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Cultura

Zulu Araújo: "o racismo estrutural brasileiro possui várias formas de se expressar"

Em entrevista à TV 247, o ex-presidente da Fundação Palmares no segundo governo Lula chamou a atenção para o uso da expressão “mestiçagem”, que ele considera “a negação da presença negra na sociedade” e uma forma de dizer que não existe racismo no Brasil. Assista

Zulu Araújo (Foto: Divulgação)
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Por Ricardo Nêggo Tom - Na semana em que se comemora o Dia da Consciência Negra, o programa “Um Tom de resistência” recebeu o arquiteto e mestre em Cultura e Sociedade Zulu Araújo. O dia 20 de novembro é tido por ele como um “símbolo” de resistência. Zulu explica que “essa data traz três questões importantíssimas. A primeira delas resgata a figura de Zumbi como o grande líder do quilombo dos Palmares, que em 1965 confrontou com o império português e representou a grande trajetória de luta pela liberdade em nosso país. O dia 20 de novembro foi o dia no qual ele foi assassinado pelo mercenário Domingos Jorge Velho, na Serra da Barriga, em Alagoas. A segunda questão é nós tratarmos o dia 20 de novembro com a grandeza que ele merece. Ou seja, tratar da necessidade que a comunidade negra e a sociedade brasileira têm de se conscientizar sobre a gravidade, os danos e os estragos que o processo escravizatório promoveu no Brasil. É importante que neste dia possamos discutir, refletir e debater ideias que nos levem a superar definitivamente os resquícios da escravidão no Brasil, assim como as sequelas que essa escravidão deixou. Particularmente, a discriminação racial, o preconceito e o racismo. Por fim, acho que a data recolocou em seus devidos lugares personagens da nossa história. Zumbi foi para o lugar onde ele deveria estar. O de herói brasileiro. E a princesa Isabel foi para o lugar onde deveria estar. A de membro da oligarquia brasileira”.

Zulu entende que “não era mais factível que a sociedade brasileira, principalmente a comunidade negra, ainda colocasse a Princesa Isabel como referencial maior da luta de combate à escravidão no Brasil” e lembrou da importância que alguns integrantes do movimento negro tiveram para resgatar o protagonismo de Zumbi nesse processo. “Fomos buscar na história e tivemos a ajuda de pessoas importantes como Oliveira Silveira, que foi um timoneiro, um líder. Mas ele teve um grupo chamado “Palmares”, que começou esse estudo lá no Rio Grande do Sul. Também no Rio Grande do Sul, tinha o escritor e historiador Décio Freitas, que fez um livro magnífico chamado “Guerra dos Palmares”, no qual relatava toda a trajetória daquele quilombo, toda a luta travada, desde Ganga Zumba até chegar a Zumbi, e a importância que tudo isso teve para a história do Brasil. E isso estava apagado da história. Aliás, tem sido uma prática na história da sociedade brasileira, a elite desse país tentar apagar parte da história do nosso povo. Tentou apagar parte da história do povo indígena, do povo negro, e tem tentado apagar parte da história da população periférica e mais pobre do país. Acho que o 20 de novembro simboliza tudo isso. E é importante dizer que agora não é apenas um dia, é o mês da consciência negra. E eu espero que, em breve, estejamos celebrando o ano da consciência negra”.

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O racismo estrutural e o mito da democracia racial também estiveram em pauta na entrevista. O atual presidente da Fundação Pedro Calmon falou sobre discriminação racial e exclusão social, sob a ótica da mestiçagem. Resgatando uma entrevista concedida por ele ao programa “Roda Viva” em 2010, onde ele foi questionado a respeito de o então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ter se declarado mestiço, o que, na avaliação da jornalista que o entrevistava, colocava um fim à racialização na política, Zulu avalia que “o racismo no Brasil possui características singulares. O racismo que hoje chamamos de estrutural possui muitas vicissitudes, muitas formas e muitos jeitos de se expressar. E precisamos estar atentos a elas. No Brasil, o uso da expressão “mestiçagem'” não significa a mistura de raças, não significa a mistura de segmentos distintos da sociedade. Significa, na verdade, a negação da presença negra. Era isso o que estava querendo dizer naquela ocasião. E a jornalista ao fazer a pergunta, o que ela estava era afirmando esse tipo de pensamento que existe na nossa sociedade. Quando os conservadores dizem que a sociedade é mestiça, eles estão querendo dizer que não existe racismo no Brasil”.

A atual gestão da Fundação Palmares, que tem Sérgio Camargo como presidente, também mereceu a atenção de Zulu Araújo. O ex-presidente da instituição enxerga a administração de Camargo alinhada com a ideologia do governo de Jair Bolsonaro e avaliou como negativa a sua presença à frente da entidade. “Eu quero analisar em duas partes. A primeira, para dizer que, mais uma vez, a questão da consciência negra se coloca em pauta. Não necessariamente é a cor da pele que estabelece se uma pessoa é progressista, socialista, de esquerda ou de direita. O que faz com que ela seja progressista, socialista, direitista ou fascista é a sua consciência. É aquilo que ela tem como visão de mundo. Eu avalio a Fundação Palmares hoje do mesmo modo como avalio o governo Bolsonaro. Um governo eleito a partir de estratégias nefastas para a nossa democracia. Desde o golpe contra a presidenta Dilma, até a prisão de Lula para impedi-lo de participar da eleição. Esse governo reuniu um grupo de lideranças sociais que acreditam no racismo, na discriminação, na misoginia e sobretudo na violência como mecanismos de relações interpessoais e interinstitucionais. Para mim não é nenhuma surpresa o desempenho que ele está tendo. Estranho seria se fosse diferente, fazendo parte de um governo como esse”.

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