Por que a ultra-esquerda brasileira é residual?

Há espaço, à esquerda do PT, para forças que pressionem pelo aprofundamento e a aceleração de reformas, buscando forjar um bloco histórico que mude a qualidade do processo de mudanças. Mas essa orientação é impossível para quem vê no PT o inimigo

Há espaço, à esquerda do PT, para forças que pressionem pelo aprofundamento e a aceleração de reformas, buscando forjar um bloco histórico que mude a qualidade do processo de mudanças. Mas essa orientação é impossível para quem vê no PT o inimigo
Há espaço, à esquerda do PT, para forças que pressionem pelo aprofundamento e a aceleração de reformas, buscando forjar um bloco histórico que mude a qualidade do processo de mudanças. Mas essa orientação é impossível para quem vê no PT o inimigo (Foto: Breno Altman)


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Dificilmente chegará a 2% o total de votos dos candidatos a presidente do PSOL, PSTU, PCB e PCO. Mas não é apenas a influência eleitoral desses partidos que é pífia. Também são forças de pouca envergadura no movimento sindical, estudantil e camponês. Não passam de franjas isoladas na intelectualidade. Apesar de tentarem se integrar às manifestações de junho do ano passado, não tiveram papel de relevo e tampouco se constituíram em referência para as massas juvenis que ocuparam as ruas.

Diversos motivos poderiam ser identificados para desempenho tão marginal. Há interpretações sociológicas e políticas de todos os gostos para ajudar a compreender essa fragilidade. Creio que existe, no entanto, ao menos entre seus militantes de boa fé, uma razão de fundo para tamanho isolamento: a política de todas essas correntes é baseada na ideia de hipotética traição do PT ao programa de esquerda e aos interesses populares.

De acordo com esta interpretação, teria ocorrido fenômeno semelhante ao que se passou com a social-democracia européia. O partido de Lula teria assumido o mesmo programa neoliberal do capital financeiro, transitado de armas e bagagens para o campo da burguesia rentista e renunciado à construção de um projeto independente dos trabalhadores. Segundo esse raciocínio, ainda que haja diferenças táticas, o PT e os demais partidos burgueses seriam farinha do mesmo saco.

Esta posição empurra facilmente setores da ultra-esquerda para assumir o discurso falsamente moralista da direita contra o PT e até se alinhar com o conservadorismo quando se trata de fazer oposição ao governo petista.

A absoluta falta de audiência popular à sua narrativa poderia levar estas correntes a refletir sobre a justeza ou não de sua política, mas não o fazem. Prevalecem o dogmatismo, o rancor de ex-petistas e a origem de classe: afinal, a maioria esmagadora de seus quadros tem origem nas camadas médias, onde viceja ambiente generalizado de ódio e desconfiança contra o PT.

O erro fundamental de sua análise consiste em não compreender que a natureza petista e seu papel concreto nada tem a ver com a social-democracia dos dias atuais. Ainda que se possa criticar os governos de Lula e Dilma pela eventual opção por um reformismo fraco, no dizer de André Singer, o fato é que se constituíram em ferramentas de resistência ao neoliberalismo em todos os terrenos. 

Estes últimos doze anos foram marcados pela expansão dos gastos públicos, pela adoção de políticas distributivistas, pela ampliação de direitos sociais, pelo aumento do emprego e da renda dos trabalhadores. O Estado está sendo paulatinamente reconstruído como epicentro de um modelo econômico que associa desenvolvimento e criação de um mercado interno de massas, através de mecanismos para a inclusão social. No mais, o país impulsiona política internacional contra-hegemônica e de apoio à integração de blocos que se separam do campo de gravidade do imperialismo norte-americano. 

Como se pode ver, pela realidade dos fatos, um caminho absolutamente distinto da social-democracia européia. Não apenas por questões programáticas, mas também pela posição na luta de classes: não é à toa o esforço beligerante do núcleo dirigente da burguesia para derrotar o PT a qualquer preço, aceitando até o risco de inflar uma candidatura de oportunidade como a de Marina Silva. 

Há espaço, à esquerda do PT, para forças que pressionem pelo aprofundamento e a aceleração de reformas, buscando forjar um bloco histórico que mude a qualidade do processo de mudanças. Mas essa orientação é impossível para quem vê no PT o inimigo principal ou como integrante do campo político e classista da burguesia. Essa postura visceralmente antipetista não provoca apenas isolamento dentro da esquerda, mas também tornam inacessíveis os corações e mentes das dezenas de milhões de trabalhadores, de pobres do campo e da cidade, cuja vida melhorou admiravelmente desde a posse de Lula em 2003.

Por fim, a insistência nessa política sectária faz da ultra-esquerda um aliado objetivo das forças reacionárias nos momentos de grande polarização e disputa. O caso mais emblemático foi o processo do chamado "mensalão", mas muitos foram os episódios políticos e eleitorais nos quais essa lógica se reproduziu. Afinal, se o governo é do PT e esse partido passou para o outro lado, transformado em instrumento da dominação burguesa, contra essa administração deve ser a direção do golpe principal. 

Trata-se da fórmula perfeita para a irrelevância e a residualidade.

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