Glaciares derretem. Eles superaram o ponto de não retorno

Quase todos os glaciares do mundo superaram o ponto de não retorno. Eles continuarão derretendo até mesmo se deixarmos de produzir anidrido carbônico: é tarde demais para salvar cerca de 40% dos glaciares. No entanto, continuamos a produzir gases de efeito estufa: um quilômetro rodado com um carro custa cerca de 1 quilograma de gelo roubado ao mundo.

Quase todos os glaciares do mundo superaram o ponto de não retorno. Eles continuarão derretendo até mesmo se deixarmos de produzir anidrido carbônico: é tarde demais para salvar cerca de 40% dos glaciares. No entanto, continuamos a produzir gases de efeito estufa: um quilômetro rodado com um carro custa cerca de 1 quilograma de gelo roubado ao mundo.
Quase todos os glaciares do mundo superaram o ponto de não retorno. Eles continuarão derretendo até mesmo se deixarmos de produzir anidrido carbônico: é tarde demais para salvar cerca de 40% dos glaciares. No entanto, continuamos a produzir gases de efeito estufa: um quilômetro rodado com um carro custa cerca de 1 quilograma de gelo roubado ao mundo. (Foto: Luis Pellegrini)


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Por: Luis Pellegrini


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Os glaciares respondem muito lentamente às mudanças climáticas. Por isso a sua retirada continuará mesmo que a temperatura média global se estabilize nos níveis atuais.

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Pesquisadores da Universidade de Bremen (Alemanha) e de Innsbruck (Áustria) demonstraram com um recente estudo que o derretimento dos grandes glaciares da Terra não será interrompido, no decorrer deste século, mesmo se a partir de agora nossas emissões de gases de efeito estufa sejam reduzidas a zero. Isso é devido à inércia dos fenômenos físicos, da lenta reação dos glaciares às mudanças climáticas, que apenas nos últimos anos começaram a se ressentir pesadamente do aumento da temperatura terrestre nas décadas passadas. A inércia, no entanto, funciona nos dois sentidos: até mesmo se a temperatura do planeta se estabilizasse nos níveis atuais, os glaciares continuariam a derreter durante muito tempo ainda.

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No acordo de Paris sobre o clima (a COP-21), assinado em 2015, 195 países membros da Convenção das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas tinham concordado em lançar iniciativas para limitar o aumento da temperatura média global a valores inferiores a 2 graus centígrados e, se possível, inferiores a 1,5 grau centígrado em relação aos níveis pré-industriais. Em particular, existia a intenção de reduzir de maneira significativa os efeitos deletérios provocados pelas próprias mudanças climáticas.

A perda é inevitável 

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Mas todas essas boas intenções, mesmo que fossem integralmente colocadas em prática (o que está longe de acontecer) parecem não valer para os glaciares. Com efeito, os pesquisadores afirmam que se a temperatura média devesse subir 2 graus centígrados, ou apenas 1,5 graus centígrados, o impacto sobre a fusão dos gelos dos glaciares seria praticamente idêntico e a perda de massa dos glaciares seria similar e constante durante os próximos 100 anos.

 

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Geleira do Cáucaso em 2011

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As pesquisas científicas indicam que um quilograma de anidrido carbônico emitido pelo homem tem como consequência uma perda de cerca 15 quilogramas de gelo pertencente a algum glaciar. O cálculo foi feito levando-se em conta as emissões de anidrido carbônico dos anos passados e a redução dos glaciares nesse mesmo período. Para tornar mais claro o cenário, os cientistas ressaltam o fato de que cada quilômetro percorrido por um automóvel produz uma quantidade de gás carbônico suficiente para fundir um quilograma de gelo.

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Ben Marzeion, um dos pesquisadores, afirma que “mesmo se hoje parássemos por completo de emitir novos gases de efeito estufa na atmosfera, prevemos que entre 36% a 40% dos glaciares que hoje se estendem na superfície do planeta desaparecerão até o final deste século. Portanto, mais de uma terça parte do gelo atualmente existente já não poderá ser salvo. A questão é que os glaciares reagem muito lentamente às variações climáticas, tão lentamente que, se quiséssemos conservar o volume atual dos gelos terrestres teria sido necessário conservar a temperatura média da Terra nos mesmos níveis da época pré-industrial – ou seja, da primeira metade do século 19 – durante todo o século passado”

Glaciares desaparecem por causa do aquecimento global

Se é fato que em todo o mundo os glaciares estão derretendo, é também verdade que este é um dos efeitos mais evidentes do aquecimento global: a prova irrefutável de que o fenômeno é bem real.

Os grandes glaciares do Alasca, bem como os do Himalaia e do Cáucaso, dos Andes e dos Alpes são as primeiras e mais evidentes vítimas do efeito estufa. De 1850 aos nossos dias, a redução é de cerca 50% em relação às áreas que eles ocupavam. A causa do derretimento das geleiras é o aumento médio da temperatura atmosférica, hoje calculado em torno de 1 grau centígrado em relação a 1880.

 

À esquerda, o Grand Pacific Glacier, no Alasca, em 1899. À direita, a mesma região, hoje. Trata-se de um glaciar de 40 quilômetros de extensão, entre a british Columbia e o Alasca. A foto contemporânea é de Fabio Ventura.


Geólogos já conhecem bastante bem o que está acontecendo com os glaciares árticos e antárticos, e consegue-se hoje calcular com boa precisão a diminuição da área da banquisa na superfície congelada do Polo Norte. Bem mais complicado e difícil é seguir a evolução dos glaciares isolados que, dos Alpes aos Andes sul-americanos, recobrem as partes mais altas das montanhas. No entanto, segundo o cientista Roman Motyka, da UFA (University Fairbanks Alaska), a desagregação da calota do Glaciar Bay, no Alaska, comporta, sozinha, uma perda de 3.450 quilômetros cúbicos de gelo, o que equivale a uma elevação do nível dos oceanos de cerca 1 centímetro.

A água sobe no mar

A mesma sorte tocou as demais extensões de gelo, como aquelas da Ásia Central e da América do Sul. Segundo a Environmental Protection Agency dos Estados Unidos, da metade dos anos 1940 até 2012 os glaciares do mundo diminuíram mais de 27 metros de água equivalente. Essa diminuição foi se acelerando a partir dos anos 1970.

 

 

É provável que nem todo esse derretimento seja devido ao homem (como acontece para todo fenômeno natural de longo termo, as suas causas costumam ser muitas), mas não há mais dúvidas de que a nossa responsabilidade aumentou 25% de 1850 a hoje, como explica um artigo publicado pela revista Science em agosto de 2014. E se limitarmos a análise aos anos compreendidos entre 1991 e 2010, podemos afirmar que existe uma probabilidade de 69% de que os gelos derreteram por “culpa humana”.

Não é fácil acompanhar passo a passo fenômenos que duram décadas e que são extremamente lentos. Para fazê-lo, é muito útil colocar lado a lado fotografias panorâmicas produzidas por expedições científicas ao longo da história, e fotos feitas agora, por novos exploradores que visitaram os glaciares.

Este é o caso do fotógrafo italiano Fabiano Ventura, idealizador do projeto “Na trilha dos glaciares”, que põe em confronto imagens históricas de glaciares no Alasca, no Cáucaso e na cadeia do Karakorum (Ásia) com fotos contemporâneas feitas na mesma situação e nos mesmos pontos. Aqui vão algumas imagens comparativas que ele coletou e organizou:

 

1 Panorama dos colossos do Cáucaso. O monte Tetnuldi (4.853 metros) e o monte Skhara (5.200 metros). Do confronto entre as duas fotografias, separadas por 121 anos, observa-se com clareza a retirada linear da frente dos dois grandes glaciares Adishi e Khalde.
Foto histórica: Vittorio Sella, 1890
Foto moderna: Fabiano Ventura, 2011

 

2 Visão frontal do glaciar Adishi. Do confronto fotográfico fica bem evidente o colapso da inteira superfície frontal do glaciar.
Foto histórica: 1884 Mor von Dechy
Foto moderna: 2011 Fabiano Ventura

 

3 O glaciar Chaalati. No Cáucaso, Geórgia, 121 anos depois da foto de Vittorio Sella. Nesse tempo a frente do Chaalati se retirou dois quilômetros e o glaciar perdeu mais de 200 metros da sua espessura. No fundo, o versante sul do monte Ushba (5.200 metros). O Chaalati, que hoje ainda leva a sua frente à quota mais baixa (até 1.861 metros) mostrou uma contração de 4,4 quilômetros quadrados (-27,1%) e uma retração frontal de 2,16 quilômetros.
Foto histórica: Vittorio Sella, 1890
Foto moderna: Fabiano Ventura, 2011

 

4 O glaciar Tvuiberi, no Cáucaso georgiano. As duas fotografias são separadas por 127 anos. No lugar onde outrora estava a frente do glaciar, ergue-se hoje uma densa floresta. Desde a pequena era glacial, que atingiu seu apogeu nesta região ao redor de 1810, até os dias de hoje, o Tvuiberi, que até 1965 era o maior glaciar do Cáucaso, apresentou a maior contração de superfície (-16,4 quilômetros quadrados, equivalentes a 34,9% da superfície original) e a retirada linear mais impressionante (-3,98 quilômetros, cerca de 42% do comprimento máximo ao longo da principal linha de fluxo).

Foto histórica: Mor von Dechy, 1884
Foto moderna: Fabiano Ventura, 2011

 

5 Visão das Torres de Trango, no Baltistã, Paquistão. As fotos foram feitas a partir do velho campo-base de Liligo. No confronto entre as duas fotografias, efetuadas no intervalo de 100 anos, fica bem evidente a perda de espessura do glaciar Baltoro estimada, nessas zonas centrais, em cerca de 50/60 metros.
Foto histórica: 1909 Vittorio Sella
Foto moderna: 2009 Fabiano Ventura

 

6 Frente de gelo Biafo (Karakorum). O confronto entre as duas fotografias torna evidente a retirada de mais de 3 quilômetros dessa frente de gelo e a sua perda de massa em toda a zona observada.
Foto histórica: 1909 Vittorio Sella
Foto moderna: 2009 Fabiano Ventura

 

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