“A Palestina é uma prisão a céu aberto”

As parcas e enviesadas informações que nos chegam sobre o conflito na Palestina, e mesmo nas regiões árabes como um todo, não permitem montarmos um quadro mais geral dos interesses em disputa. Daí a relevância das contribuições de especialistas no tema



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As parcas e enviesadas informações que nos chegam sobre o conflito na Palestina, e mesmo nas regiões árabes como um todo, não permitem montarmos um quadro mais geral dos interesses em disputa. Faltam-nos elementos para entender o apoio incondicional das potências ocidentais aos abusos e as ilegalidades cometidas pelo Estado de Israel. Penoso também é estabelecer relações entre o estado policial na Palestina e no Brasil. Daí a relevância das contribuições de especialistas no tema que veremos a seguir.

Um colonialismo de roupa nova com a fundação do Estado de Israel

"No Oriente Médio, o imperialismo europeu começa pós-primeira guerra mundial, quando em outros lugares começou a se desintegrar, que é o verdadeiro experimento feito pelos britânicos e os franceses. Desenharam os mapas em todo o Oriente Médio. E esse experimento veio a se fazer depois, no ambiente da segunda guerra mundial (...) que é a história da criação do Estado de Israel.

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Então, a criação do Estado de Israel é um experimento na perspectiva do colonialismo ocidental que deu certo. (...)

Logo após a partilha da ONU, não estou entrando nas razões, nem na interpretação, estou constatando, o fato é que Israel ganhou a guerra dos árabes. Então ele começou a se mostrar um parceiro confiável dos EUA. (...)
Israel começou a ser o polo avançado do colonialismo, um novo colonialismo, mantendo a ideia de dominação de espaço, população e recursos, então portanto colonialismo, mas de uma nova forma."

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Essa foi parte da exposição do professor Reginaldo Nasser no evento Palestina como polo de resistência: de Bolsonaro a Netanyahu, realizado pelo movimento Estudantes em Solidariedade ao Povo Palestino - USP‎ ontem, 22/05, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas na USP. O evento buscou marcar os 71 anos de 'Al Nakba', a 'catástrofe' para os cerca de 700 mil palestinos obrigados a abandonar suas casas com a criação do Estado de Israel e os conflitos daí resultantes.

"Conta pro mundo o que vocês estão vendo aqui"

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Gal Souza, presidente do movimento Soweto Organização Negra, contou sobre sua ida à Palestina com 16 militantes em 2015:

"Israel não permitiu nossa entrada em Gaza. Nós ficamos cinco dias da Cisjordânia. E perguntávamos para os palestinos e palestinas o que eles gostariam que a gente fizesse porque a situação é ultrajante, ela é terrível. Eles falavam: 'conta pro mundo o que vocês estão vendo aqui'. Em resumo, o que é a Palestina? A Palestina é uma prisão a céu aberto. E a pouca ação que você faz para tentar garantir minimamente o direito de ir e vir, isso é vetado por Israel e esses palestinos são submetidos a prisão totalmente fechada."

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O Estado de Israel como base militar da Otan

Reda Soueid, militante do campo progressista árabe, descreveu sua vivência na região:

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"O conflito como a maioria diz e fala que é palestino israelense está errado. Não é isso. O conflito é árabe anticolonialismo, o sionismo é parte, é uma ferramente do colonialismo daquela região. (...)

A Palestina é o território escolhido para iniciar a implantação de uma base militar avançada e colonial. A Palestina é o começo desse grande projeto que hoje a gente vê e percebe essa guerra que o ocidente lançou sobre todo o Oriente Árabe e o Leste Árabe, o Ocidente Árabe, que é o norte da África.

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O que se vive hoje, que deram o nome de Primavera Árabe, na verdade é a sequência. A base militar que foi implantada, que é o Estado de Israel, foi desde o começo programada para se chegar até esse mapa [que mostra a expansão de Israel sobre territórios árabes] e muito mais, ela não atinge somente o território palestino.

Ela tem um objetivo muito maior que é estabelecer o domínio sobre toda aquela região e tendo o guarda principal, o bem armado e equipado o exército, intitulado, exército de defesa israelense, que é, na verdade, nada mais nada menos, do que uma divisão da Otan naquela região."

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O apoio das grandes potências vem da fundação do Estado de Israel até hoje

Perguntado sobre a colonização como projeto de Estado, e não como projeto do governo Netanyahu, o professor Nasser respondeu:

"O Estado de Israel, é importante voltar à origem, porque teve uma época, mesmo alguns movimentos ligados à libertação da Palestina ficaram mais presos, não que não seja importante, à Guerra dos Seis Dias e à ocupação (...) depois se começou a refletir, cada vez mais, sobre a necessidade de, sempre, voltar à fundação do Estado de Israel. A fundação inclusive revela tanto esse projeto colonialista, como também revela a movimentação que teve de todas as grandes potências. Todas as grandes potências apoiaram a Fundação do Estado de Israel e esse apoio continua até hoje", pontuou Nasser.

Semelhanças entre Palestina e Brasil

A evidente semelhança entre o estado policial na Palestina e, por exemplo, numa favela carioca é revelada por esse trecho do artigo Pacification, Capital Accumulation, and Resistance in
Settler Colonial Cities: The Cases of Jerusalem and Rio de Janeiro, por Bruno Huberman e Reginaldo Nasser, para a revista Latin America Perspectives.

Apontar as semelhanças, afirma Huberman e Nasser, pode significar "contribuir para a resistência colaborativa brasileira, palestina e israelense ao colonialismo de ocupação, ao capitalismo e ao racismo".

Jerusalém

"Uma medida destinada a controlar os palestinos são os cartões magnéticos que servem como identificação para os residentes. Eles contêm informações sobre a íris e biometria digital que podem ser acessadas nos postos de controle pelos soldados israelenses.

Junto com câmeras de vigilância inteligentes espalhadas pela cidade e um sistema de dados computadorizado, elas estabelecem controle automatizado sobre os palestinos em relação a todos os aspectos de suas vidas. Portanto, os palestinos em Jerusalém podem ser multados e detidos a qualquer momento por um policial israelense por várias razões.

Para os palestinos, a experiência de viver em enclaves em Jerusalém significa constante perseguição e monitoramento. Sua existência é disciplinada diariamente por ações policiais que representam uma ameaça constante.

Além disso, mais e mais palestinos estão confinados a assentamentos criados exclusivamente para judeus como Kafr Aqab e o campo de refugiados de Shuafat. Eles são deixados para se defenderem sozinhos e submetidos a ações policiais e militares, como entrar nas casas das pessoas sempre que quiserem, mesmo que não tenham mandado. Desta forma, ações cotidianas como comprar pão, ir à escola e visitar amigos tornam-se atos potencialmente perigosos que podem levar à morte ou à prisão."

Rio de Janeiro

"Apoiada por grandes corporações nacionais e transnacionais como Coca-Cola, Souza Cruz e Bradesco Seguros, além de empreiteiros, prestadores de serviços privados, associações empresariais, organizações não-governamentais e a Confederação Brasileira de Futebol, as ocupações, pelo governo, de favelas controladas pelas drogas, começaram em 2008, quando a polícia passou de restringir as atividades proibidas para controlar áreas consideradas perigosas.

Unidades de pacificação operam como postos de controle, monitorando moradores de favelas e traficantes, interrompendo a estruturação socioespacial urbana, criando limites internos e restringindo os movimentos da população, que enfrentam um estado de sítio constante.

Como resultado das restrições impostas ao seu desenvolvimento, incluindo a remoção de casas e a construção de muros e barreiras por razões "ambientais" e planejamento urbano, as favelas tornaram-se "reservas" virtuais para o confinamento de populações de raças específicas, desconectadas umas das outras e fortemente monitoradas por dispositivos como câmeras e drones.

A presença diária e o controle do movimento nas favelas não impediram a criminalidade, mas simplesmente aumentaram a vigilância e a interrupção do cotidiano de seus moradores."

Os EUA deveriam cumprir a lei, diz Chomsky

O renomado linguista Noam Chomsky disse em Boston, em abril, que:

"Na verdade, se você olhar as pesquisas, as pessoas que se identificam como democratas, agora tendem a apoiar os direitos dos palestinos muito mais do que Israel. Essa mudança é dramática.

Uma simples proposta é que o governo dos Estados Unidos cumpra a lei dos EUA (...) Os Estados Unidos têm leis, como a chamada Lei Leahy, Lei Patrick Leahy, que exige que nenhuma ajuda militar possa ser dada a qualquer organização militar que esteja envolvida em abusos sistemáticos de direitos humanos.

Bem, o Exército israelense está envolvido em enormes violações de direitos humanos. Se os EUA cumprissem as leis dos EUA, cortaríamos a ajuda às FDI, o Exército israelense. Esse passo por si só teria um efeito importante - não apenas ajuda material, mas o significado simbólico disso."

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