As crianças enjauladas e o navio negreiro da globalização

"A tragédia das crianças enjauladas nos EUA contém algo de bíblico mas tem origem material, econômica e política", escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247; para PML, "o que estamos vendo é o óbvio: o saldo inevitável de um projeto de concentração de renda e riqueza que tem como ponto central tratar o bem estar da maioria como desperdício e ameaça à renda gigantesca dos 0,1% que pretendem comandar a economia do planeta"

"A tragédia das crianças enjauladas nos EUA contém algo de bíblico mas tem origem material, econômica e política", escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247; para PML, "o que estamos vendo é o óbvio: o saldo inevitável de um projeto de concentração de renda e riqueza que tem como ponto central tratar o bem estar da maioria como desperdício e ameaça à renda gigantesca dos 0,1% que pretendem comandar a economia do planeta"
"A tragédia das crianças enjauladas nos EUA contém algo de bíblico mas tem origem material, econômica e política", escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247; para PML, "o que estamos vendo é o óbvio: o saldo inevitável de um projeto de concentração de renda e riqueza que tem como ponto central tratar o bem estar da maioria como desperdício e ameaça à renda gigantesca dos 0,1% que pretendem comandar a economia do planeta" (Foto: Paulo Moreira Leite)


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A imagem de crianças aprisionadas em modernos campos de concentração cercados de arame nos Estados Unidos tem provocado reações de choque, repulsa e indignação no mundo inteiro.

O fato de que não tenham sido capazes de tirar  o sono de nenhuma autoridade do planeta é a demonstração escancarada do ambiente geral de conformismo e derrota de nossa época. Também expressa a hipocrisia passageira, torcendo para que um escândalo dessa envergadura, possa ser esquecido após duas ou três manchetes inofensivas. 

O problema dessa imagem é seu caráter inaceitável, explosivo. Num universo no qual 0,1% da população controla uma  riqueza mundial de US$ 73,7 trilhões, nunca fomos tão ricos. Poucas vezes fomos tão canalhas. Estamos vendo, agora, que nunca houve tanto dinheiro para se fazer o mal.

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Depois de desembarcar das versões contemporâneas dos velhos navios negreiros, os adultos são enjaulados e separados de seus filhos -- que também serão encarcerados. 

As crianças, algumas ainda bebês,  que choram à noite num ponto mal iluminado e incerto,  são os personagens-símbolo de tamanha injustiça e sofrimento. Encarnam, no entanto,  uma tragédia previsível, dolorosamente construída. 

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Vivemos um tempo de pilhagem de riquezas e destruição de nações inteiras, de injustiça social e regressão. Produto da pior devastação econômica desde 1929, assiste-se em todo planeta a um processo de empobrecimento e perda de direitos que atinge jovens, adultos e velhos num movimento perverso -- mas de lógica irretocável.  

As  crianças sofrem em função de uma regra conhecida da existência nas sociedades humanas. Se as leis da natureza ensinam os pais a cuidar dos filhotes -- sejam humanos, caninos ou leoninos, por exemplo -- ao longo dos anos centenas de milhões de adultos foram alijados de qualquer oportunidade de trabalho e progresso. Em consequência, perderam toda capacidade de oferecer proteção, conforto ou alimento. Simples assim.

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Sem destino, sem pouso e, dizendo com simplicidade, sem emprego e sem descanso, perto de 70 milhões de pessoas foram expelidas de suas casas, de seu mundo, e agora vagam pelo planeta em barcos, comboios clandestinos e acampamentos improvisados. "O mundo assiste a pior crise de deslocamento involuntário de todos os tempos", informa a Folha, empregando o termo técnico para falar de realidades muito mais chocantes e doloridas, assombrações que não assombram porque estamos sendo habituados a elas.

Formando uma massa maior do que a maioria dos países reconhecidos pela ONU, essa multidão em movimento é a parcela visível de um universo infinitamente maior,  que caminha cotidianamente para a regressão e o atras. É assim num ponto qualquer de Bogotá, nas ruas de São Paulo, nas estradas do Iraque ou ruínas da Indonésia. Onde você quiser imaginar -- mesmo nas periferias pobres da Europa e Estados Unidos. 

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São os deserdados do colapso de 2008-2009, que deu impulso a um novo processo concentração de renda e de poder político em escala mundial, minando, cedo ou tarde, a resistência e luta por um destino melhor que se manifestava em tantos lugares -- inclusive no Brasil, convém, lembrar, numa homenagem às 49 brasileirinhas e brasileirinhos que foram separadas dos país ao chegar aos EUA e até agora não tiveram direito a qualquer reação indignada por parte do Planalto de Temer.  

O cenário e os personagens da tragédia contem algo de bíblico mas a realidade é absolutamente material, econômica e política. Também pode ser explicada racionalmente. Basta evitar qualquer hipocrisia sentimental. 

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Os pedantes do pensamento único me desculpem mas essa realidade terrível foi anunciada com clareza peculiar por Karl Marx, explicada por John Maynard Keynes e enriquecida por corajosos  sábios contemporâneas que vieram mais tarde e hoje se encontram silenciados. Não há debate possível aqui. Nem lugar para lágrimas de crocodilo. 

O que estamos vendo é o óbvio, o saldo inevitável de um projeto político de concentração mundial de renda, riqueza e força militar. A partir de Washington, e suas várias correias de transmissão espalhadas pelo mundo, tenta-se impor uma nova ordem de cima para baixo, em todo o planeta, visando a consolidação de um poder econômico administrado pelo império norte-americano.

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O ponto central é tratar o bem-estar do povo como desperdício e ameaça a seus lucros gigantescos. Também é preciso encarar a dignidade devida a todo ser humano desde o fim da Idade Média como que poucos merecem e um número ainda menor irá alcançar. Também é preciso destruir o que ainda resta de espaço público e privatizar o resto, sem nada poupar, inviabilizando por fim as democracias, regimes onde as maiorias têm de ser ouvidas. 

No cotidiano de cada país, esse universo produz o fascismo e suas variantes. Nos Estados Unidos, início e fim de tudo, o melhor retrato é o campo de concentração para crianças.

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