Haddad na Globo: quando a entrevista se torna tortura psicológica

"Num jornalismo totalitário, que encena entrevistas mas proíbe a necessária discussão de ideias, Haddad foi submetido a um interrogatório pelo Jornal Nacional, com roteiro pré-concebido, no qual não tinha direito de completar um argumento e foi obrigado a brigar para conseguir terminar uma frase", escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247. Para PML, o tratamento mais duro do que nunca a Haddad se explica: "enquanto a elite brasileira busca escolher um candidato fraco, que possa ser pressionado e manipulado longe dos olhos do eleitor, o herdeiro nomeado de Lula tornou-se a encarnação de uma virada  política em curso através das eleições, anunciando que é possível derrotar o condomínio golpista que eliminou direitos e entregou as riquezas do país"

Haddad na Globo: quando a entrevista se torna tortura psicológica
Haddad na Globo: quando a entrevista se torna tortura psicológica (Foto: Ricardo Stuckert)


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As dezenas de interrupções sucessivas de William Bonner e Renata Vasconcelos durante a entrevista de 30 minutos de Fernando Haddad instituiram uma novidade no jornalismo brasileiro.

Não só constituem uma agressividade recorde em comparação com outros entrevistados. Transformaram a entrevista, recurso clássico e respeitável do jornalismo em qualquer parte do mundo, numa forma de tortura psicológica.

Toda pessoa que já enfrentou um interrogatório policial abusivo-- ou assistiu a filmes realistas do gênero -- sabe do que se trata.

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Ninguém está interessado em ouvir o que a pessoa chamada a prestar depoimento tem a dizer. Apenas se quer provar uma tese já pronta, num roteiro pré concebido. A agressividade tenta confundir o raciocínio, a enfraquecer o lado emocional da pessoa.   

Quem viu o depoimento recorda que Haddad não teve direito a completar um pensamento, foi obrigado a brigar para concluir uma frase. A todo momento  tentava-se embaralhar a conversa com  afirmações paralelas, com novas contestações antes que tivesse completado a resposta anterior. 

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Se a agressividade contra candidatos presidenciais é regra nesta eleição, o tratamento especial reservado a Haddad explica-se por uma razão especial.

Dois anos e dois meses depois da deposição de Dilma Rousseff, da qual foi um dos principais alicerces, a TV Globo  enfrenta, ao lado do grande condomínio golpista --  Michel Temer, PSDB, Lava Jato, grupos econômicos nacionais e multinacionais  -- o risco de uma derrota histórica e humilhante.

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Nem mesmo o veto a candidatura Lula, em circunstâncias que não é preciso detalhar aqui, trouxe o resultado esperado. Na sexta-feira, na tela do Jornal Nacional, num movimento de ascensão fulminante nas pesquisas, Haddad já era segundo colocado nas intenções de voto semana -- em primeiro na Vox Populi. Num horizonte que parecia impossível há poucas semanas, em meios políticos que vão muito além do universo petista, ele é visto como favorito para devolver o país ao caminho que trilhou entre 2003 e 2015.

Nessa condição, herdeiro de Lula, símbolo em carne-e-osso de uma reviravolta, tornou-se o inimigo principal.  

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Através do massacre, não só tenta-se desqualificar um cidadão que deveria merecer um respeito gigantesco como um dos protagonistas principais do momento máximo da democracia brasileira. Não estamos diante de uma pegadinha do Faustão mas da escolha do presidente da República, pelo voto livre, direto e secreto -- base da soberania popular, fundamento dos poderes do povo, conforme artigo número 1 da Constituição.

Basta recordar o ambiente trágico que ronda o atual ocupante do Planalto para avaliar a importância particular da eleição de 2018. Para a população, trata-se de uma oportunidade de escolher, democraticamente, um caminho para tirar o país da crise.

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Para o condomínio do golpe, no qual a Globo tem um dos papéis principais, trata-se de encontrar uma saída oposta. Busca-se, pela eleição, a escolha de  um presidente fraco e submisso, e sem força própria. O desgaste, por isso, é a  utilidade maior das entrevistas transformadas em interrogatórios. Candidatos sob suspeita produzem eleições esvaziadas, que irão dar posse a autoridades frágeis, que formarão governos fáceis de pressionar, chantagear e sabotar. Não vamos nos iludir.

Não fosse por sua incapacidade de esconder os próprios segredos, Michel Temer teria o perfil de presidente ideal dessa turma, como demonstrou pelos interesses atendidos entre um escândalo e outro. Jair Bolsonaro tenta seguir o mesmo caminho, tentando se tornar mais aceitável depois que acertou-se com o economista Paulo Guedes -- parceiro da Globo & Cia a partir do Millenium. O plano é "continuar fazendo o que Temer vem fazendo", confirmou Guedes à Globonews. A entrevista ocorreu nesse palanque polarizado. 

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Inimiga histórica da democracia brasileira, que a TV Globo sabotou sempre que teve oportunidade, a entrevista de Haddad ao principal tele-jornal da emissora produziu um grau recorde de estupidez e alienação política. Em nenhum momento o candidato foi autorizado a explicar os planos de governo e ideias para tirar o país do sufoco. Não teve direito a expor uma ideia, a justificar uma crítica, a expor um argumento. É como se este fosse o assunto menos importante. 

No jornalismo totalitário, é proibido discutir ideias. Produto natural do monopólio dos meios de comunicação, que subordina o interesse público aos interesses privados das empresas, não pode haver espaço real para a diversidade política do país. 

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Quem controla a pauta são os apresentadores,  que não são apenas donos de cada minuto, a questão chave de todo programa ao vivo. Também contam com a direção de TV, que controla o movimento das câmaras, além do reforço do ponto de ouvido para informações de última hora e instruções para acentuar ou diminuir a carga sobre o entrevistado.   

Nesse ambiente, em vez de expor e debater ideias que possam contribuir para elevar o grau de informação de uma campanha eleitoral e permitir escolhas bem informadas, a proposta é encenar uma farsa, um teatro no qual a entrevista é apenas uma embalagem para disfarçar um monólogo construído na forma de perguntas.   

Colocado no palco de um teatro absurdo,  Haddad foi o entrevistado que tinha de pedir licença para falar. Num ambiente inteiramente adverso, saiu-se bem. 

Atuou como uma espécie de  ombusdman, aquele profissional que as empresas de comunicação contratam para fazer a crítica interna dos próprios  veículos. Impedido de apresentar as próprias  idéias, dedicou boa parte do tempo para demonstrar erros e distorções  contidos nas perguntas. Confirmou a atuação parcial dos entrevistadores, sem relação com o jornalismo, como robôs numa guerra cibernética. No final, Haddad desconstruiu o retrato que a dupla de entrevistadores pretendia impor.

Num país que enfrenta uma das mais graves crises de sua história, com tantas desilusões concentradas, o público tinha direito a ouvir e debater mais, para concordar ou discordar. Anunciado como uma oportunidade de falar e ouvir, o interrogatório ajudou a calar e censurar. 

Você pode ter a opinião que quiser sobre Fernando Haddad, um candidato que recebe críticas dentro do PT e de seus aliados. Pode discordar de todas ou de parte de suas ideias. Mas sua potência intelectual e sua capacidade de explicar os problemas do país dentro de um ponto de vista coerente é inegável -- foi isso que o interrogatório fez o possível para esconder. 

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