O golpe de 2016 e o futuro da democracia brasileira

Como não houve crime de responsabilidade, o impedimento da Presidenta Dilma Rousseff foi um verdadeiro Golpe de Estado, que teve o Congresso Nacional como algoz, o STF como espectador indiferente e uma parcela da sociedade brasileira, incitada pela grande mídia, como bucha de canhão

Como não houve crime de responsabilidade, o impedimento da Presidenta Dilma Rousseff foi um verdadeiro Golpe de Estado, que teve o Congresso Nacional como algoz, o STF como espectador indiferente e uma parcela da sociedade brasileira, incitada pela grande mídia, como bucha de canhão
Como não houve crime de responsabilidade, o impedimento da Presidenta Dilma Rousseff foi um verdadeiro Golpe de Estado, que teve o Congresso Nacional como algoz, o STF como espectador indiferente e uma parcela da sociedade brasileira, incitada pela grande mídia, como bucha de canhão (Foto: Agassiz Almeida Filho)


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A quebra da normalidade institucional ocorrida em 2016 gera fatos surpreendentes todos os dias. Nas últimas semanas, vários ataques foram desferidos contra as universidades que estão analisando o Golpe de 2016 e os seus efeitos no futuro da democracia brasileira. Atores políticos apaixonados, vindos praticamente de todas as partes, acusam essas universidades e seus professores de propaganda eleitoral antecipada, utilização da máquina pública para promover ideologia partidária, improbidade administrativa, conexões com o bolivarianismo, comunismo etc. Foi necessária a interferência da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão para “estancar a sangria” de denúncias e investigações sem nenhum fundamento jurídico.  A estupidez e a má-fé em tempos de golpe parecem não ter limites.

Uma universidade pode ou não discutir o que ocorre na realidade política de um país? Um professor universitário tem autonomia para analisar a Guerra da Síria e assumir uma posição teórica sobre ela? É possível criar uma disciplina sobre os conflitos entre Israel e Palestina nos últimos dois anos? O ambiente universitário admite um curso de extensão que tenha como objeto a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal e posições contrárias ou favoráveis a ela? Se vários grupos políticos divergem sobre a existência de um golpe parlamentar em 2016, mais um motivo para a comunidade universitária refletir e se pronunciar. É tão absurdo negar essa função da universidade que as únicas explicações para os ataques contra a análise acadêmica do Golpe de 2016 são mesmo a estupidez e a má-fé.  

Quanto à ocorrência do Golpe de 2016, não adianta escrever nada para aqueles que agem de má-fé. São pessoas revoltadas com as universidades e com a democracia porque discutir sobre o Golpe fere os seus partidos formais, seus privilégios, interesses, suas verdades e emoções. As discussões sobre o Golpe também ameaçam a barreira invisível que existe entre essas pessoas e o povo brasileiro. Podem ajudar a restaurar a estrutura constitucional de 1988 e a normalidade institucional. Como o ambiente de ódio está grassando na realidade brasileira atual, entender as circunstâncias do Golpe de 2016 talvez traga mais conversões – quando o indivíduo deixa de negar o Golpe por estupidez e passa a fazê-lo por má-fé – do que vontade real de restaurar a ordem democrática perdida.

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No regime democrático, não se pode interromper o mandato de um Presidente da República, a não ser que ele tenha cometido crime de responsabilidade ou crime comum. No Golpe de 2016, os crimes comuns (assassinar alguém, contrabandear, roubar etc.) estão descartados porque nunca houve qualquer notícia de que a Presidenta Dilma Rousseff os tenha praticado. Fica a questão do crime de responsabilidade, que é definido pelo art. 85 da Constituição de 1988 da seguinte forma: é o ato do Presidente da República que atenta contra a Constituição Federal. Portanto, se um ato presidencial é apenas ilegal, não configura crime de responsabilidade; se o ato do Presidente da República contraria o texto da Constituição, ele é inconstitucional e não tem relação com os crimes de responsabilidade.

Então, quais são aos atos que atentam contra a Constituição? São todos aqueles que têm como objetivo destruir a ordem constitucional, que atentem contra a existência da própria Constituição. Se o Presidente frauda a lei orçamentária para financiar o braço armado do seu partido, se determina o fechamento do Supremo Tribunal Federal, se não aceita o resultado de eleições legítimas e convoca as Forças Armadas para permanecer no poder, são para casos deste tipo que foi criada as figuras do crime de responsabilidade e do impeachment, instituto, por exemplo, que nunca chegou a tirar um Presidente da Casa Branca em mais de duzentos anos de história dos Estados Unidos . As tais pedaladas fiscais e outras operações financeiras do Governo Dilma mencionadas no processo de impeachment não possuem nenhuma relação com o delito de responsabilidade. Foram fogos de artifício para tentar esconder o Golpe parlamentar consumado em 2016.

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Como não houve crime de responsabilidade, o impedimento da Presidenta Dilma Rousseff foi um verdadeiro Golpe de Estado, que teve o Congresso Nacional como algoz, a Operação Lava Jato como garante, o STF como espectador indiferente e uma parcela da sociedade brasileira, incitada pela grande mídia, como bucha de canhão. O impeachment que deu origem ao Golpe foi uma espécie de catarse para setores do Brasil cansados da emancipação humana, da igualdade e da distribuição de renda. Foi o grito de liberdade do conservadorismo, do ódio, da intolerância e da violência. A fúria da sociedade escravocrata.

Sobretudo neste momento de grave crise política, econômica e institucional, o papel da universidade é tentar entender como e por que um fenômeno tão devastador como o Golpe de 2016 aconteceu no Brasil, quais as suas consequências para a nossa democracia e a sociedade como um todo. Mas todos esses esforços soam mal no ambiente de estupidez e má-fé que se realiza emocionalmente com o Golpe e com a libertação de todos os seus preconceitos inconfessáveis. À universidade, porém, cabe continuar desempenhando o seu papel histórico na defesa do conhecimento e da liberdade científica. 

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PS: Para aqueles que quiserem se aprofundar sobre a figura do crime de responsabilidade no Golpe de 2016, conferir o texto intitulado Impeachment e Democracia, de minha autoria, publicado na Revista de Direito Constitucional e Internacional, nº 103, 2017, pp. 191 a 221, publicada pela editora Revista dos Tribunais.

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