Sobre impostos e distribuição de renda

Contingente da população que se apropria de 40% da renda é responsável pelo pagamento de apenas 7,3% do total dos impostos. Quem, honestamente, pode defender uma situação como essa?



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Os conservadores gostam de reclamar da carga tributária no Brasil. Mas ela não é maior do que na média dos demais países. Eles reclamam porque, na maior parte dos casos, são pessoas ricas que não usam os serviços públicos. Por isso, preferem um Estado mínimo e defendem uma reforma tributária para que se pague menos imposto, deixando que cada qual se responsabilize pelos custos de saúde, educação, transporte, segurança e os demais serviços. Para quem é rico, tudo bem. Para quem não tem recursos, é o abandono total.

De qualquer forma, é mesmo necessária uma reforma tributária. Só que não a que eles querem.

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A reforma tributária necessária não é exatamente para reduzir a carga de impostos, ainda que isso possa ser feito. Mas para reformar a estrutura de cobrança e tornar mais justa a distribuição de renda.

Diferentemente do que acontece na maioria dos países do Primeiro Mundo, no Brasil a maior parte dos impostos é indireta, cobrada juntamente com os produtos consumidos, e não sobre a renda ou a propriedade. Lá, isso faz com que, quando compra um copo d'água o pobre pague o mesmo imposto que o rico. Aqui, a resultante é que os pobres paguem mais impostos do que os ricos.

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Vamos aos números.

Quarenta por cento da renda nacional é apropriada por 1% das pessoas no Brasil, que ganha mais de 20 salários mínimos. Mas esse contingente que se apropria de 40% da renda é responsável pelo pagamento de apenas 7,3% do total dos impostos. A informação é do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, cujo site traz outros dados importantes.

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Mais: de 1980 a 2000, as cinco mil famílias mais abonadas tinham uma riqueza equivalente a dois quintos de todo o fluxo de renda produzido pelo país ao longo de um ano. Isso equivalia a 42% do PIB brasileiro. Os dados são do Atlas da Exclusão Social no Brasil.

O economista Márcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo, tem chamado a atenção para que, além de insuficiente, a tributação direta sobre o patrimônio ou sobre as propriedades, como por exemplo o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), não é progressiva: "Há casos estranhos em que quem mora em favelas e em condições mais precárias de urbanização termina pagando, em relação à renda, algo superior aos que moram em bairros nobres." (entrevista à Rádio Brasil Atual, em 9/7/2013, transcrita no site da emissora).

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Quem, honestamente, pode defender uma situação como essa?

Há tempos estão engavetados no Congresso os projetos para taxação de grandes fortunas e para taxar fortemente as heranças. Simplesmente, não andam. E, registre-se, o primeiro deles está previsto na Constituição Federal (artigo 153, inciso VII).

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Mesmo o Imposto de Renda é cheio de distorções. Estão isentos de pagamento os assalariados que recebem até R$ 1.787,77. Os que ganham entre R$ 1.787,78 e R$ 2.679,29 pagam 7,5%. Quem tem um vencimento bruto entre R$ 2.679,30 e R$ 3.572,43 desconta 15%. Quem recebe entre R$ 3.572,44 e R$ 4.463,81 paga 22,5%. Finalmente, quem tem salário bruto acima de R$ 4.463,82 é enquadrado numa alíquota de 27,5%.

Haveria muito a dizer sobre essas faixas, mas vamos nos limitar a duas observações.

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Primeiro: cobrar Imposto de Renda de quem recebe R$ 1.787,78 é absurdo. Este valor é baixíssimo, equivale a menos de 2,5 salários mínimos. E, para que se tenha uma ideia, o salário mínimo calculado pelo Dieese para que correspondesse aos preceitos constitucionais e fosse suficiente para que uma família sobrevivesse condignamente é de R$ 2.915,07. Muito acima, portanto, do teto de quem é isento.

Em segundo lugar, é espantoso que a tabela estipule a mesma a alíquota, de 27,5%, para quem ganha R$ 4.463,82 e para quem recebe, por exemplo, mais de R$ 100 mil. Isso não tem cabimento. Em qualquer país do Primeiro Mundo há outras, faixas com alíquotas muito superiores, para fazer com que quem ganha mais efetivamente pague mais.

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Mas o absurdo não para por aí: a tabela com as alíquotas para cálculo do imposto a pagar tem uma defasagem de quase 65% ("DCI Online" de 21/5/2014). Ficou congelada, enquanto salários eram reajustados a cada ano pela inflação. Com isso, um trabalhador isento passa a pagar Imposto de Renda no ano seguinte sem que tenha tido aumento real do salário. A matéria do "DCI Online", já citada, dá um exemplo concreto: "Quem ganha R$ 3 mil de salário pagará mensalmente ao IR, este ano, R$ 114,97. Se a tabela estivesse em dia, esse mesmo contribuinte estaria isento".

Há o caso, também, dos trabalhadores que estavam enquadrados numa alíquota mais baixa e passaram para a faixa imediatamente superior também sem que tivessem tido aumento real de seu salário.

O nome disso é confisco da renda dos trabalhadores.

Enfim, apesar dos avanços obtidos nos últimos anos, estamos muito longe de ser um país justo.

Ainda há muito o que mudar.

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