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Oásis

Cabeça de avestruz: Os perigos da cegueira voluntária

Muitas pessoas, ao se deparar com um fato grave e ameaçador, preferem adotar a postura do avestruz diante da tempestade: esconder a cabeça num buraco, esperando que a não visão do desastre possa anular os seus efeitos. Margaret Heffernan fala disso nesta excelente conferência pronunciada no TED

Muitas pessoas, ao se deparar com um fato grave e ameaçador, preferem adotar a postura do avestruz diante da tempestade: esconder a cabeça num buraco, esperando que a não visão do desastre possa anular os seus efeitos. Margaret Heffernan fala disso nesta excelente conferência pronunciada no TED (Foto: Gisele Federicce)
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Vídeo: TED – Ideas Worth Spreading
Tradução: Francisco Dubiela. Revisão: Marina Murarolli

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Gayla Benefield estava apenas fazendo seu trabalho - até que ela descobriu um segredo terrível sobre sua cidade que fazia com que a taxa de mortalidade local fosse 80 vezes maior do que em qualquer outro lugar dos Estados Unidos. Mas quando ela tentou avisar as pessoas sobre isso, ela se deparou com uma verdade ainda mais chocante: as pessoas não queriam saber. Numa palestra que é parte aula de história e parte um chamado para agir, Margaret Heffernan demonstra o perigo da "cegueira voluntária" e elogia pessoas comuns como Benefield que estão dispostas a se manifestar.

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Margareth Heffernan

Margaret Heffernan já foi presidente de cinco empresas diversas. Ela gosta de investigar os padrões humanos de pensamento – tais como a tendência a evitar conflitos e a assim chamada "cegueira seletiva", na qual a pessoa só consegue ver aquilo que terríveis.

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Em seu livro Willfull Blindness, Heffernan mostra como as organizações empresariais pensam. E examina também por que tantos executivos e lideres empresariais frequentemente preferem ignorar o óbvio. Falando das consequências disso, ela cita a própria crise financeira global atualmente em curso, e também o desastre nuclear de Fukushima, no Japão. Margaret Heffernan começou sua carreira como produtora de televisão.

Vídeo:

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Tradução integral da palestra de Margaret Heffernan:

"No canto noroeste dos Estados Unidos, quase na fronteira canadense, há uma cidadezinha chamada Libby, em Montana, e que está cercada por pinheiros e lagos e uma vida selvagem incrível com essas árvores enormes que alcançam os céus. No meio disso está uma cidadezinha que eu visitei, e parecia meio desolada, um pouco isolada.

E em Libby, Montana, há uma mulher fora do comum chamada Gayla Benefield. Ela sempre se sentiu um pouco forasteira, apesar de ter vivido a maior parte de sua vida lá, uma mulher da linhagem russa. Ela me contou que quando ia à escola, ela era a única garota que decidiu fazer desenho industrial.

Mais tarde, ela conseguiu um emprego indo de casa em casa fazendo leituras de consumo - de gás e de luz. E ela fazia esse trabalho no meio do dia, e uma coisa especial prendeu sua atenção, que era, no meio do dia ela encontrava muitos homens que estavam em casa, de meia idade, de terceira idade, e muitos deles pareciam usar tanques de oxigênio. Ela achou esquisito. Alguns anos depois, o pai dela morreu com 59 anos de idade, cinco dias antes de poder receber sua aposentadoria. Ele havia sido um minerador. Ela pensou que ele devia ter se cansado com o trabalho.

Mas alguns anos depois, a mãe dela morreu, e isso lhe parecia estranho, pois sua mãe vinha de uma longa linhagem de pessoas que pareciam viver para sempre. De fato, o tio de Gayla ainda está vivo hoje, e aprendendo a dançar valsa. Não fazia sentido que a mãe de Gayla morresse tão jovem. Era uma anomalia, e ela continuou a refletir sobre as anomalias. E quando refletiu, outras vieram à mente. Ela se lembrou, por exemplo, de quando sua mãe quebrou uma perna e foi ao hospital, e fez vários raios-X, e dois deles eram raios-X da perna, o que fazia sentido, mas seis deles eram raios-X do peito, que não faziam sentido.

Ela refletiu e refletiu sobre cada episódio de sua vida e da vida de seus pais, tentando entender o que ela estava vendo.

Ela pensou sobre sua cidade. A cidade tinha uma mina de vermiculita. A vermiculita era usada em condicionadores de solo, para fazer as plantas crescerem mais rápido e melhor. A vermiculita era usada para isolar os sótãos, em grandes quantidades colocadas debaixo do telhado para manter as casas quentes durante os longos invernos de Montana. A vermiculita estava nos parques. Estava no campo de futebol. Estava no ringue de patinação.O que ela não sabia até começar a trabalhar nesse problema é que a vermiculita é uma forma muito tóxica de asbesto.

Quando ela decifrou o quebra-cabeças, ela começou a contar a todo mundo sobre o que aconteceu, o que havia acontecido com seus pais e com as pessoas que ela viu com tanques de oxigênio em casa no meio do dia. Mas ela estava realmente assombrada. Ela pensava, quando todo mundo souber, eles vão querer fazer alguma coisa, mas na verdade ninguém queria saber. De fato, ela se tornou tão irritante quando continuava a insistir em contar essa história aos seus vizinhos, seus amigos e às outras pessoas da comunidade que, finalmente alguns deles se juntaram e fizeram um adesivo de para-choque, que orgulhosamente mostravam em seus carros, que dizia: "Sim, eu sou de Libby, Montana, e não, eu não tenho asbestose."

Mas Gayla não parou. Ela continuou a fazer sua pesquisa. A chegada da Internet definitivamente a ajudou. Ela falava com todo mundo que podia. Ela discutia e discutia, e finalmente ela teve um golpe de sorte quando um pesquisador veio para a cidade estudar a história das minas da área, e ela lhe contou sua história, e a princípio, é claro, como todo mundo, ele não acreditou nela, mas quando ele voltou para Seattle e fez sua própria pesquisa, ele descobriu que ela estava certa.

Então agora ela tinha um aliado. Contudo, as pessoas ainda não queriam saber. Elas diziam coisas como: "Bom, se isso fosse realmente perigoso, alguém teria nos avisado." "Se for por isso que todo mundo está morrendo, os médicos teriam nos dito."Alguns dos homens que faziam trabalhos pesados diziam: "Eu não quero ser uma vítima. Eu não posso ser uma vítima, e de qualquer forma, toda indústria tem seus acidentes."

Mas ainda assim Gayla continuou, e finalmente teve sucesso ao fazer uma agência federal vir para a cidade e examinar os habitantes da cidade - 15 mil pessoas - e o que eles descobriram foi que a cidade tinha uma taxa de mortalidade 80 vezes maior do que qualquer lugar dos Estados Unidos. Isso foi em 2002, e mesmo naquele momento, ninguém levantou a mão e disse: "Gayla, olhe no playground onde seus netos estão brincando. É forrado com vermiculita."

Isso não era ignorância. Era cegueira voluntária. A cegueira voluntária é um conceito legal que significa, se há informação que você pode e você deve saber mas de alguma forma você decide não saber, a lei considera que você é um cego voluntário. Você escolheu não saber. Há muita cegueira voluntária nos dias de hoje. Podemos ver a cegueira voluntária nos bancos, quando milhares de pessoas concederam hipotecas a pessoas que não podiam pagar por elas. Podemos ver em bancos quando taxas de juros foram manipuladas e todo mundo sabia o que estava acontecendo, mas todo mundo ignorou diligentemente. Podemos ver a cegueira voluntária na Igreja Católica, onde décadas de abuso infantil foram ignoradas.

Podemos ver a cegueira voluntária na véspera da Guerra do Iraque. A cegueira voluntária existe em escalas épicas como essas, e também existe em escalas muito pequenas, nas famílias das pessoas, nas casas das pessoas e nas comunidades, e especialmente nas organizações e instituições. Às companhias que foram avaliadas por cegueira voluntária podem ser feitas questões como: "Há problemas no trabalho que as pessoas têm medo de levantar?" E quando os acadêmicos fizeram estudos como esse das corporações nos Estados Unidos, o que eles descobriram foi que 85% das pessoas dizem sim. 85% das pessoas sabem que há um problema, mas elas não dizem nada. E quando eu repeti essa pesquisa na Europa, perguntando as mesmas questões, eu encontrei exatamente o mesmo número. 85%. É um bocado de silêncio. É um bocado de cegueira. E o que é realmente interessante é que quando vou à companhias na Suíça, eles me dizem: "Este é um problema só da Suíça." E quando vou para Alemanha, eles dizem: "Ah sim, isto é uma doença alemã."E quando vou para companhias na Inglaterra, eles dizem: "Ah sim, os ingleses são muito ruins nisso." E a verdade é que isso é um problema humano. Todos nós somos, sob certas circunstâncias, voluntariamente cegos.

O que a pesquisa mostra é que algumas pessoas são cegas por medo. Elas têm medo de retaliação. E algumas pessoas são cegas pois elas pensam que reparar em tudo é fútil. Nada vai mudar. Se fizermos um protesto contra a Guerra do Iraque, nada vai mudar, então por que se importar? É melhor não reparar nisso.

E o tema recorrente que encontro o tempo todo é as pessoas dizendo: "Bom, sabe, as pessoas que reparam, elas são dedos-duros, e todos sabemos o que acontece com elas."Há esta mitologia profunda sobre os dedos-duros que diz, em primeiro lugar, que eles são malucos. Mas o que descobri viajando pelo mundo e conversando com dedos-duros é que, na verdade, eles são pessoas muito leais e frequentemente conservadoras. Elas são muito dedicadas com as instituições para as quais trabalham, e a razão delas se manifestarem, a razão delas insistirem em reparar, é porque elas se importam muito com a instituição e querem mantê-la saudável.

E a outra coisa que as pessoas sempre dizem sobre os dedos-duros é: "Bom, não tem saída, pois você pode ver o que acontece com eles. Eles são esmagados. Ninguém gostaria de passar por algo assim." E ainda assim, quando converso com dedos-duros, o tom recorrente que escuto é orgulho.
Eu penso em Joe Darby. Todos nos lembramos das fotografias de Abu Ghraib, que chocaram tanto o mundo e nos mostraram o tipo de guerra que estava sendo travada no Iraque. Mas eu me pergunto se alguém se lembra de Joe Darby, o bom e obediente soldado que encontrou essas fotografias e as entregou. E ele disse: "Sabe, não sou o tipo de cara que dedura as pessoas, mas algumas coisas passam dos limites. A ignorância é uma benção, dizem, mas não podemos tolerar coisas como essa."

Eu conversei com Steve Bolsin, um médico inglês, que lutou por cinco anos para alertar sobre um perigoso cirurgião que estava matando bebês. E eu perguntei por que ele fez isso, e ele disse: "Bom, na verdade foi minha filha que me motivou a fazer isso. Ela veio a mim numa noite, e ela apenas disse: 'Pai, você não pode deixar crianças morrerem.'"

Ou penso em Cynthia Thomas, uma filha e esposa de militares, que, ao ver seus amigos e parentes voltarem da Guerra do Iraque, ficou tão chocada com suas condições mentais e a recusa das forças armadas em reconhecer e admitir a síndrome de estresse pós-traumático que ela estabeleceu um café no meio de uma vila militar para dar a eles assistência legal, psicológica e médica. E quando ela falou comigo, ela disse: "Sabe, Margaret, eu costumava dizer que não sabia o que eu queria ser quando eu crescesse. Mas eu me encontrei nessa causa, e nunca mais serei a mesma."

Todos nós aproveitamos tantas liberdades hoje em dia, liberdades conquistadas a muito custo: a liberdade de escrever e publicar sem medo de censura, uma liberdade que não havia aqui na última vez que fui para a Hungria; a liberdade de votar, pela qual as mulheres em particular tiveram de lutar muito; a liberdade de pessoas de diferentes etnias e culturas e orientação sexual viverem da maneira que quiserem. Mas a liberdade não existe se você não usá-la, e o que os dedos-duros fazem, e o que pessoas como Gayla Benefield fazem é usar a liberdade que elas têm. E o que elas estão muito preparadas a fazer é reconhecer que sim, isso vai ser uma discussão, e sim, eu vou ter um monte de brigas com meus vizinhos e meus colegas e meus amigos, mas eu vou me virar muito bem neste conflito. Eu vou confrontar meus opositores, pois eles tornam meu argumento melhor e mais forte. Eu posso colaborar com meus oponentes para me tornar melhor no que eu faço. Estas são pessoas de persistência imensa, paciência incrível, e uma determinação absoluta para não ficar cegas nem silenciosas.

Quando fui a Libby, Montana, visitei a clínica de asbestose que Gayla Benefield criou, um lugar onde a princípio algumas das pessoas que queriam ajudar e precisavam de ajuda médica entravam pela porta dos fundos pois não queriam admitir que ela estava certa. Eu fui a um restaurante, e observei os caminhões indo e vindo pela rodovia, carregando a terra fora dos jardins e a substituindo por solo fresco e não contaminado.

Eu levei minha filha de 12 anos comigo, pois eu queria que ela conhecesse a Gayla. E ela perguntou: "Por que? Qual a importância disso?"
Eu respondi: "Ela não é uma estrela de cinema, e ela não é uma celebridade, e ela não é uma expert, e Gayla é a primeira pessoa que afirmaria que ela não é uma santa. O que é realmente importante sobre a Gayla é que ela é comum. Ela é como você, e ela é como eu. Ela tinha liberdade, e ela estava pronta para usá-la." Muito obrigada."

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