Com Marina Ruy Barbosa, o melhor filme de Tata Amaral
"Com 22 anos de cinema, Tata Amaral retrata a periferia da periferia em 'Sequestro Relâmpago', filme de suspense numa noite sem fim na qual uma jovem branca de classe média é sequestrada por dois pequenos bandidos," escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247. "Apoiada numa visão teimosamente humanista sobre seus personagens, Tata Amaral nos fala de pessoas que até se encostam mas jamais poderão se aproximar, conversam mas não conseguem se entender, demonstram sua força mas nunca estão em segurança. Este é o país do filme."
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Vinte e dois anos depois de Um Céu de Estrelas, seu primeiro longa metragem, a câmera de Tata Amaral retorna à brutalidade paulistana com Sequestro Relâmpago. É um belo filme, o melhor de uma obra que inclui Antonia, Hoje e Trago Comigo. A estréia é hoje, em 19 cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, Brasília, Fortaleza e Recife.
Filmado com uma segurança que a experiência acumulada e bem digerida costuma permitir, Sequestro combina ritmo, surpresa e suspense. Possui traços bem desenvolvidos pelo grande cinema norte-americano, sem jamais se afastar de personagens que marcam os contrastes e a miséria da realidade brasileira, que os três protagonistas do filme irão percorrer numa noite sem fim.
Com base numa história real, Sequestro conta com um elenco de atores encabeçado por Marina Ruy Barbosa, que assume seu papel com uma garra que emociona, ao lado da presença forte de Daniel Rocha e Sidney Santiago Kuanzao. Com muita ação, o melhor do filme reside numa tensão permanente e bem resolvida.
O enredo mostra aquilo que nós fomos ensinados a aguardar numa história que coloca uma moça -- linda, branca, emancipada --, ao lado de dois jovens de pele mais escura da periferia da periferia que pagam as contas, inclusive fraldas de bebê, através de assaltos a caixas eletrônicos e venda de mercadorias roubadas.
Em vários momentos Sequestro Relâmpago sugere a possibilidade de transformação de um crime horrendo num agradável envolvimento romântico entre os personagens, no melhor estilo do suspense hollywoodiano que desde o início do século XX procura dissolver as mazelas do mundo com muita água com açúcar na tela dos cinemas. Sem perder a delicadeza, a todo momento Sequestro nos faz recordar as asperezas, a violência, as distâncias e demais verdades do Brasil real -- que impedem qualquer aproximação verdadeira entre pessoas que só estão juntas em função da ameaça de um revólver.
Capaz de descrever um universo de medo e risco sem comprometer uma visão teimosamente humanista sobre seus personagens, Tata Amaral nos fala de pessoas que até se encostam mas jamais poderão se aproximar, conversam mas não conseguem se entender, demonstram sua força mas nunca estão em segurança. Este é o país do filme.
Quando o filme termina, você percebe que, após uma hora e 25 minutos de suspense, Sequestro Relâmpago é acima de tudo uma reflexão sobre uma sociedade que está longe de ter atingido aquilo que poderia ter sido, com homens, mulheres e jovens que não tiveram o direito de viver seu potencial e nunca se tornarão aquilo que poderiam ter sido.
Iniciado em 2014, filmado em 2017, exibido em 2018, Sequestro traduz um momento histórico que vai chegando ao fim, após tantas dificuldades e tantas esperanças. Apresenta momentos que parecem puro sonho -- como uma bela sequencia numa boate miserável na periferia da periferia -- mas não tira os pés do chão.
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