia adora os pais adotivos. Mas procura descobrir quem era sua mãe biológica.

 

O elo foi retomado com os seus familiares biológicos?

Eduardo Reina - Juracy encontrou sua mãe quando tinha 20 anos de idade. Ele voltou de Fortaleza para o Araguaia. Ele e a mãe, Maria Bezerra de Oliveira, foram procurar o irmão Miracy, que foi levado para Natal pelo sargento Lima, do Exército. Maria morreu em 2013 ou 2014, atropelada,  em São Geraldo do Araguaia. Rosângela procura desesperadamente quem é sua mãe biológica. Antônio Viana da Conceição, irmão de Giovani por parte de mãe, crê que não conseguirá encontrar mais Giovani e a irmã Yeda.

 

 

Existe caso em Goiás?

Eduardo Reina - Não. Em Goiás, não.

 

Os números estão subestimados?

Eduardo Reina - Creio que o número de vitimas de sequestros pode ser maior do que o que está relatado em ‘Cativeiro Sem Fim’ (19). Já fui procurado por pessoas que contam seus casos. As suas histórias. Trágicas. Que agora precisam ser apuradas. São mais do que 19 casos, que podem ser ou não incluídos nesse rol.

 

Jair Messias Bolsonaro determinou a celebração do golpe de Estado Civil e Militar de 1964. Qual a relação da resolução do Palácio do Planalto para a construção da Memória, Verdade e Justiça?

Eduardo Reina - Já esperava atitudes como essa. Para quem tece referências a um torturador como Carlos Brilhante Ustra, isso era de se esperar. Com certeza, o trabalho de construção da Memória, Verdade e Justiça terá mais obstáculos a partir de agora. Mas o trabalho vai continuar, em nome daqueles que ficaram invisíveis, escondidos, durante todo esse tempo. 

 

 

Perfil

Nome completo - Eduardo Reina

Idade - 55 anos

Formação - Jornalista

Livros já publicados -  Autor do romance "Depois da Rua Tutoia", lançado em abril de 2016; do livro de contos policiais "No Gravador", lançado em 2003. Integrante dos livros "O Conto Brasileiro Hoje", Volume 5, de 2007, e "Contos e Casos Populares" {introdução de Paulo Freire], 1984. Também atuou como ghost writer em livro-biografia nos últimos anos

 

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