O Brasil não é um país nazista

Sociólogo e colunista Emir Sader avalia que o presidente eleito Jair Bolsonaro vai enfrentar oposição ampla contra as propostas de desmonte das conquistas dos trabalhadores; "Vai ter que se enfrentar a uma dura realidade, em que a grande maioria das forças e das personalidades que pesam sobre a opinião pública, o rejeitam frontalmente. Se trata agora de reativar a essas imensas forças que o rejeitam, junto à força da grande massa lulista da população, que é diretamente afetada pelas políticas neoliberais, que levou rapidamente ao isolamento do governo Temer, mecanismo que tende a se reproduziu com o novo governo, assim que baixe a poeira da ofensiva discursiva e agressiva da extrema direita"

O Brasil não é um país nazista
O Brasil não é um país nazista


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Bolsonazi não tem ideia de por que foi eleito. Ele acredita que existam mais de 50 milhões de pessoas que pensam exatamente como ele: que tem saudade da ditadura, que fazem a apologia da tortura, que acham que a ditadura deveria ter matado a 30 mil pessoas, que odeiam aos pobres, aos negros, às mulheres, aos LGBT. Não, o Brasil não é um país nazista. Ele foi escolhido como o candidato anti-PT, foi escolhido porque foi quem tinha mais votos no campo da direita, para poder impedir a vitória do Lula. Poderia ser o Alckmin ou o Alvaro Dias, por exemplo.

A direita conseguiu construir um sentimento anti-política, desde 2013, como forma de rechaço ao PT. Era a força em que se apoiava para tentar impedir o retorno do PT ao governo, projetado pelo fracasso do governo Temer e pela retomada do governo Lula. Apoiando-se nesse sentimento, buscaram candidatos que pudessem personificar essa rejeição da política, que na verdade era um sentimento anti-PT. Buscaram Luciano Huck, Joaquim Barbosa, mas não encontraram o nome.

Ficaram com Bolsonazi, que ocupava o segundo lugar, bem atrás do Lula, nas pesquisas. Haveria então que montar a operação de tirar o Lula da campanha. A armação do processo contra o Lula, sem provas, sua condenação, prisão e proibição de ser candidato, foi um momento imprescindível para poder disputar a eleição. Em seguida, quando a campanha do Haddad crescia e ameaça a vitória da direita, veio a operação das "fake news" e dos robôs, que produziu rapidamente um nível de rejeição totalmente fabricado do Haddad, maior do que o do Bolsonazi, condição para vitória eleitoral da direita.

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Tirar o Lula da disputa, impedir que ele se pronunciasse na campanha, que ele pudesse circular pelo pais, foi a forma fundamental de fazer da campanha uma fraude. A projeção de Bolsonazi como a expressão da rejeição da política e do PT, mesmo sendo ele um personagem da velha política há quase três décadas. Ele foi finalmente eleito como resultado dessas operações de obstrução da vontade politica do povo.

Quando Lula era o personagem central da disputa, candidato e representante do governo mais importante da história do Brasil, a questão central do pais era a questão social, personificada no direito ao emprego com carteira de trabalho, ao salário, às políticas sociais, não havia lugar para a agenda do Bolsonazi, que recolhia o apoio de um setor minoritário da população. A ação das igrejas evangélicas também estava diluída ou neutralizada, diante do atendimento a necessidades básicas, cotidianas, de todos, que o governo Lula havia representado para todos.

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Na passagem à candidatura do Haddad, em que este recolheu boa parte dos votos do Lula, mas não todos, o que mais mudou foi a agenda. A ausência do Lula facilitou deslocar os temas centrais das questões sociais para a agenda da rejeição ao PT com acusações de corrupção, e a segurança. Aquela rejeição foi reforçada pelas "fake news" – de que a imagem da mamadeira foi um exemplo escandaloso do grau de manipulação. Mas precisamos levar em conta que mais de 70% dos eleitores do Bolsonazi acreditavam que era verdade, certamente pela reiteração dos robôs, reforçada pela ação das igrejas evangélicas e pelos meios de comunicação da extrema direita. Esse foi um elemento que reforçou a rejeição ao PT.

A direita, desde os grandes empresários, até os velhos meios de comunicação, passando pelos partidos da direita, aderiam ao Bolsonazi porque era a única possibilidade de impedir o retorno da esquerda ao governo. Uma certa proporção de votos vinha de setores plenamente identificados com as posições extremistas do Bolsonazi. Mas a grande maioria dos votos veio dos que não davam importância a essas posições, contando apenas a vitória sobre o PT. Ao grande empresariado interessava a manutenção do modelo neoliberal, não importando como fosse, como já havia acontecido com o golpe contra a Dilma e a instalação do governo Temer, em que o essencial, para eles, era o restabelecimento das políticas neoliberais.

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A burguesia brasileira luta por seus estreitos interesses, pela maximização dos seus lucros, não importando o preço que o pais pague por isso. Para tirar o PT do governo, depois dos governos de maior sucesso na nossa história, que mais impulsionaram o crescimento econômica e mais promoveram a inclusão social, no marco de uma democracia política, aderiram a um golpe que levou o país ao pior governo da sua história.

Não lhes importa a recessão econômica em que jogaram o país, o desemprego de milhões de brasileiros, o desprestigio internacional do pais, a liquidação do patrimônio público, o brutal retrocesso social do Brasil, contanto que eles possam preservar seus lucros, multiplica-los na especulação financeira e impedir que a vontade popular se manifeste, em um processo eleitoral democrático.

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Uma elite que apoiou ao Temer, porque era a única via de tirar o PT do governo. Que apoia a Bolsonazi, porque é a única possibilidade de impedir o PT de voltar a governar o país, assim como apoiou a perseguição política e jurídica ao Lula, senão ele voltaria a ser presidente do Brasil.

É uma lumpenburguesia, que não tem nada de brasileira, que não tem nada de democrática, menos ainda de compromisso com a retomada do crescimento econômico e com os programas de distribuição de renda. Ao contrário, perseguiu sistematicamente a desvinculação dos recursos para políticas sociais e seu congelamento por 20 anos. Dane-se a sorte da massa dos brasileiros, interessa que os bancos possam seguir governando o país, que eles possam preservar seus polpudos lucros amealhados na especulação financeira.

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É uma lumpenburguesia, que tolera e incentiva lideranças que expressam saudade da ditadura, que fazem a apologia da tortura e da repressão, incluída a execução dos opositores, que proclama que sonega todos os impostos que possa, que discrimina as mulheres, os negros, os jovens, os LGBT, os nordestinos, os quilombolas – a maioria esmagadora da população brasileira -, contanto que seus interesses sejam preservados de forma intacta.

Uma lumpenburguesia à qual não importa que a imagem do Brasil no mundo seja a pior possível e possa piorar mais ainda, porque sua pátria é o capital, a exploração, a acumulação de capital. Lumpenburguesia porque não tem compromisso algum com um projeto de desenvolvimento e inclusão social, porque não lhe importa as condições de vida da massa da população brasileira.

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Lumpenburguesia porque não se identifica com a história do país, com seus grandes líderes populares, porque não preza a democracia e a vontade da maioria. Frauda os impostos, financia campanhas de mentiras, financia candidato que prega a tortura, finge que não sabe de tudo o que seu candidato diz e promete. Só lhe interessa impedir que o PT volte a governar o Brasil.

É uma burguesia que não tem identificação nenhuma com o Brasil, com sua história, com sua cultura, com seu povo. É uma burguesia provinciana, mas que pretende identificar-se com o capitalismo mundial, através da sua identificação com os Estados Unidos. É uma burguesia de costas para o Brasil e de olhos postos nos Estados Unidos, mais particularmente em Miami.

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Bolsonazi foi eleito como fantoche dessa burguesia, dessa direita, como a ditadura militar lhes prestou todos os serviços, mediante um regime de terror, como se valeram do Collor e do FHC para manter e aprofundar seus interesses mediante o modelo neoliberal. Que se valeram do Temer e agora do Bolsonazi para defender seus interesses, não importa a que preço.

Bolsonazi acredita que conquistou a maioria dos brasileiros para suas posições, que pode colocar em pratica posições internacionais da guerra fria, criminalizar os movimentos sociais, os partidos de esquerda, os que divergem dele politicamente. Vai ter que se enfrentar a uma dura realidade, em que a grande maioria das forças e das personalidades que pesam sobre a opinião pública, o rejeitam frontalmente. Se trata agora de reativar a essas imensas forças que o rejeitam, junto à força da grande massa lulista da população, que é diretamente afetada pelas políticas neoliberais, que levou rapidamente ao isolamento do governo Temer, mecanismo que tende a se reproduziu com o novo governo, assim que baixe a poeira da ofensiva discursiva e agressiva da extrema direita.

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