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'Legalização zerou mortes ligadas à droga no Uruguai'

Afirmação é do secretário Nacional de Drogas do Uruguai, Julio Heriberto Calzada, que participou nesta segunda-feira 2 de debate na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado; ele disse que a legalização talvez aumente o número de usuários, mas que a combinação com outras ferramentas de política pública pode reduzi-lo; na semana passada, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) afirmou que o Legislativo não pode mais fugir da discussão sobre legalização da maconha

Afirmação é do secretário Nacional de Drogas do Uruguai, Julio Heriberto Calzada, que participou nesta segunda-feira 2 de debate na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado; ele disse que a legalização talvez aumente o número de usuários, mas que a combinação com outras ferramentas de política pública pode reduzi-lo; na semana passada, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) afirmou que o Legislativo não pode mais fugir da discussão sobre legalização da maconha (Foto: Gisele Federicce)
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Agência Senado - O Uruguai conseguiu reduzir a zero as mortes ligadas ao uso e ao comércio da maconha desde que o país adotou regras para regulamentar o cultivo e a venda da droga, afirmou Julio Heriberto Calzada, Secretário Nacional de Drogas do Uruguai. Ele participou de debate na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).

Em resposta ao senador Cristovam Buarque (PDT-DF), Calzada disse que a legalização da maconha talvez aumente o número de usuários, mas ele acredita que a combinação com outras ferramentas de política pública, em aspectos culturais e sociais, poderão modificar padrões de consumo e levar ao êxito na redução de usuários.

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Conforme relatou, o país assegura o acesso legal à maconha por meio de autocultivo, com até seis pés por cada moradia; pela participação de clubes de cultivo, com 15 a 45 membros; ou pela aquisição a partir de um sistema de registro controlado pelo governo.

No debate, o secretário afirmou que respostas efetivas para a questão das drogas dependem de clareza na delimitação do problema. Ele apresentou aos senadores perguntas que devem ser respondidas: Qual é a questão central das drogas? O foco deve estar na substância? Nas pessoas? Na cultura? Na sociedade? Na política? Na geopolítica? Nas normas? Na fiscalização do tráfico ilícito?

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Os países, disse o secretário, devem ter em conta que as substâncias – tabaco, maconha, heroína, cocaína – não são iguais e devem ser analisadas em suas particularidades e tratadas conforme o conjunto de aspectos referentes a cada uma. Pela grande complexidade do problema das drogas, disse, o Uruguai busca embasar suas ações em evidências científicas.

Conforme avaliou, a criminalização de usuários de drogas seria ineficiente por fazer com que cidadãos passem a ser tratados como viciados ou dependentes. Uma das consequências, disse, é o sistema de saúde ficar refratário a essas pessoas. Dados citados pelo secretário dão conta de que mais de 90% dos usuários de drogas não buscam ajuda no sistema de saúde.

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Calzada afirmou ainda que, como outras drogas, como álcool, por exemplo, há riscos e efeitos colaterais negativos com o consumo de maconha, o que requer regulação e controle do Estado.

A audiência desta segunda-feira (2), que conta com participação popular pelos canais de interatividade do Senado, é a primeira de um ciclo de debates promovido pela CDH para ouvir autoridades, lideranças sociais e intelectuais, visando embasar o parecer da comissão sobre proposta de iniciativa popular (Sugestão 8/2014) que define regras para o uso recreativo, medicinal e industrial da maconha.

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Também participam do debate a coordenadora-geral de Combate aos Ilícitos Transnacionais do Ministério das Relações Exteriores, Márcia Loureiro; o representante do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime no Brasil, Rafael Franzini Batle; o relator da Sugestão 8/2014, senador Cristovam Buarque (PDT-DF); e a presidente da CDH, senadora Ana Rita (PT-ES).

Cristovam considerou o debate desta segunda-feira positivo, mas disse que tem nas mãos o que considera um "abacaxi muito grande". O parlamentar afirmou ainda não ter uma posição em relação ao assunto, mas teme entrar para a história como o senador que liberou a droga. "Não quero esse carimbo", disse (leia mais aqui).

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Cristovam: o Legislativo não pode mais fugir da discussão sobre legalização da maconha

Desde que assumiu a tarefa de coordenar uma discussão no Senado a respeito da liberação e regulação da maconha, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) viu-se diante de alguns dilemas. O principal deles tem a ver com a marca que o distingue na política. "Gastei muitos anos de vida para ser o senador da educação. Não quero o carimbo de 'senador que liberou a maconha'. Se tiver de colaborar para isso, salienta, será por "uma obrigação histórica", da qual não possa correr, como explicou em entrevista concedida à Agência Senado na quinta-feira (28).

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O Parlamentar diz considerar "um abacaxi" o relatório que terá de elaborar para a Comissão de Direitos Humanos (CDH) sobre a Sugestão 8/2014, proposta apresentada por um cidadão por meio do Portal e-Cidadania. Apoiada por de 20 mil pessoas em nove dias, a 'sugestão' habilitou-se a uma possível conversão em projeto de lei. A ideia vai a debate nesta segunda-feira (2) em audiência pública na CDH, da qual participará o secretário Nacional para as Drogas do Uruguai, Julio Cazada.

Enquanto o debate não se completa, pois pretende ouvir especialistas de diversas áreas - médica, educacional e jurídica, por exemplo -, Cristovam promete manter uma posição de equidistância entre os favoráveis à liberação e os proibicionistas. Por isso, pediu a elaboração de um estudo detalhado à Consultoria Legislativa do Senado, que já lhe entregou o resultado. Para o parlamentar, o essencial é que a sociedade amadureça uma decisão com vistas a um plebiscito e assuma os riscos da liberação ou da proibição. Sobre as pressões inerente à posição de relator de um assunto polêmico, o senador revela alguma situações curiosas que passou a viver. Uma delas é o pedido recorrente de "libera, Cristovam", que ouve nos corredores a Universidade de Brasília (UnB), instituição da qual já foi reitor e onde ainda dá aulas.

Após avaliar o relatório dos consultores, o senhor já tem uma opinião firmada?

Cristovam Buarque - O estudo é um dos mais bem feitos que já recebi da Consultoria. Mas prefiro não considerar isso suficiente para decidir. Vou tomar muito cuidado e nem vou me deixar levar por um sentimento pessoal que tenho. Ou, na verdade, que não tenho, porque tenho uma ambiguidade em relação ao assunto. Tenho que ouvir muitas outras vozes. Vozes críticas, por exemplo. Há pessoas que defendem o uso de medicamentos originados da maconha, mas são contra a regulamentação do consumo para divertimento.

Quem são essas vozes a serem ouvidas?

Cientistas, gente da área de saúde, usuários e pessoas que representam, digamos, o sentimento moral da sociedade, porque isso também quero levar em conta.

Igrejas?

Sim, embora não seja isso que vá decidir. Se fosse por aí, não teríamos divórcio no Brasil até hoje, porque a igreja era radicalmente contrária a uma lei assim.

Mas o senhor acredita que a sociedade está pronta para caminhar nesse sentido? Pode-se considerar a liberação da maconha uma evolução?

Não vamos chamar de evolução. Os jovens estão prontos para uma posição de regulamentação do uso da maconha. A sociedade inteira, eu já não sei. Acredito que quando o assunto for realmente colocado em pauta as igrejas vão se manifestar. Quando o aspecto moral pesar, acho que a pressão contra esse projeto vai ser grande.

É o caso de se fazer um plebiscito?

Sim. O Brasil faz pouquíssimos plebiscitos. Sou favorável a plebiscitos até naquilo que me horroriza o risco do resultado. Por exemplo, sou favorável a um plebiscito sobre pena de morte. Vou fazer uma imensa campanha contra, mas quero ouvir o povo. Quero ouvir o povo sobre a redução da maioridade penal, embora eu vá morrer defendendo a idade penal como está. Da mesma forma, a obrigatoriedade do voto. Sou contra o voto facultativo, mas sou favorável ao plebiscito e cabe a mim tentar convencer as pessoas de que a eleição é um processo pedagógico do qual elas são obrigadas a participar.
O que seu eleitor espera do senhor em relação a esse tema?

Não tenho ideia. Tenho muitos votos na juventude e imagino que eles sejam favoráveis à liberação. Quando ando pelos corredores da UnB [Cristovam é professor da Universidade de Brasília] vez ou outra ouço gritos: "Libera, Cristovam". Mas meu eleitor não é só esse jovem de cabeça aberta. Tenho muitos eleitores evangélicos, católicos. E, embora eu me ache avançado de ideias, sou muito quadrado na minha vida pessoal.

Entre regulamentação para alguns usos, descriminalização regulamentada e liberação total, onde o senhor mais enquadraria seu voto?

Não sei ainda. Mas há um detalhe. Acho que a liberação total da maconha seria um risco muito grande, não só em relação à própria maconha, mas em relação a todas as drogas. Até o cigarro e o álcool têm regulamentação. Por exemplo, a proibição de publicidade de cigarro, a advertência sobre o consumo de cerveja, a lei seca nas eleições, as embalagens com imagens de vítimas do produto no caso do cigarro.

O que pesa mais na sua consciência de legislador? As questões mais objetivas, como a saúde pública, ou de ética e moral?

Algumas perguntas têm respostas objetivas: a regulamentação aumenta o consumo? Diminui a violência? É bom para a medicina? Resolvidas essas três perguntas científicas ou racionais, sobra uma, a da moral. A sociedade está preparada? É uma decisão que leva em conta valores, e não só dos legisladores, mas do povo.

Então, respondidas as questões objetivas sobre a maconha, pode acabar sendo uma questão de moral?

Não sei. Não vou me antecipar.

O estudo da Consultoria enumera 12 pontos positivos na liberação da maconha, como o aumento de receitas tributárias, a redução da evasão de divisas, a melhoria da qualidade do produto. Também há argumentos negativos, como a sobrecarga da Previdência Social. O que mais importa?

Não há resposta fechada. Veja que até a sobrecarga da Previdência seria relativa. Tem gente que acredita que a descriminalização regulamentada da maconha baixaria o preço do produto, e assim os usuários do crack, que vêm pesando consideravelmente a seguridade social, migrariam para a maconha [que tem efeitos menos danosos que o crack]. Mas resta saber se a maconha vai barrar a ida ao crack ou, pelo contrário, será uma porta para o consumo de drogas mais pesadas.

E o que fazer diante desse tipo de dúvida?

Talvez, correr riscos e ver o que vai acontecer.

O estudo indica que 26% dos estudantes universitários declaram usar maconha e que 8% podem ficar dependentes. Como professor que vive o cotidiano da universidade, o senhor acha que o livre acesso à maconha pode alterar essa proporção?

Não é bom ter nenhum dependente. Mas quantos são dependentes de álcool? Quantos são dependentes de cigarro? A pergunta é: em que a maconha é pior do que o álcool e o cigarro? A maconha leva ao uso de outras drogas mais pesadas do que o álcool leva e o cigarro leva?

O que causa mais inquietação na análise desse tema?

Tenho quatro perguntas fundamentais que precisam ser bem resolvidas: A regulamentação aumenta o consumo e, portanto, a dependência numa parte dos que consomem? Segunda: a maconha é uma porta de entrada para outras drogas? Tenho escutado opiniões muito conflitantes em relação a isso. Terceiro: seu uso realmente tem impacto positivo ou negativo na saúde? Ela provoca lesões ao cérebro? Em maior ou menor proporção que o álcool? E quarto: a maconha diminui a violência porque acaba com o tráfico?

O estudo distingue usos farmacêutico, industrial e recreativo da maconha. Uma possibilidade é fazer uma liberação parcial, por exemplo, apenas para uso em medicamentos?

Pode existir a separação de usos, porque uma coisa é liberar o uso medicinal e as pesquisas de laboratórios, ainda que continue proibido o uso recreativo. Mas aí é preciso ver os argumentos para a proibição do uso recreativo. Tem gente que fica bem porque toma Valium. Tem gente que fica bem porque fuma maconha. A pessoa tem direito de querer ficar bem. Mas o que temos de ver: quem fuma maconha fica tranquilo? Ou fica violento? Porque, se gerar violência, a sociedade tem o direito de se defender e não liberar. Mas, aparentemente, a violência gerada pela maconha está mais no tráfico [por ser ilegal]. Então o automóvel [dirigido por uma pessoa bêbada] pode ser muito mais perigoso que a maconha.

E se esse "direito de ficar bem" onerar a saúde pública?

Sim, a sociedade tem de zelar pela saúde das pessoas inclusive proibindo substâncias danosas ou onerosas para elas e para o Estado por essa razão.

Isso passa por uma questão de ordem moral?

Sim. O Brasil passa hoje por quatro grandes temas morais que precisamos começar a discutir. São eles: drogas, aborto, eutanásia e doação automática de órgãos, mesmo que sem o consentimento da pessoa morta ou da família. São assuntos muito polêmicos dos quais os legisladores geralmente fogem por serem desastrosos eleitoralmente. Mas tem hora em que é preciso pensar na história, e não na próxima eleição.

O senhor tem dito que não vai se candidatar mais a cargo eletivo após o fim do atual mandato [em 2019]. Isso proporciona maior liberdade para tomar um a posição?

Muito mais. Estou muito mais livre. A pessoa chega a uma idade em que não precisa continuar na vida política, ela tem o direito de se aposentar. Não vejo obrigação de sair do Senado carregado num caixão.

O senhor tem duas filhas. O que elas pensam sobre a liberação da maconha?

Que eu saiba nunca experimentaram drogas. Talvez elas sejam tão caretas quanto eu.

O senhor tem medo do que essa matéria pode virar? De vir a ser conhecido como "o senador que liberou a maconha"?

Tenho (pausa). Eu gastei muitos anos de vida para ser o senador da educação. Não quero o carimbo de "senador que liberou a maconha". Se eu tiver de colaborar para isso, é por uma obrigação histórica da qual não posso correr. Eu sinceramente não gostaria de ter assumido esse relatório [na CDH]. Para mim ele é um "abacaxi" muito grande. Não pedi, não queria, e pensei em recusar. Quer uma das razões pelas quais não recusei? Contei para minha mulher em casa e a Gladys [esposa do senador] me disse que eu não tinha direito de ficar na história como quem fugiu de um tema que a juventude precisava que fosse discutido.


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