Ideologia de gênero? Antes fosse...

O que estão fazendo e de verdade, estão fazendo, é potencializando culturas, hábitos e costumes e que irão redundar, de uma maneira ou de outra, em crimes diversos contra as mulheres



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O último Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2015 traz grandes lições. Sua lição principal não reside no corriqueiro esperneio da oposição de direita sobre uma única questão envolvendo o pensamento libertário da intelectual francesa Simone de Beauvoir (1908-1986) e sua frase emblemática: "não se nasce mulher, torna-se mulher!", fragmento que inaugura o volume dois do principal trabalho de Beauvoir "O Segundo Sexo" [Le Deuxième Sexe], (1949) e o tema da redação da seleção: "A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira".

Sem maiores desvios, preciso me reportar, de fato, aos contributos intelectuais de Simone de Beauvoir para tentar, quem sabe, expressar o significado dessa obra ainda e sobretudo, para os dias de hoje.

Em levantamento realizado pelo jornal francês Le Monde e a Empresa Francesa de Distribuição de Bens Culturais (FNAC) em 1998, o "O Segundo Sexo" se situa entre as vinte principais obras do século XX e que mais influenciaram a humanidade no período em questão. Não é pouca coisa!

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Está no panteão das grandes produções ao lado de autores como Franz Kafka (O Processo), Jean Paul Sartre (O Ser e o Nada), Ernest Hemingway (Por quem os sinos dobram) e Claude Lévi-Strauss (Tristes Trópicos).

No Brasil, o livro de Simone de Beauvoir, editado pela Editora Civilização Brasileira, é organizado em dois volumes. O volume I, "Fatos e Mitos" aborda o peso das ideologias e suas respectivas implicâncias às vidas das mulheres; e o volume II ou a "Experiência vivida" trata dos papéis sociais, políticos e econômicos das mulheres nas sociedades contemporâneas.

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Definitivamente é um clássico das ciências sociais, um marco teórico militante e social e que tem a proeza de desnudar a desgraça de ser mulher em uma sociedade de castas sociais, políticas e econômicas como a que vivemos. Não casualmente, em 1967, na edição de "O segundo Sexo" pela Difusão Europeia do Livro, o fragmento do filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard (1813-1855) e que introduz a obra ira citar: "Que desgraça ser mulher! Entretanto, a pior desgraça quando se é mulher é, no fundo, não compreender que sê-lo é uma desgraça...".

O pensamento de Kierkegaard anuncia e denuncia não só a tragédia da condição da mulher, mas também e principalmente, o amplo e vigoroso adensando ideológico e portanto, alienante e que garante vida e sobrevida ao milenar despotismo masculino sobre a vida das mulheres.

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Pois bem... A exploração e o martírio feminino é real, não é um invento de "comunistas perigosos", não é um neologismo de "mulheres mal-amadas"... Nada disso! Os dados contam! Para o trágico caso brasileiro, segundo a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), em 2014, do total de 52.957 denúncias de violência contra a mulher, 27.369 corresponderam a denúncias de violência física (51,68%), 16.846 de violência psicológica (31,81%), 5.126 de violência moral (9,68%), 1.028 de violência patrimonial (1,94%), 1.517 de violência sexual (2,86%), 931 de cárcere privado (1,76%) e 140 envolvendo tráfico (0,26%). A tragédia segue e conta que: 43% das mulheres em situação de violência sofrem agressões diariamente; para 35%, a agressão é semanal.

Entre 1980 e 2010 foram assassinadas mais de 92 mil mulheres no Brasil; 43,7 mil somente na última década. O Mapa da Violência irá demonstrar que, de 2001 a 2011, o índice de homicídios de mulheres aumentou 17,2%, com a morte de mais de 48 mil brasileiras nesse período. Só em 2011 mais de 4,5 mil mulheres foram assassinadas no país do samba.

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É como se nós, os machos brasileiros, destruíssemos, mais ou menos, 370 vidas femininas em todos os meses. Não é pouca coisa! São doze mortes ao dia. Para vaga ideia do que tento dizer não há qualquer conflito bélico no mundo atual que mate tantas mulheres. Nem na Síria, Afeganistão, Bogotá, Bagdá, nos morros do Rio ou nas periferias de São Paulo, nada se compara ao genocídio feminino que a pátria brasileira perpetra contra suas mulheres. Linhas gerais, nós, os homens somos, de alguma forma ou maneira, assassinos, aceitemos isso ou não!

Sobre a violência sexual, temos um amplo e trágico continente de desgraças à parte e que prefiro nem discutir por aqui, mas sugiro o excelente trabalho de Daniel Cerqueira e Danilo de Santa Cruz Coelho: "Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde" [Nota Técnica no. 11; Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas - IPEA. Brasília. Março de 2014. Disponível na internet].

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Na verdade, nem sei o que dizer quando leio ou escuto declarações cretinas e notadamente fascistas, de criminosos como os deputados federais Marco Feliciano ou o indefectível Jair Bolsonaro.

O que estão fazendo e de verdade, estão fazendo, é potencializando culturas, hábitos e costumes e que irão redundar, de uma maneira ou de outra, em crimes diversos contra as mulheres. As declarações que essas bestas humanas emitem devem ser enquadradas como apologia ao crime, como fomento e indicação ao crime contra a vida feminina nesse país. É do que se trata!

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