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Economia

Brasil mais perde do que ganha com o Brexit

Christina Terra, professora da Essec Business School, de Paris, ressalta que o acordo entre o Mercosul e a União Europeia prevê cotas de importação que foram negociadas com a presença de Londres no bloco. Agora, esses números podem ser revistos para baixo, com a saída dos britânicos

Boris Johnson e Sajid Javid (Foto: Aaron Chown/Pool via REUTERS)
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Lúcia Müzell (RFI) - Na longa novela em que se transformou o Brexit, uma etapa crucial será vencida nesta semana: o acordo negociado por Boris Johnson no Reino Unido será ratificado no Parlamento europeu e, dois dias depois, em 31 de janeiro, Londres sai oficialmente da União Europeia. Inicia-se então um período de transição até 31 de dezembro, durante o qual os britânicos tentarão negociar um acordo comercial com o bloco europeu, que deve ser o principal parceiro econômico do antigo sócio. Qual será o espaço de oportunidades para o Brasil neste novo cenário?

De um dia para o outro, o Reino Unido estará de fora de todos os tratados que o beneficiavam junto aos europeus. O professor Kai Lehmann, de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), observa que a pressa em ampliar o leque de parceiros coloca os britânicos numa posição de fraqueza na mesa de negociações.

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“Eu acho que o Reino Unido vai desesperadamente procurar parceiros comerciais a partir de agora e, ainda mais, a partir de 2021. Por conta disso, vai ceder às demandas das grandes potências comerciais”, afirma o pesquisador alemão, que viveu 15 anos na Inglaterra. “O maior mercado do Reino Unido, e o mais próximo, é a União Europeia”, resume.

Concorrente de peso: Estados Unidos

Do outro lado do Atlântico, o presidente americano, Donald Trump, um dos maiores incentivadores do Brexit, já reiterou que não vê a hora de fechar um acordo bilateral com Londres, a quinta maior economia do mundo. Paralelamente aos europeus, essa deve ser a prioridade número 1 do premiê Boris Johnson, em busca mais apoio político para o Brexit.

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“Seria muito importante porque poderiam dizer que têm uma coisa que a União Europeia até hoje não tem. Já o Brasil, nem o Mercosul, não estão nessas conversas. Fala-se em China, Índia, Nova Zelândia, Austrália”, constata Lehmann.

Ou seja, os países do Commonwealth também passariam antes da América Latina, aos olhos dos ingleses. Os investimentos diretos dos britânicos no Brasil minguaram desde os anos 1950, e hoje se concentram no setor energético. Além disso, o comércio entre Londres e Brasília é pouco relevante: o Reino Unido flutua entre a 15ª e a 17ª posição no ranking das exportações brasileiras, com menos de US$ 2,7 bilhões exportados de janeiro a novembro de 2019, segundo dados oficiais.

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Mercosul trava perspectivas de acordo

A eventual ampliação dessa parceria é limitada, uma vez que o Brasil tem fraca margem de manobra fora do Mercosul, relembra a economista Christina Terra, professora da Essec Business School, de Paris.

“Em termos de acordo, o Brasil nunca pode negociar sozinho porque a união aduaneira determina toda tarifa externa dos países do Mercosul com o resto do mundo”, ressalta. “E sabemos que as relações entre Brasil e Argentina não estão das melhores atualmente, já que a Argentina está com um governo não muito liberal.”

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Mesmo que houvesse abertura dos dois lados, nada garante que o processo seria rápido. Os diálogos entre o Mercosul e a União Europeia levaram 20 anos – e ainda não estão distantes de uma conclusão definitiva.

“Historicamente, o Reino Unido é mais liberal do que a União Europeia, portanto existe a perspectiva de, ao fazer um acordo diretamente com o Reino Unido, ele seja mais benéfico para a gente do que os que se consegue com a União Europeia. Entretanto, Londres é mais liberal mas tomou essa decisão de sair da União Europeia”, destaca Christina, autora de Finanças Internacionais: Macroeconomia Aberta. “Ou seja, é muito difícil de saber o que poderia sair dessas negociações.”

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A professora ressalta ainda que o acordo entre o Mercosul e a União Europeia prevê cotas de importação, que foram negociadas com a presença de Londres no bloco. Agora, esses números podem ser revistos para baixo, com a saída dos britânicos.

Economia à prova do Brexit

O timing de uma discussão com o Mercosul também não será bom tão cedo, afirma o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves. A consolidação do Brexit não significa o fim dos problemas para Londres – muito pelo contrário.

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A estabilidade da libra e a solvabilidade da dívida serão o foco da política econômica pós-saída do bloco europeu. A expectativa é que, pouco a pouco, o Banco da Inglaterra reverta as medidas emergenciais tomadas logo após o referendo, em especial o aumento dos juros.

“O peso da libra no mercado financeiro europeu é muito grande, e oscilações importantes no valor da libra podem ter efeitos muito complicados”, sublinha Lima Gonçalves. “Essa defesa da City foi importante, mas eles não poderão manter esses juros em uma situação em que a atividade econômica já foi prejudicada e vai se prejudicar ainda mais – afinal, no curto prazo, pelo menos, o Brexit é muito ruim para a economia inglesa.”

O horizonte no Reino Unido inspira pouco otimismo a Kai Lehman, já que o Brexit deixou o país dividido e abriu feridas que talvez não cicatrizem. Agora, a consolidação do processo traz um alívio momentâneo, mas as preocupações sobre o futuro logo baterão à porta.

“O Brexit é uma expressão de uma divisão social, política e até geográfica muito mais profunda, com as questões da Escócia e da Irlanda do Norte. Isso não acabou e nem vai acabar”, avalia o pesquisador da USP. “Não vai ter um colapso imediato do Reino Unido. Será um processo bastante lento, mas ainda assim bem claro, de declínio – como o que houve após a Segunda Guerra Mundial.”

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