Ayotzinapa, uma fogueira como em 68?

É bem verdade que, muito mais em outros tempos, temos uma mistura, às vezes perigosa, nas manifestações populares que vão hoje para as ruas

É bem verdade que, muito mais em outros tempos, temos uma mistura, às vezes perigosa, nas manifestações populares que vão hoje para as ruas
É bem verdade que, muito mais em outros tempos, temos uma mistura, às vezes perigosa, nas manifestações populares que vão hoje para as ruas (Foto: Ronaldo Botelho)


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Os crescentes protestos pelo desaparecimento dos estudantes mexicanos de Ayotzinapa, que se espalham pelos continentes, indicariam, concretamente, estarmos nos encaminhando para repetir, em uma nova versão globalizada, o Maio de 1968?

É possível que sim; mas resta determinar a amplitude de tal movimento com relação às condições de inflamar uma consciência mais amadurecida, que atinja os reais anseios dessa geração, para muito além de cartazes nas redes sociais.

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A rebelião dos jovens parisienses, naquele inacabado ano 1968, foi acesa a partir de uma fogueira antecipadamente preparada, por diferentes gravetos pelo mundo. Entre estes, a opressão do fascismo a uma geração que teve suas possibilidades de expressão severamente cercadas pela repressão à voz e à mobilidade.

Mas houve também, no extremo, um impulso mais determinante naquela ocasião, que teve a frente, justamente, o movimento estudantil universitário: a série de conflitos entre estudantes e autoridades da Universidade de Paris, em Nanterre. A causa: a ameaça da administração de fechar a escola e de expulsar vários estudantes acusados de liderar o movimento contra a instituição.

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Na ocasião, a chama das manifestações estudantis foi tão forte a ponto de contagiar outros segmentos, como o operariado, entrelaçando-se a diferentes anseios semelhantes por outros pontos do mundo.

Mais de cinco décadas mais tarde, a conjuntura é outra. O excesso de possibilidades de expressão e a diversidade de causas que empolgam a atual geração geram, entre os outros impulsos, uma sensação de vazio e impotência, que oprime pelo excesso.

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Mas os gravetos para uma nova fogueira ainda permanecem, da Ásia às Américas. E ainda são inflamáveis: o desemprego e a ausência de perspectivas em várias partes do mundo; o sucateamento dos serviços públicos por conta de políticas de austeridade fiscal, no caso da Europa, e o desencantamento geral com os partidos, no caso dos jovens americanos, de Sul ao Norte.

Um componente especial se soma como impulsionador na questão acendeu a rebelião dos estudantes mexicanos, aliando, explosivamente, duas problemáticas: o gritante fracasso de uma política bélica de combate às drogas tráfico de drogas e a brutal conversão das forças que a estruturam para a repressão da sociedade civil.

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Os sintomas dessa política de tolerância zero, direcionada aos cidadãos por reivindicarem melhores condições do próprio Estado que sustentam, já se expressava em meados deste ano, em Fergunson; nesse caso, aliando outro elemento que também é central na questão da violência contra jovens, no caso do Brasil, tragicamente: o racismo estrutural e institucional.

Voltando à analogia entre a mobilização dos estudantes mexicanos de hoje com a dos parisienses de meio século atrás, diga-se, naquela, as motivações eram bem menos leves do que a do desaparecimento - e fortemente provável - execução de 43 estudantes a mando das próprias forças policiais do Estado que agora é denunciada pelos quatro cantos do mundo.

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As já centenas de manifestações em apoio à causa dos estudantes mexicanos, em universidades e outras organizações civis de vários continentes, já expressam pelo menos dois sentimentos positivos: o de solidariedade e o de união em torno de um mesmo sentimento.

Aqui no Brasil, os ventos de junho de 2013 demonstraram o quanto é poderoso esse potencial de mobilização da juventude, particularmente nesses tempos de redes sociais, muitas vezes subestimado pelas gerações anteriores. Várias causas e direções se misturaram naquelas mobilizações. Mas estavam no seu cerne reivindicações sociais, lembremos, como o transporte público acessível e de qualidade.

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É bem verdade que, muito mais em outros tempos, temos uma mistura, às vezes perigosa, nas manifestações populares que vão hoje para as ruas. Infiltram-se entre mobilizações genuinamente justas, dogmáticos extremistas, muitos deles, voltados contra a própria essência da liberdade que move o espírito de tais movimentos. Mas isso é parte das características do mundo contraditório, descentrado e hiper-plural que atravessamos.

Nesse período de desencantamento da política e dos partidos, o engajamento da juventude por uma causa desse nível é altamente salutar, na medida em que revigora o interesse pelo outro e por um mundo melhor, nesse caso, em um plano global.

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E isso pode ser muito construtivo, se devidamente compreendido e convertido em energias que recuperem o desgaste da Política – seja ela que configuração esteja a tomar - enquanto campo potencialmente capaz de tornar melhor a vida as pessoas, com justiça e liberdade.

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