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Economia

Pochmann: um Brasil de bicos e trambiques

Há 60 anos, Celso Furtado lastimou a vida rural pobre e improdutiva, em que se cultivava só para subsistir. No país empobrecido de hoje, fenômeno adentrou as cidades. Entre o informal e o ilegal, precarização tornou-se cotidiano das maiorias

(Foto: REUTERS/Amanda Perobelli)
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Por Marcio Pochmann em Outras Palavras - A segunda metade da década passada registra inédita inflexão no comportamento da economia brasileira. Após ter atingido a maior quantidade de bens e riqueza produzida ao longo de sua história, a economia nacional ingressou na rota do decrescimento, tendo sido o Produto Interno Bruto de 2020 inferior ao do ano de 2014 em 7,5%.

Em resumo, o Brasil conseguiu a proeza de produzir 600 bilhões de reais de bens e serviços em 2020 a menos do que produziu no ano de 2014. Se a medida for o dólar corrente dos Estados Unidos para avaliar o desempenho do Brasil, a queda foi de 44%, pois o PIB do país declinou de US$ 2,5 trilhões, em 2014, para US$ 1,4 trilhão, em 2020.

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Como a população, nesse mesmo período de tempo, aumentou em 10 milhões de pessoas, passando de 201,7 milhões de habitantes em 2014 para 211,7 milhões de residentes em 2020, a renda nacional, quando dividida pelo conjunto da população, decresceu 10,7%. Em 2020, por exemplo, a renda per capita nacional foi de R$ 35,2 mil, enquanto em 2014 havia sido de R$ 39,4 mil, significando, caso não houvesse desigualdade na distribuição da renda nacional, a perda de R$ 4,2 mil nos últimos seis anos, jamais vista em toda a história republicana.

A consequência direta disso tem sido a inimaginável regressão social. Seja em qualquer dimensão considerada, o sentido tem sido o mesmo, com indicativos do crescimento nas taxas de pobreza em 92,9% e de desemprego aberto em 113,8% entre 2014 e 2020. Com a queda do emprego assalariado formal em 10,6 milhões de postos de trabalho nos últimos seis anos, a inserção da juventude no mercado de trabalho se tornou ainda mais difícil.

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No ano de 2020, por exemplo, um a cada grupo de três jovens (18 a 24 anos) estava desempregado, ao passo que em 2014 era de um a cada seis jovens. Nesse contexto de verdadeiro desespero social, as formas crescentemente precárias de vida tomaram conta do quotidiano da sociedade brasileira, especialmente a mais vulnerável.

A viração, o bico, a trambicagem, entre outras situações, ganharam expressão, como no caso da quantidade de trabalhadores desalentados (desempregados de longa duração que não mais conseguem procurar por trabalho) que foi multiplicada por 3,4 vezes entre 2014 e 2020. Como também a situação dos trabalhadores subutilizados (conceito do IBGE para definir quem ainda segue procurando emprego, embora consiga capturar alguma renda por trabalho eventual para sobreviver), cujo salto foi de 15,3 milhões de pessoas, em 2014, para 32 milhões de brasileiros, em 2020.

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Foi a partir disso que a expressão “economia de subsistência”, outrora adotada para se referir ao generalizado atraso social no meio agrário brasileiro, passou a adquirir significados na atualidade da regressão da sociedade brasileira, sobretudo urbana. Por economia de subsistência considera-se a produção que, mesmo sendo realizada, mostra-se incapaz de gerar excedente econômico, tendo em vista a quase ausência de produtividade.

No passado, por exemplo, Celso Furtado reconhecia como economia de subsistência parte importante da agropecuária brasileira funcional ao conjunto da população sobrante, depositária de enormes contingentes da pobreza e desemprego (Formação econômica do Brasil, 1959). Também expressaria, em geral, as fases da desagregação de atividades dinâmicas como, no passado, o esgotamento dos ciclos exportadores do açúcar e da mineração. O fim da escravidão, tendo em vista a forma como se realizou, tornou-se gerador de bolsões populacionais sobrantes aos requisitos da acumulação capitalista da época.

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Mesmo sendo parcela da força de trabalho que poderia ser atraída a baixo preço por empregadores, prevalece a ausência de oportunidades ocupacionais. Diante disso, o contingente de população sobrante se vê obrigada a dedicar o tempo disponível para buscar qualquer forma possível de financiamento da sua própria subsistência e de seus dependentes.

A estagnação ou letargia econômica que atingiria o país seria o desaguador do atraso a condenar parcelas expressivas da população ao retrocesso nas condições de vida, conforme observado atualmente. Sem dinamismo produtivo, o país reproduz crescentes bolsões depositários da força de trabalho sobrante às necessidades da acumulação capitalista dominante, dispersas por atividades praticamente sem produtividade, muitas delas concentradas em resíduos expansivos da ilegalidade.

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