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Mundo

'López Obrador é um Lula mexicano'

O jornalista Dario Pignotti entrevistou o analista político mexicano Julio Hernández Astillero, sobre as eleições deste domingo, nas quais Andrés Manuel López Obrador, uma espécie de Lula mexicano, aparece como grande favorito

'López Obrador é um Lula mexicano' (Foto: REUTERS/Ginnette Riquelme)
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Por Darío Pignotti, na Carta Maior Andrés Manuel López Obrador é o favorito para vencer as eleições deste domingo no México, como Luiz Inácio Lula da Silva é o favorito para vencer as do Brasil, em outubro. Essa é só uma das semelhanças entre o líder do Morena (Movimento de Regeneração Nacional) e o ex-presidente brasileiro.

"Em efeito, Obrador e Lula tem vários pontos em comum, os dois são rejeitados pelos Estados Unidos, que os trata como populistas, e também pelas elites dos seus países", afirma Julio Hernández Astillero, um dos analistas políticos mais influentes do México.

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"A Televisa (oligopólio televisivo) detesta López Obrador, o atacou permanentemente através de notícias falsas ao longo desta campanha, e o mesmo aconteceu em 2006 quando houve uma fraude clara para impedir que López Obrador chegasse à presidência. Tenho entendido que os grandes meios de comunicação do Brasil também prejudicam sistematicamente o Lula. São duas personalidades progressistas, que têm grande apelo popular, não posso falar mais do Lula porque não tenho informação suficiente do Brasil", reforça o comentarista do canal Rompevientos e do diário La Jornada, o diário de esquerda mais importante da América Latina.

O encerramento da campanha de López Obrador, na quarta-feira passada, no Estádio Azteca, foi um evento apoteótico, com uma vibração comparável às finais das Copas do Mundo de 1970, vencida pelo Brasil de Pelé, e de 1986, conquistada pela Argentina de Diego Maradona.

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"Foi um ato espetacular, impressionante pela multidão a favor de López Obrador, mas além do impacto das cenas também foi importante pelo discurso do candidato, com menções às causas históricas da esquerda mexicana, um discurso menos pragmático que o usado ao longo da campanha. Este discurso final no Estádio Azteca foi mais ideológico, foi o discurso de um homem que já falou como presidente da República, como se já estivesse eleito", comentou Hernández Astillero em sua coluna televisiva.

E agregou: "devemos estar atentos neste domingo, porque ainda não sabemos se o sistema vai a reconhecer seu triunfo, se permitirá que haja eleições com liberdade, sem a interferência do crime organizado, e que se respeite o voto popular".

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O fantasma da fraude

O candidato do Morena tem entre o 40 e 50% das intenções de voto, segundo todas as pesquisas realizadas por institutos privados, que não são simpáticos a López Obrador, com uma folgada vantagem sobre os conservadores Ricardo Anaya (25%), e José Antonio Meade (20).

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Julio Hernández Astillero falou com a Carta Maior sobre o cenário político do México na véspera de uma mudança que pode repercutir no resto da América Latina.

Carta Maior: Teme que haja fraude?

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Julio Hernández Astillero: Os demônios da fraude estão por perto. Se o México pudesse ter uma campanha normal, López Obrador já seria considerado vencedor, pela vantagem que tempo sobre o representante do Partido da Ação Nacional (PAN) Ricardo Anaya, que é impossível de virar, e também pelo clima que o país vive, claramente a favor dele. Mas no México isso não basta para ganhar. Temos um sistema eleitoral de muito baixa qualidade democrática, dominado pelas máfias.

Apesar dessa sensação de que o México inteiro espera a vitória de Obrador e de sua proposta de mudanças, até pela insatisfação generalizada com o atual regime, ainda há um segmento social que se agarra ao medo e parece estar disposto a tentar todo tipo de fórmula para impedir o triunfo de um personagem ao que eles consideram demagogo, populista e mentiroso. López Obrador já foi vítima de uma fraude escandalosa em 2006, a favor do conservador Felipe Calderón, do PAN, e agora pode haver outro, através da maquinária política do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que está no governo, com o presidente neoliberal Enrique Peña Nieto, cujo representante é Meade, que está em terceiro. O PRI e o PAN formam um sistema que alguns chamam PRI-AN, é um grupo que tem um grande peso económico e o apoio dos grandes meios de imprensa, como o canal Televisa, e do crime organizado. O sistema PRI-AN transformou o Estado numa cova que alberga corruptos mesclados aos tecnocratas neoliberais, além dos últimos dois presidentes, Felipe Calderón e Enrique Peña Nieto, o México não merece ser governado por alguém tão medíocre como Peña Nieto, um ninguém, casado com uma estrela de telenovelas da Televisa, que carece de qualquer prestígio. Ele será lembrado como o incompetente que recebeu Donald Trump com tapete vermelho.

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Narcopolítica

Carta Maior: O narcotráfico está em campanha?

Julio Hernández Astillero: O crime organizado, do narcotráfico e do tráfico de pessoas, aterroriza o país há anos, e evidentemente é um fator de poder político e social nos estados onde atua. São grupos que gozam de impunidade, porque têm nexos comprovados com os partidos no poder, o PRI e o PAN. O narcotráfico pode fazer uso do seu poder de intimidação, para que as pessoas nos povoados rurais não votem, ou utilizar sua influência econômica para financiar candidatos dóceis. E depois das eleições poderá semear o terror onde outros candidatos do Morena ganharem, caso eles nãos e submetam às suas pressões. Recordemos que, além do presidente, estas eleições escolherão senadores, deputados, nove governadores e muitos prefeitos.

Atualmente, há regiões importantes do país totalmente submersas na guerra ao narcotráfico, e este é um dado que têm importância para as eleições.

Carta Maior: López Obrador propôs uma anistia para a guerra às drogas, como forma de acabar com ela, mas isso poderia beneficiar os narcos. Que alcance a proposta terá?

Julio Hernández Astillero: É uma das propostas importantes, mas também uma das mais enigmáticas, sobre a qual houve mais controvérsia, porque López Obrador não deu uma explicação detalhada. Seu estilo político é o de lançar propostas e aguardar para ver as reações, e logo acomodar um pouco suas palavras segundo as circunstâncias. Primeiro, ele falou numa anistia que poderia incluir os grandes capos do narcotráfico, e atualmente essa proposta parecera se encaminhar a uma anistia aos agricultores, camponeses pobres, que trabalham em cultivos ilegais por necessidade. A anistia tem uma razão maior, que é entendida por muita gente no México. A sociedade está cansada desse modelo de combate ao narcotráfico através da guerra, com a participação das Forças Armadas, que foi imposta pelo ex-presidente Felipe Calderón (2006-2012) e que continuou com Peña Nieto. A anistia é uma necessidade que já vinha sendo planteada por personagens de diferentes posições ideológicas, não só por Obrador. A busca pela pacificação através de uma anistia foi defendida por personagens da direita e por especialistas que estudaram o tema, e que apontam a necessidade de explorar o diálogo com os chefes do narco.

Carta Maior: As cifras desta guerra são piores que as das ditaduras dos Anos 80 na América Latina.

Julio Hernández Astillero: Efetivamente, o subsecretário de Direitos Humanos do atual governo disse que há cerca de 33 mil pessoas desaparecidas e algo em torno de 30 mil cadáveres sem identidade reconhecida, nas mãos dos serviços médicos legais, ou delegacias de polícias, ou em fossas governamentais.

Esse número de desaparecidos é o resultado das políticas impulsadas pelos governos de Calderón e Peña Nieto, embora o número de cadáveres de identidade desconhecida seja somente o da gestão de Peña Nieto. Mas, certamente, a cifra real de vítimas é ainda maior. As pessoas socialmente vulneráveis no México não denunciam as desaparições e os assassinatos, por temor a represálias.

Carta Maior: Por que os militares rejeitaram a proposta de anistia?

Julio Hernández Astillero: A militarização da guerra contra o narcotráfico trouxe várias consequências negativas, como as violações dos direitos humanos e um maior poder para os militares, graças à ao uso de recursos públicos milionários e de forma reservada. Um dos setores que se beneficiou foi o das cúpulas do Exército e da Marinha. Nestes últimos doze anos, se deu um processo de distorção grave da função dos militares, que são preparados para enfrentar e eliminar um inimigo, e foram utilizados para tarefas de polícia. Tudo isso levou as Forças Armadas a ganharem maior poder e influência. O secretário de Segurança, o general Salvador Cienfuegos, ganhou um peso político impressionante, algo que nunca havia acontecido no México, pronunciando discursos sobre a conjuntura e fazendo pressão para aprovar uma lei no Congresso sobre a Segurança Nacional, que foi criticada por López Obrador, cuja proposta tem como objetivo acabar com a guerra.

Obrador fez um apelo ao general, para que não faça declarações desta índole e que se mantenha pendente apenas dos assuntos militares. As Forças Armadas, especialmente seus altos mandos, estão adotando uma atitude que parece querer obstaculizar a vitória do candidato da esquerda, e isso é algo perigoso.

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