Pacto com PSB só vai funcionar se Lula ganhar a militância

"Todo mundo concorda com a noção de que, numa campanha presidencial, o interesse nacional deve ter prioridade sobre questões regionais", escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247. "Para PML, o risco representado pelo pacto PT-PSB que retirou Marília Arraes da disputa em Pernambuco "é despertar a desconfiança da militância, que terá um papel indispensável em 2018, e pode cruzar os braços se imaginar que está sendo usada como massa de manobra em acordos que não entende"

Pacto com PSB só vai funcionar se Lula ganhar a militância
Pacto com PSB só vai funcionar se Lula ganhar a militância (Foto: Ricardo Stuckert)


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Na simples matemática, não é difícil demonstrar que a neutralidade negociada com o PSB irá beneficiar a candidatura Lula -- ou seu sucessor designado -- na campanha presidencial. Mesmo excluindo anti-petistas irredutíveis, como em São Paulo, no Distrito Federal, o acordo libera a maioria dos governadores do PSB para cumprir sua vocação natural de apoiar Lula, permitindo imaginar  que a soma dos votos pode levar sua candidatura a um patamar mais elevado do que perdas possíveis em função do sacrifício de Marília Arraes. 

A ausência de um adversário do PSB na disputa pelo governo de Minas Gerais abre um bom caminho para uma reeleição difícil de Fernando Pimentel e sem dúvida facilita a coleta de votos pela caravana do PT no segundo colégio eleitoral do país. Tudo certo, então? Longe disso.

O problema é que uma eleição não se disputa nas máquinas calculadoras, mas neste aparelho muito mais sensível à sensibilidade humanas que é a urna eletrônica. Aqui moram a salvação e o risco. Estamos falando do eleitor e do militante. 

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Numa eleição na qual é preciso considerar seriamente a hipótese de Lula ser impedido de disputar, o papel do militante me parece mais importante do que nunca. 

Ao contrário da maioria das legendas, que funcionam como máquinas profissionalizadas, o Partido dos Trabalhadores possui uma militância que tem sido capaz de desempenhar um papel decisivo nas disputas apertadas, aquelas que se resolvem no bate-boca na saída do serviço e nas conversas de família, nas mobilizações aguerridas na véspera da votação. 

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Não há dúvida, por exemplo, que a vitória de Dilma Rousseff em 2014 só foi possível porque a militância arregaçou as mangas nos últimos dias e foi a luta contra a máquina profissional judiciário-mídia que havia armado uma operação de guerra. Não há dúvida, também, sobre outro comportamento. Quando sentiu-se abandonada e decepcionada pelas medidas recessivas e impopulares anunciadas logo após uma vitória que via como sua, essa mesma massa deu as costas para o governo que havia ajudado a eleger, permanecendo de braços cruzados durante o impeachment.

Compreende-se por que a militância  fique desconfiada de acordos que não entende nem são explicados. Não quer ser usada como massa de manobra, como se fosse formada por robôs de carne e osso. Por isso se recusa votar de olhos fechados, naqueles nomes que os dirigentes definiram entre quatro paredes. Exige respeito pela história que ajudou a escrever e pede respostas a altura de um esforço  que ajudou a sustentar quatro vitórias eleitorais consecutivas. Não aceita decisões no piloto automático. 

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Foi por isso que, no ano passado, ao aparecer em palanques da caravana de Lula pelo Nordeste, Renan Calheiros não escapou das vaias, que geravam desconforto e desgaste.

Imaginar uma cena semelhante na campanha presidencial mais delicada numa história de tantos traumas, quando é impossível saber sequer se Lula estará em liberdade,  equivale a produzir uma tragédia programada, capaz de alimentar desgastes sem fim, internos e externos.    

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A experiência política elementar ensina que o interesse nacional -- o retorno à presidência -- tem prioridade sobre as questões estaduais. O futuro do país depende disso, pois não se pode imaginar que seria possível desmontar as armadilhas e retrocessos promovidos por Temer-Meirelles por uma insólita intervenção de governos estaduais, por mais combativos que sejam. 

A compreensão de que o PT não pode se comportar como uma federação de vontades estaduais, pode ser dolorosa, mas foi confirmada pelas quatro vitórias eleitorais consecutivas de Lula-Dilma, onde não faltaram disputas e conflitos comparáveis ao que se assiste hoje. Essa constatação não elimina, é certo, a discussão de graves lições do passado.  

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Em 1998, escolhido pelo encontro estadual do Rio de Janeiro, o veterano Vladimir Palmeira foi sacrificado numa troca com o PDT, que permitiu colocar Leonel Brizola como vice na chapa de Lula, levando o PT a fazer campanha por Garotinho. Ainda que se possa reconhecer que o acordo com Brizola marcava um pacto memorável, de valor histórico, o efeito foi duas vezes nulo. Pouco ajudou na eleição federal, na qual Lula foi batido no primeiro turno. Também abriu um poço de ressentimentos e disputas no Rio de Janeiro, do qual o partido não se recuperou até hoje -- e que ajuda a explicar o desempenho acima da média do PSOL no Estado. No Maranhão, o pacto de convivência pacífica com a oligarquia Sarney funcionou como um veneno permanente, que atingiu o ponto da humilhação total quando o patrono da família foi gravado dando seu voto em Aécio Neves em 2014. 

Nestes dois casos, o saldo foi terrível, no plano local. Mas seria absurdo negar que, entre perdas e danos, muitas vezes injustos e ao mesmo tempo inevitáveis, revelou-se um acerto no plano geral -- a conquista e preservação da presidência, permitindo a execução de programas de governo cujos méritos inegáveis, do ponto de vista da maioria dos brasileiros, não precisam ser recordados aqui. 

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Sabemos que o PT vive um ambiente positivo, de 2017 para cá, fortalecido pela resistência ao golpe, pela recuperação da memória popular sobre os anos Lula. De um ano para cá, o partido reassumiu a posição de mais popular legenda do país, trunfo precioso quando se cogita a possibilidade de uma campanha com Lula na prisão. As caravanas pelas várias regiões do país mostraram uma força popular única, permitindo a recuperação de uma militância que se afastara -- e ainda não retornou plenamente, como ficou claro em São Bernardo, na solidariedade a Lula antes de sua prisão.

Esse papel da militância ganha importância redobrada, é evidente, diante da hipótese de Lula ser impedido de concorrer. O trabalho pessoal de convencimento e discussão assume outra relevância.

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Estrategista e comandante da campanha, a partir de agora Lula terá a missão de apontar suas razões à base do partido, num indispensável chamado a luta num dos momentos mais graves em 500 anos de nossa história. 

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