Áurea, Duda e o crescimento do PSOL em MG

É saudável para a democracia brasileira o crescimento do PSOL, visto que este representa uma alternativa à esquerda que, ainda pouco viciada pelas regras do jogo em que se disputa o poder Executivo, consegue levantar bandeiras que o PT deixou de priorizar



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Em 2016, em meio a um golpe de Estado no Brasil, enfrentando a pior onda conservadora que tomou o país desde a ditadura militar, a professora de sociologia Áurea Carolina, negra e feminista, foi eleita a vereadora mais votada de Belo Horizonte pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), com quase 20 mil votos. Uma das poucas vitórias da esquerda daquele ano no Brasil e, certamente, a mais importante em Minas Gerais.

Acompanhada de uma imensa militância, seu discurso da vitória no centro de BH teve por palavra de ordem o grito que acompanhou sua campanha: "Ah, é mulher preta!", num ato de reapropriação e ressignificação da expressão fruto da cultura machista e racista de nossa sociedade. Em 2018, Áurea é candidata a deputada federal e tenta repetir o sucesso de dois anos atrás, tendo a seu lado a imensa repercussão nacional de seu mandato e o caráter simbólico de, tanto do ponto de vista representativo quanto por sua atuação social na periferia de Belo Horizonte, a socióloga ser a personificação mineira do mito Marielle Franco. Neste ano, segundo o presidente nacional da legenda, Juliano Medeiros, ela pode chegar a 100 mil votos e abrir espaço para uma bancada mineira de seu partido.

Entretanto, na disputa estadual de 2018 o PSOL vai mais longe e pretende eleger a primeira senadora transexual do Brasil, a também professora Duda Salabert, que leciona literatura e atua como educadora popular na grande BH. Com mais este desafio, o PSOL mineiro se consolida como uma alternativa ao Partido dos Trabalhadores (PT), ao fazer a defesa aberta de segmentos minoritários em nossa sociedade. Neste campo, pelo aspecto mais engendrado na política de alianças e nas relações de poder que adquiriu nos últimos 20 anos, a principal legenda da esquerda brasileira fica a dever, sobretudo em Minas.

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Numa campanha ao Senado nivelada por baixo, em que são disputadas duas vagas e há apenas uma candidata favorita, a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), Duda pode despontar por seu poder aglutinador de diversas forças progressistas no estado, que buscam uma opção para fazer a dobradinha com Dilma. Ao se recurar a formar chapa com o PMDB, a petista acabou tendo ao seu lado o desconhecido Jorge Luna (PT), tesoureiro do diretório estadual do partido. Na prática, o PT ocupa a vaga para não precisar fazer campanha para eventuais candidatos cujas legendas, seja o MDB ou o PSB, apoiaram o golpe de 2016. Desta forma, libera sua militância para se reagrupar em torno de diferentes candidaturas de esquerda.

Neste cenário, Duda surge com força. Ganhou a imprensa nesta semana e, em poucos dias, viu seu engajamento nas redes sociais multiplicar-se à medida que se tornou conhecida. Deve enfrentar, claro, a resistência dos setores mais conservadores da sociedade e, mesmo com nomes pouco expressivos no campo da direita, como o deputado federal Rodrigo Pacheco (DEM), o jornalista da TV Record Carlos Viana (PHS), além de diversos nomes de partidos nanicos, é possível que uma eventual ascensão da professora impulsione um adversário que represente o voto útil das forças conservadoras.

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Apesar disso, num quadro em que, abaixo de Dilma Rousseff, que hoje teria 26% dos votos segundo o DataTempo, o outro senador eleito seria Carlos Viana com 11% e todos os demais não passam do primeiro dígito, há potencial para que Salabert reúna os votos identitários que, para além de Dilma, não viam outra opção em quem votar. Se, hoje, metade dos votos da ex-presidenta compuser-se de eleitores do campo ideológico do voto petista (há também o campo econômico, ou seja, aqueles que identificam o PT à melhora na sua qualidade de vida, sem que isso passe por questões ideológicas de ordem social, trabalhista, racial, de gênero etc), num estudo pessimista seria mais de 10% do eleitorado estadual que não se dispõe a apoiar Carlos Viana, o que viabiliza um nome ainda desconhecido.

É saudável para a democracia brasileira o crescimento do PSOL, visto que este representa uma alternativa à esquerda que, ainda pouco viciada pelas regras do jogo em que se disputa o poder Executivo, consegue levantar bandeiras que o PT deixou de priorizar. Note-se que, hoje, o principal representante da causa LGBT no Congresso, o deputado federal Jean Wyllys, é do PSOL, assim como as principais símbolos do movimento negro hoje no Rio, Marielle Franco, e em Belo Horizonte, Áurea Carolina. Na mesma linha, a principal defensora de direitos humanos e das minorias na Câmara Municipal de São Paulo, Sâmia Bonfim.

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A existência do PSOL representa, em primeiro lugar, um lugar de reflexão que pode delinear o futuro das lutas populares no país, assim como o Bloco de Esquerda de Portugal (BE), o Podemos espanhol e a França Insubmissa. No momento atual, para além de um debate franco sobre os avanços da esquerda, esses partidos cumprem com o papel de tirar do conforto, do "lugar quentinho do poder", legendas históricas como o PSOE espanhol e os Partidos Socialistas português e francês. No Brasil, o mesmo processo pode e deve se dar com PT, que hoje volta a dialogar com as massas ao fazer a vanguarda da oposição ao golpe jurídico-midiático-parlamentar que vive o país, mas que encontrará dificuldades em seguir em frente com bandeiras fundamentais dos trabalhadores e das minorias, uma vez que, se eleito, terá de compor um Governo aliado a forças conservadoras.

Sem um apoio crítico e forte à esquerda, que dê maior representatividade a setores minoritários nas relações de poder, o PT pode novamente se perder. Por isso é tão importante a candidatura de Duda Salabert ao Senado Federal e, igualmente, Áurea Carolina e uma eventual bancada na Câmara dos Deputados do PSOL mineiro, num estado que, elegendo 53 deputados (menos apenas que São Paulo, onde são 70), pode ajudar o partido a alcançar sua meta de dobrar de seis para 12 os seus deputados.

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