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Pedido de tropas federais para Porto Alegre é factóide e inconstitucional, diz jurista

Para o jurista José Carlos Moreira, pedido do prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan (PSDB), para que o Exército e a Força Nacional de Segurança estejam na cidade no próximo dia 24, data do julgamento do ex-presidente Lula no TRF-4, 'faz parte da estratégia de ampliar o preconceito e o ódio contra os movimentos sociais e seus adversários políticos"; segundo ele, o pedido é inconstitucional, assim como todo o processo político-judicial-midiático que agora tem como principal alvo o ex-presidente Lula

Para o jurista José Carlos Moreira, pedido do prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan (PSDB), para que o Exército e a Força Nacional de Segurança estejam na cidade no próximo dia 24, data do julgamento do ex-presidente Lula no TRF-4, 'faz parte da estratégia de ampliar o preconceito e o ódio contra os movimentos sociais e seus adversários políticos"; segundo ele, o pedido é inconstitucional, assim como todo o processo político-judicial-midiático que agora tem como principal alvo o ex-presidente Lula (Foto: Paulo Emílio)
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Do Portal da CUTO pedido do prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan (PSDB), para que o Exército e a Força Nacional de Segurança estejam na cidade no próximo dia 24, data do julgamento do ex-presidente Lula no Tribunal Regional Federal da 4º Região (TRF-4), 'faz parte da estratégia de ampliar o preconceito e o ódio contra os movimentos sociais e seus adversários políticos".

A afirmação foi feita ao Portal da CUT, pelo jurista José Carlos Moreira. Segundo ele, o pedido é inconstitucional, assim como todo o processo político-judicial-midiático iniciado com o impeachment da presidenta Dilma Rousseff e que agora tem como principal alvo o ex-presidente Lula. "Falta maturidade aos poderes públicos e discrição ao Judiciário", afirma.

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"Para o Judiciário, na Lava Jato vale o estado de exceção", avalia Moreira.

"O que está em jogo no Brasil é o Estado Democrático de Direito. Aqui, o Judiciário fala sobre o que está julgando, fala sobre a vida política do país. Um magistrado não pode estar exposto à mídia, tem que ter discrição e cumprir suas funções com imparcialidade", diz Moreira, professor de Pós-Graduação em Ciências Criminais na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e ex-vice-presidente da Comissão Nacional de Anistia, onde também atuou como conselheiro por 10 anos.

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Confira a íntegra da entrevista:

Portal da CUT – Como o sr. avalia o pedido do prefeito de Porto Alegre para que tropas do Exército e da Força Nacional de Segurança sejam deslocadas para a cidade no dia 24 de janeiro, data do julgamento do processo do ex-presidente Lula pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região?

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José Carlos Moreira – É uma atitude totalmente precipitada e injustificada dos pontos de vista jurídico e político. O artigo 142 da Constituição prevê a possibilidade de interferência das Forças Armadas, mas sem abrir mão do comando civil sobre elas e em casos bem específicos. O artigo foi regulamentado pela lei complementar 95/1999, que deixa ainda mais claro que o comando é civil. O sistema policial é atribuição constitucional dos governos estaduais. E essa atribuição também está clara na Operação de Garantia da Lei e da Ordem, que estabelece que as Forças Armadas podem ser acionadas desde que haja, de fato, uma grande ameaça à segurança, como uma calamidade pública ou uma guerra civil, por exemplo. Elas também podem ser acionadas, a pedido dos governos estaduais, quando o sistema de segurança estadual não estiver com efetivo policial e de equipamentos suficientes.

Portal da CUT – Com base nesses preceitos, há consistência no pedido do prefeito Nelson Marchezan Júnior?

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José Carlos Moreira – Não. Tudo isso mostra a inadequação do pedido do prefeito. Se fosse o caso, caberia ao governo estadual fazer a solicitação, se não tivesse condições de garantir a segurança e precisasse de apoio. Além disso, o governo do Rio Grande do Sul já havia anunciado que fará um esquema especial de segurança no dia 24. Não há nenhuma calamidade que justifique a presença das Forças Armadas. E o próprio ministro da Defesa já disse na imprensa que não cabe ao prefeito fazer tal pedido.

Portal da CUT – A motivação, então, também é política?

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José Carlos Moreira – Creio que sim. É para ampliar o preconceito contra os movimentos sociais organizados, levantando a suposição de que vão promover balbúrdias e depredações. Mas não há no histórico dos movimentos sociais nada que indique que eles promovam quebra-quebra. A prova disso é que em maio de 2017 houve uma grande manifestação pacífica em Curitiba, quando o ex-presidente Lula foi depor na 13ª Vara Federal. Não houve nenhum incidente. O que está por trás do pedido do prefeito de Porto Alegre é o interesse político-ideológico, já que ele é do PSDB e vinculado ao MBL [Movimento Brasil Livre]. É um ato demagógico para continuar mostrando o seu perfil, com declarações para instigar o ódio e a violência, demonizando grupos sociais para destruir seus adversários políticos.

É uma representação totalmente inadequada, que coloca em risco o direito constitucional de manifestação, que deve ser garantido.

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Portal da CUT – Mas a manifestação no Parque da Harmonia foi proibida pelo juiz federal Osório Ávila Neto...

José Carlos Moreira – O Parque Harmonia é público e sempre recebeu manifestações. A Constituição garante o direito de manifestação em espaços públicos. Portanto, é uma decisão questionável.

Portal da CUT – O que está acontecendo com os poderes públicos?

José Carlos Moreira – Os poderes no Brasil não têm mostrado maturidade. O caso de Porto Alegre é exemplo claro: o Executivo pede a presença das Forças Armadas; no Legislativo, é votado um projeto de lei proibindo manifestações; e no Judiciário, um magistrado proíbe manifestação no Parque da Harmonia. Eles todos são agentes públicos que não compreendem o sentido da democracia.

Portal da CUT – Quando isso passou a ficar evidenciado?

José Carlos Moreira – Desde a ruptura constitucional com o impeachment fraudulento da presidenta Dilma Rousseff, que colocou o resultado da eleição em segundo plano. Quando a garantia da democracia foi rompida, infelizmente tudo pode acontecer. No campo do Legislativo, até é compreensível a postura de parlamentares de tensionar seus adversários políticos e onde é bastante comum a aprovação de leis inconstitucionais. Mas quem tem que controlar isso é o Judiciário. Infelizmente, as instituições superiores da Justiça têm falhado e dão péssimos exemplos.

Portal da CUT – O processo contra o ex-presidente Lula é exemplo?

José Carlos Moreira – Sim. Há clara violação do processo legal, com condenação sem provas e com o uso de métodos altamente questionáveis, até mesmo com a forma como as delações premiadas são usadas. A sentença do juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba contra Lula é estarrecedora. A narrativa que a justifica tem uma série de problemas de lógica e se baseia em provas inexistentes, a partir de depoimento de réu confesso [Leo Pinheiro, empreiteiro da OAS], condenado há mais de 30 anos de prisão e que vinha negando o vínculo legal do ex-presidente Lula com o apartamento do Guarujá. Depois de uma delação premiada informal, quando acabou acusando sem provas o ex-presidente, sua pena foi reduzida para dois anos (e logo mais estará em liberdade).

Portal da CUT – Qual sua expectativa em relação ao julgamento no TRF-4?

José Carlos Moreira – O relator da Operação Lava Jato no TRF-4 [desembargador João Pedro Gebran Neto] já deu mostras que tem compactuado com estratégias infundadas. E há outros precedentes preocupantes, como o julgamento de representação disciplinar apresentada por um coletivo de advogados questionando a postura do juiz Sérgio Moro nos casos dos grampos em escritórios de advogados e da divulgação da escuta telefônica entre a presidenta Dilma e Lula. Por 13 votos a um, o TRF-4 negou a representação, por entender que ali e na Operação Lava Jato não cabiam regras normais. Argumentaram que se tratava de situação excepcional, usando como argumentação autores que falam em estado de exceção, como o nazista Carl Schmitt. Ou seja, na sentença, disseram que na Lava Jato vale o estado de exceção.

Portal da CUT – Há mais indícios preocupantes?

José Carlos Moreira – Sim. Os magistrados não podem estar expostos à mídia, porque o que rege a Justiça é a discrição. Mas, quando o processo contra o ex-presidente chegou ao TRF-4, o presidente do Tribunal [desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores] fez elogios à sentença de Sérgio Moro, sem ter lido o processo. Outro exemplo é quando o relator do processo anuncia à imprensa que terminou o seu voto no processo, coincidentemente um dia depois de pesquisa eleitoral que mostrou a ampliação da vantagem do candidato Lula em relação aos demais. Foi um indício de que estão fazendo o máximo para julgar o caso antes das eleições. E quando o revisor examina o processo em tempo muito curto, para mim é um sinal claro do que está por vir. Sem falar que o julgamento foi marcado ainda no período de férias coletivas do Tribunal, quando apenas casos excepcionais deveriam ser julgados.

Portal da CUT – O que o senhor espera, então?

José Carlos Moreira – Tudo indica que há um direcionamento negativo para o julgamento do processo. Se a decisão for unânime (três votos), Lula ficará impedido de se candidatar. Mas, se for por maioria (dois a um), cabem recursos chamados embargos infringentes, que impedem a aplicação dos efeitos da lei da Ficha Limpa sobre a candidatura. Nesse caso, mais magistrados da Corte poderão ser envolvidos, o que pode indicar outro caminho. Enfim, espero que prevaleça o bom-senso jurídico e que os fundamentos político-midiáticos sejam enterrados. A Justiça não pode se deixar influenciar por esse jogo, que tem colocado em risco o Estado Democrático de Direito.

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