Temer quer Exército atuando como os capitães do mato

Capitão do Mato era o nome que se dava ao caçador de escravos foragidos no fim do século XIX. Poucos poderiam imaginar que, mais de um século depois, o presidente Michel Temer atribuiria às Forças Armadas uma missão no mesmo nível de dignidade

Tropa de choque entra em presídio de Alcaçuz em Natal. 18/1/2017. REUTERS/Josemar Gonçalves
Tropa de choque entra em presídio de Alcaçuz em Natal. 18/1/2017. REUTERS/Josemar Gonçalves (Foto: Jose Carlos de Assis)


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Capitão do Mato era o nome que se dava ao caçador de escravos foragidos no fim do século XIX. O Exército acabou por repudiar essa tarefa em nome de sua dignidade funcional. Poucos poderiam imaginar que, mais de um século depois, o presidente Michel Temer atribuiria às Forças Armadas uma missão no mesmo nível de dignidade: tomar conta das revistas em presídios conflagrados. Claro, todo trabalho honesto deve ser respeitado. Contudo, este é trabalho que requer um mínimo de especialização. Não pode ser improvisado.

Fico imaginando como, na estrutura hierarquizada das Forças Armadas, base de sua disciplina e de sua força, vamos equilibrar as patentes. A quem caberá o comando da patrulha nas alas dos presídios? A um cabo? Ou a um general de três estrelas? É claro que, preocupado em fazer grandes cortes nos gastos públicos e implementar a PEC da Morte, que congela os gastos públicos por 20 anos, Temer não deve ter tipo tempo para pensar no assunto. E o equilibrado general Villas Boas, tomado de susto com a proposta, teve que engoli-la.

Teremos, pois, novos capitães do mato espalhados pelos presídios brasileiros com o objetivo de pacificar a consciência de uma elite dirigente debochada que usa a estrutura do poder a seu bel prazer e agora quer fingir responsabilidade social. Imagino o clima de perplexidade e revolta que grassa hoje nas Forças Armadas diante dessa decisão absurda. Seria o caso de algum general mais irritado dizer para Temer: "Bem, senhor presidente, já que está tão preocupado com os presídios, fique com eles, e nós ficamos com o governo."

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Como esta, obviamente, não seria uma solução ideal, a alternativa é buscar na área civil um meio decente de tratar não apenas os presídios, mas o governo como um todo. A primeira medida profilática é não permitir que os futuros presidentes do Senado e da Câmara sejam reféns do STF por conta de implicações com a Lava Jato. Como a perspectiva de uma eleição presidencial está muito próxima, é fundamental que haja nesses cargos personalidades de caráter forte e capazes de conduzir a sucessão sem interferências judiciais espúrias.

O próximo ponto é assegurar a aplicação de um plano econômico de emergência para romper a crise pois a sociedade já não suporta a incompetência política para superá-la. O momento seguinte é aceitar a renúncia inevitável de Michel Temer e de seus comparsas do Planalto e organizar a eleição, necessariamente indireta por razões constitucionais, de um novo Presidente da República. Em seguida, o novo Governo teria que meter o pé no acelerador, a começar pela revogação da PEC da Morte, e ampliar gastos públicos keynesianos.

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A situação da conjetura, entretanto, exige que se trate dos problemas emergenciais dos presídios porque não poderemos iniciar um novo ciclo político no Brasil com matanças em série de presos. O senador Roberto Requião, que manifestou sua indignação com a atribuição às Forças Armadas da função de guarda de presídio, tem uma larga experiência no setor como governador três vezes do Paraná, quando construiu 12 presídios e quase resolveu o problema carcerário, exceto pelo fato de que a Justiça os estava entupindo continuamente com novos presos.

Para o senador, duas providências são essenciais: tipificar a posse de drogas e limitar as prisões temporárias. No caso das drogas, a lei descriminalizou o uso, mas deixou a critério do juiz o que é uso e o que é tráfico. No caso das prisões temporárias, trata-se de um crime contra os negros, os pobres e os mulato que são jogados nos presídios, sem condições de ter um advogado próprio ou público, e lá apodrecem por anos, muitas vezes ocupando o lugar de presos muito mais perigosos. Resolvido isso, resolve-se metade do problema.

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No lado privilegiado da sociedade, o estamento político, já é tempo de criminalizar o caixa dois das campanhas eleitorais, mesmo sabendo que isso beneficiaria regressivamente pessoas que o usaram em eleições passadas. A reação feroz dos promotores da Lava Jato a essa descriminalização é um acinte. Toda lei nova anistia ações do mesmo tipo adotadas em tempos anteriores. É da natureza do processo penal. Se, no caso da criminalização do caixa dois, houver políticos beneficiários, é do jogo. O que não pode é que a proposta seja feita em claro benefício próprio por presidentes da Câmara e do Senado sem credibilidade.

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