Le Monde: Lava Jato abriu caminho a Bolsonaro

O jornal francês Le Monde afirmou nesta sexta-feira, 26, que o juiz Sérgio Moro e a operação Lava Jato abriram caminho para a ascensão da extrema-direita e a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL); "Na origem da operação "Lava Jato", que, a partir de 2014, divulgou um amplo sistema de corrupção envolvendo os caciques da política e dos negócios, o juiz é, indiretamente, o arquiteto da ascensão dessa extrema direita nostálgica do regime militar (1985-1964)", diz o Le Monde 

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247 - O jornal francês Le Monde publicou nesta sexta-feira, 26, uma extensa reportagem sobre o quadro político do Brasil às vésperas das eleições presidenciais. Segundo o jornal francês, o juiz Sérgio Moro e a operação Lava Jato abriram caminho para a ascensão da extrema-direita e a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL). 

"Na origem da operação "Lava Jato", que, a partir de 2014, divulgou um amplo sistema de corrupção envolvendo os caciques da política e dos negócios, o juiz é, indiretamente, o arquiteto da ascensão dessa extrema direita nostálgica do regime militar (1985-1964)", diz o Le Monde. 

"A burguesia, seduzida pelo capitão que alimenta, como ela, um ódio profundo ao PT, esquece as infâmias do candidato. Ela deixa livre curso à idéia de que Fernando Haddad - na verdade um moderado - seria o representante de uma esquerda ultrapassada, deixando planar a 'ameaça comunista'", diz o jornal. 

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Leia, abaixo, a reportagem do Le Monde na íntegra, em tradução de Sylvie Giraud.

Eleição no Brasil: Jair Bolsonaro, ou a falência da classe política

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Por Claire Gatinois (São Paulo, Correspondente)

Escândalos de corrupção varreram da cena política primeiro o partido do ex-Presidente Lula e depois a direita, abrindo caminho para o candidato "anti-sistema" nas eleições presidenciais de domingo.

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Dizem que em seu escritório em Curitiba, Capital do estado do Paraná, no sul do Brasil, o juiz anticorrupção Sergio Moro está preocupado. Uma pesquisa do Datafolha, divulgada na quinta-feira, 25 de outubro, atribui 44% de votos a Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda) contra os 56% de brasileiros - enojados com sua elite política - dispostos a votar em Jair Bolsonaro, um militar na reserva reacionário e belicoso, no Domingo 28 de outubro.

Na origem da operação "Lava Jato", que, a partir de 2014, divulgou um amplo sistema de corrupção envolvendo os caciques da política e dos negócios, o juiz é, indiretamente, o arquiteto da ascensão dessa extrema direita nostálgica do regime militar (1985-1964). "Bolsonaro é o outro nome da "Lava Jato "", escreveu em um artigo no jornal Folha de São Paulo, em 22 de outubro, Reinaldo Azevedo, autor do livro "O país dos petralhas" ("O país dos partidários do PT", 2008, Record).

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"Justiceiro" do Brasil, o magistrado é sem dúvida a figura mais respeitada dos apoiadores pelos Bolsonaro. Uma vez eleito, o ex-pára-quedista pensa em nomeá-lo para o STF. "Super Moro", como às vezes é chamado, não só colocou Lula, o "pai dos pobres" - único adversário sério da direita - atrás das grades, como também revelou aos contribuintes o cinismo de eleitos de todas as tendências política que haviam se enriquecido às suas custas. Coveiro de um velho mundo político perverso, o juiz abriu o caminho a um "candidato anti-sistema" chamado Jair Bolsonaro.

Saída de Dilma Rousseff

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A ascensão dos militares começa em 2015. A "Lava Jato" está nos editoriais de todos os jornais brasileiros divulgando as transgressões dos dirigentes históricos do PT. A multidão, indignada sai à rua para exigir a saída da presidente Dilma Rousseff. Dentre os manifestantes, encontram-se movimentos da direita dura, como o MBL, o Movimento Brasil Livre, mas também um punhado de radicais exigindo uma intervenção militar imediata ("agora mesmo").

Dilma, herdeira de Lula, reeleita em 2014, incapaz de lidar com uma recessão histórica, sofreu um impeachment em dezembro de 2015 por uma questão orçamentária não relacionada à corrupção. O processo é lançado por Janaina Paschoal, uma advogada exaltada que mais tarde será eleita deputada de São Paulo pelo Partido Socialista Liberal (PSL) ... de Jair Bolsonaro.

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O país, atônito, descobre na época o ambicioso militar da reserva. O deputado, eleito há mais de vinte e cinco anos deve, em 17 de abril de 2016, pronunciar-se como seus pares, a favor ou contra o impeachment. Tomando o microfone em suas mãos, ele se sai com essa tirada aterradora: "Em memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, meu voto é sim."

O coronel Ustra foi um dos torturadores mais sanguinários do regime militar e Jair Bolsonaro dá voz aos nostálgicos da ditadura. O ódio penetra no cenário político, mas o capitão ainda faz parte do chamado "baixo clero" do Congresso. Um membro insignificante do Parlamento, cujas observações ultrajantes sobre mulheres, negros, homossexuais ou sobre as atrocidades policiais, é um folclore de Brasília.

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Exatamente como uma quadrilha

É Michel Temer quem então passa a ser o centro das atenções. O vice-presidente de Dilma Rousseff toma o poder, estabelece um programa sem consulta popular e se alia ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB, à direita), perdedor da eleição de 2014. A esquerda se insurge contra o golpe.

Rapidamente, a política de reformas de Michel Temer se transforma em desastre e o Chefe do Estado, membro do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), é por sua vez, envolvido no arrastão da "Lava Jato". Suspeito de corrupção, lavagem de dinheiro, de participação em uma organização criminosa, salvo pelo Congresso, ele escapa por pouco de um impeachment. Aos olhos da opinião pública, Brasília tem tudo de uma quadrilha organizada. Quando o ex-candidato à presidência, Aécio Neves, do PSDB, deve, por sua vez, justificar-se em um caso de corrupção digno de um filme de série B, a indignação atinge seu auge.

EM AGOSTO, LULA PRESO É AINDA DETENTOR DE 39% DAS INTENÇÕES DE VOTO PARA PRESIDENTE SEGUIDO DE LONGE POR JAIR BOLSONARO COM 19%.

"O PSDB cometeu um erro terrível ao pensar que" Lava Jato "só serviria para varrer seus oponentes." A "Lava Jato" exterminou todo o sistema político brasileiro", diz Paulo Fabio Dantas Neto, professor de ciência política da Universidade Federal da Bahia.

Jair Bolsonaro aproveita-se desta paisagem devastada para promover sua candidatura. Mas ele tem um adversário: Lula. Iniciando uma operação de reconquista de seu eleitorado, tratando de "golpistas" todos aqueles que apoiaram o impeachment contra Dilma Rousseff, o ex-metalúrgico relembra aos eleitores os "anos felizes" de seus dois mandatos. Carismático, eloqüente, ele resgata uma parte de sua popularidade esvaecida depois da "Lava Jato".

Condenado em janeiro de 2018, em segunda instância, a doze anos de prisão por corrupção, o líder da esquerda ressalta as bizarrices de seu julgamento, critica duramente seus juízes e diz que é perseguido. Em abril, após um discurso magistral, ele entra de cabeça erguida pelas portas da prisão em Curitiba para cumprir sua sentença. Em agosto, o preso Lula detém 39% das intenções de voto para a eleição presidencial, seguido de longe por um Jair Bolsonaro com 19%.

Enxurrada de "fake-news"

Nesta altura, ninguém teme ainda o ex-pára-quedista. A direita o deixa espalhar livremente seu veneno contra o PT, enquanto a esquerda vê nele um adversário ideal, fácil de vencer no segundo turno. Confiante, o PT deixa os eleitores acreditarem que Lula será candidato apesar de sua condenação. Quando o Tribunal Eleitoral rejeita, na noite de 31 de agosto, a candidatura do ex-chefe de Estado, seu substituto, Fernando Haddad, ainda é desconhecido do público em geral. O partido acredita, no entanto, ser capaz de vencer de lavada a batalha contra o militar. "Todos subestimaram Jair Bolsonaro", disse Ruy Fausto, professor de filosofia da Universidade de São Paulo.

Ajudado por seus filhos, sem meios, sem tempo de campanha na televisão, Jair Bolsonaro, lidera uma campanha eficaz nas redes sociais, ainda amplamente ignoradas pelos partidos tradicionais. Facebook, Twitter, WhatsApp são tantas plataformas inundadas de "fake-news " obscenas contra seu rival e nas quais o capitão ataca o PT.

Apelidado de "o mito" por seus partidários, Jair Bolsonaro concentra seu discurso sobre a insegurança que gangrena as periferias das cidades, com uma proposta radical: armar os "cidadãos do bem". Ele também põe sobre a mesa seu grande trunfo: Paulo Guedes. Esse conselheiro econômico ultraliberal que promete reformas e privatizações conquista de vez empresários e mercados financeiros.

A burguesia, seduzida pelo capitão que alimenta, como ela, um ódio profundo ao PT, esquece as infâmias do candidato. Ela deixa livre curso à idéia de que Fernando Haddad - na verdade um moderado - seria o representante de uma esquerda ultrapassada, deixando planar a "ameaça comunista". Quanto aos desiludidos do PT, enfurecidos com a ausência de um mea-culpa do partido, alguns deles se deixaram convencer pelo militar que promete restaurar a ordem, a moralidade e a prosperidade.

Jair Bolsonaro teria tido uma progressão tão espetacular se um desequilibrado não o tivesse esfaqueado em pleno comício? Dispensado de participar dos debates televisivos após esta agressão da qual ele escapa in extremis, em 6 de setembro, Jair Bolsonaro se lança desenfreadamente nas redes sociais. No dia seguinte ao ataque, seu filho Flávio Bolsonaro pressentirá a vitória: "Vocês acabaram de eleger meu pai", disse ele.

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