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Autoridades debatem denúncias de maus-tratos em abrigos para crianças

Vereadores visitaram alguns abrigos, e puderam constatar problemas que serão reunidos em um relatório em fase de elaboração; a parlamentar Fernanda Melchionna (PSOL) compareceu a quatros abrigos e constatou um problema envolvendo a questão da educação; ao encontrar crianças fora da escola, foram informados de empecilhos burocráticos, como falta de histórico escolar ou necessidade de laudos de saúde mental; além disso, a falta de recursos humanos foi destacada na audiência promovida pelas Comissões de Direitos Humanos, do Consumidor e Segurança Pública (Cedecondh) e Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da Câmara de Porto Alegre

Vereadores visitaram alguns abrigos, e puderam constatar problemas que serão reunidos em um relatório em fase de elaboração; a parlamentar Fernanda Melchionna (PSOL) compareceu a quatros abrigos e constatou um problema envolvendo a questão da educação; ao encontrar crianças fora da escola, foram informados de empecilhos burocráticos, como falta de histórico escolar ou necessidade de laudos de saúde mental; além disso, a falta de recursos humanos foi destacada na audiência promovida pelas Comissões de Direitos Humanos, do Consumidor e Segurança Pública (Cedecondh) e Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da Câmara de Porto Alegre (Foto: Leonardo Lucena)
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Débora Fogliatto, Sul 21 - Durante mais de quatro horas, um encontro promovido pelas Comissões de Direitos Humanos, do Consumidor e Segurança Pública (Cedecondh) e Saúde e Meio Ambiente (Cosmam) da Câmara de Porto Alegre debateu a rede de abrigagem de crianças e adolescentes na cidade. A reunião foi motivada por denúncias de que estariam acontecendo casos de maus-tratos nos locais e pelas visitas feitas por vereadores em alguns abrigos, nas quais puderam constatar problemas que serão reunidos em um relatório em fase de elaboração.

A vereadora Fernanda Melchionna (PSOL), que preside a Comissão e foi aos abrigos, contou que durante as visitas às casas Sabiá 9, Sabiá 7, João de Barro, Quero-Quero e Casa Lar Sol Nascente foi constatado um problema envolvendo a questão da educação. Ao encontrar crianças fora da escola, foram informados de empecilhos burocráticos, como falta de histórico escolar ou necessidade de laudos de saúde mental. Além disso, a falta de recursos humanos foi destacada durante toda a audiência, criticada tanto pelos próprios representantes da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) quanto pelos outros poderes e entidades. Já há uma lei aprovada que prevê a contratação de mais de 600 funcionários para a Fasc, mas essas nomeações estão bastante atrasadas em relação ao cronograma original.

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Há ainda problemas de estrutura e superlotação, como foi constatado no Sabiá 9, onde há 52 crianças e adolescentes — quando a lotação seriam 20 — e dois chuveiros não podem ser ligados ao mesmo tempo. Na teoria, as crianças ficariam no máximo dois anos sob tutela do Estado, mas, na prática, há casos de jovens que cresceram nos abrigos. Isso acontece por uma série de defeitos em várias etapas relacionadas à questão dessas crianças, e uma das mais destacadas pelos presentes foi o fato de ser necessário mais investimento em outras áreas, que poderiam evitar a ida para a rede de acolhimento.

“Muitos casos que estão nos abrigos poderiam estar nas suas casas se houvesse política de habitação, mais centros de atenção psicossocial, tratamento de redução de danos para álcool e drogas, atendimento de saúde mental. É um conjunto de políticas que poderiam garantir que ficassem no seu lar e tivessem atendimento antes da retirada”, apontou Fernanda. Ela ainda criticou que o poder Executivo gasta apenas 0,42% de seu orçamento com essa rede de acolhimento. Atualmente, são mais de mil crianças que vivem em 62 abrigos na cidade.

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Denúncias 

Denúncias de maus-tratos em abrigos foram trazidas por Ariane Leitão, vereadora suplente da bancada do PT e integrante do Coletivo Feminino Plural, que contou ter ouvido de ex-funcionárias de abrigos relatos preocupantes sobre a situação das meninas que lá vivem. “Há denúncia de exploração sexual de meninas de dentro do abrigo, que saem para se prostituir sendo menores de idade, no abrigo Sabiá 3, e ainda meninas grávidas sem atendimento específico. E no abrigo Sabiá 1 foi relatado o abuso sexual de uma menina especial por educandos”, contou.

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O coletivo elaborou um dossiê com todas as violações das quais têm conhecimento, com 14 encaminhamentos. Ela ainda mostrou uma reportagem em que é possível ouvir gritos vindos de dentro de um abrigo e um ex-funcionário relata que se trabalha doze horas sem intervalo, com apenas três pessoas para 30 crianças. Há ainda falta de xampu, sabonete, roupas, itens de higiene e apenas uma pessoa para lavar todas as roupas. “Está havendo descumprimento legal do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), da Constituição, das normas técnicas de funcionamento da abrigagem”, constatou Ariane.

O problema fundante, apontou ela, é a falta de prioridade de orçamento. Isso voltaria a ser repetido por diversos participantes da reunião. “Estamos vendo que espaços são de violação de direitos e falta de oportunidades. Por que a comunidade não pode participar do dia a dia das crianças? Eles ficam trancados dentro do abrigo? Hoje elas não têm direito à liberdade garantido”, apontou.

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Da mesma forma, Leila Thomassin, servidora da Fasc e diretora do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa) contou que os trabalhadores têm feito muitas denúncias em relação à precaridade das condições de trabalho. “Criamos um projeto de lei que cria 600 cargos, hoje a estrutura da Fasc tem 800 cargos vagos. Previa que fossem chamados 70 este ano. Foram chamados 5, 6 trabalhadores e saíram 69”, relatou. Com a falta de servidores, são contratados, algumas vezes, funcionários terceirizados, o que é visto com preocupação por ela. “A terceirização é um problema sério, gera precariedade de direitos de trabalho e, como há muita rotatividade, não permite criação de vínculos”.

O fato de haver mais de mil acolhidos é “muito grave”, conforme apontou José Carlos Sturza, do Conselho Nacional da Criança e Adolescente. “Na teoria, existe possibilidade de acolhimentos curtos, com duração de poucos dias e reavaliação da situação. A abrigagem com audiência de seis em seis meses é para ser apenas em casos mais graves, não para todos”, destacou. Ele também criticou o fato de os próprios usuários da rede não estarem sendo ouvidos, nem os egressos, durante a reunião. A vereadora Fernanda destacou que a Comissão está montando uma recomendação de mecanismo intermediário de oitiva permanente para dialogar com os menores abrigados.

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Representando o Conselho Tutelar, Remo da Silveira contou que há dez conselheiros que visitam entidades para vistoriar o funcionamento das casas. “Eu já estive presente em espaços em que vi adolescentes que foram agredidos por monitores com soco no olho e não tinha nem boletim de ocorrência, nem tinha chamado médico. Também constatamos que crianças e adolescentes encaminhadas pelo Judiciário estariam fora das escolas”, narrou. Ele destacou que os funcionários não são culpados, mas sim o gestor, que “deixa de investir em políticas públicas na área da infância e não valoriza e não capacita funcionários”.

Um dos grandes problemas atuais é que a “porta de entrada é muito larga e a de saída, muito estreita”, conforme apontou a defensora Cláudia Aparecida de Camargo Barros.  “Estamos trabalhando em uma forma de diminuir a porta de entrada, porque acolhimento deveria ser excepcional, mas hoje é quase regra. Se fará uma espécie de audiência de custódia para o acolhimento. Se um adulto preso tem direito de ir na frente de um juiz, mais ainda uma criança ou adolescente”, disse.

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A ideia é que, após o acolhimento, seja realizada um audiência com toda a rede, a família da criança, Ministério Público, Defensoria e a criança. “Esse grande número de acolhidos nos envergonha perante o país. Precisamos de capacitação permanente, de que pode sim ser trabalhado retorno com vínculos familiares”, afirmou.

A Promotora da Infância e Juventude do Ministério Público Cinara Vianna Dutra Braga trouxe uma série de críticas em relação a diversos setores da assistência a crianças e jovens. O órgão fiscaliza a cada quatro meses as casas, buscando corrigir problemas existentes. Atualmente, há apenas uma juíza responsável pela Vara da Infância e Juventude, com quase cinco mil processos. “Há falta de juiz, além de técnicos. Tudo o que passa pelo juizado precisa de avaliação técnica de assistente social e psicólogo. Ouço todos os dias as crianças e adolescentes, e querem voltar para casa ou ser adotados. Querem direito à convivência familiar e é isso que temos que preservar”, apontou.

Ano passado, foram realizadas apenas 40 adoções, nesse ano até junho foram 17. Todas elas são referentes a bebês em idade de berçário. “São 1332 crianças, mas tem ainda 200 jovens adultos que completam 18 anos e continuam na rede e não tem para onde ir, como deficientes mentais, por exemplo”, citou. Ela também falou da importância de se priorizar esses casos de problemas de saúde mental, visto que há apenas dois locais para atendimento de menores na cidade, onde os jovens precisam ficar aguardando junto com adultos.

Mudança de modelo

O presidente da Fasc, Marcelo Soares, afirmou que não falta capacitação de funcionários, mas reconheceu que faltam condições paara mais investimentos. “Hoje, o acolhimento institucional é a prioridade número 1 da fundação. Não vamos fugir desse compromisso. Vamos mudar o modelo, este modelo está superado de núcleos de casas. Vamos trabalhar casa por casa, de forma individualizada”, anunciou, dizendo ainda que “os melhores quadros” da fundação serão colocados em cada uma. Ele também afirmou que as imagens de maus tratos mostradas “não são de agora”. “Eu também não concordo [com maus tratos], mas existem situações que são desvios de conduta e o que vamos fazer? Trabalhamos com pessoas. Quem tem que dizer como tem que ser feito é a gestão, porque depois quem paga o preço somos nós”, disse.

Da mesma forma, Marta Borba, também representando a Fasc, garantiu que as casas “não são fechadas” e contou que o trabalho é constante, como atualmente a adequação de uma casa para onde recentemente um abrigo foi transferido. Ela também disse que há uma contradição de determinações, pois jovens que são egressos de medidas socioeducativas deveriam ser colocados em casas junto com os outros, mas isso não é sempre aceito. “A gente luta muito para que normas técnicas  sejam implantadas, mais duas casas especiais foram criadas para dar conta daquela realidade de ex-internos da Fundação Socio-Educativa (Fase) . Mas temos que ter espaço que não discrimine, pela legislação atual”, contou. “Como lidar com meninos que agridem, que trazem droga pra dentro da casa? Queremos muito fazer discussão com diversos atores para dar conta dessas contradições”, questionou.

Também o vereador Kevin Krieger (PP), que já foi presidente da fundação, contou que o problema tem sido o grande número de acolhimentos, visto que a quantidade de casas para receber essas crianças dobrou desde 2009. Apesar de admitir que o cronograma de contratações está atrasado, lembrou que “as pessoas que saíram esse ano ainda estão sendo pagas”e, por isso, novas ainda não foram nomeadas. “A situação do município é difícil, e do Estado e país mais ainda”, constatou, referindo-se ao âmbito financeiro.

Encaminhamentos

A vereadora Sofia Cavedon (PT) sugeriu que seja realizado um seminário escutar os educadores dos abrigos. Já o presidente da Cosmam, Marcelo Sgarbossa (PT) mencionou a questão da saúde mental, pedindo que seja avaliada a inclusão do tema no seminário que a Cosmam realiza anualmente. Já Fernanda Melchionna afirmou que a comissão irá encaminhar o relatório que está elaborando sobre a deficiência dos serviços. “Vai ser oficiada ao Executivo municipal a necessidade do comprimento do reordenamento da Fasc, em relação ao concurso público dos cargos que foram aprovados pela Câmara, em dezembro de 2013. A questão do investimento em saúde mental também será cobrado, além dos casos de abuso sexual que estão sendo enviados ao Ministério Público”, relatou.

 

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