O mau combate de Abrahão

O novo ministro da Educação, o mestre em Administração de empresas Abrahão Weintraub, afirmou que sua prioridade, à frente do MEC, é o combate ao que ele chama "marxismo cultural" das universidades brasileiras

O mau combate de Abrahão
O mau combate de Abrahão


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O novo ministro da Educação, o mestre em Administração de empresas Abrahão Weintraub, afirmou que sua prioridade, à frente do MEC, é o combate ao que ele chama "marxismo cultural" das universidades brasileiras. Indicado pelo "filósofo" e jornalista Olavo de Carvalho, disse o novo ministro que é preciso combater os preconceitos antissemitas dos nordestinos e transformar o ministério num excelente instrumento de parcerias e acordos com o Estado de Israel, sobretudo no que tange à agricultura em região semiárida e irrigação. O gasto de tempo e dinheiro com filosofia, sociologia e história pelos estudantes nordestinos seria uma pura perda de capital humano e social numa região pobre e maltratada pelas secas. Imagine o que pensaria o senhor Weintraub da contribuição de um professor de filosofia para uma nova coletânea sobre René Descartes, na iminência de ser lançada no Brasil. Ou cursos e seminários sobre a Escola de Frankfurt e seus pensadores.

Mas o que é "o marxismo cultural"? - alvo da cruzada pedagógica desse novel ministro da Educação (?) - Essa expressão quer designar aquilo que se chama "marxismo ocidental", para se contrapor ao marxismo oriental (soviético). Seus principais fundadores foram: Georg Lucaks, Ernest Bloch e Karl Korsch. E a bíblia desse movimento foi o livro seminal: História e consciência de classe, do filósofo húngaro. Suas fontes de inspiração: Hegel e Marx. Suas categorias básicas: consciência, dialética e totalidade. O denominado "marxismo cultural" é uma corrente de ideias que resolveu fazer a crítica da cultura, no capitalismo tardio, da mesma forma como Marx fez a crítica da economia política burguesa.

Utilizando as categorias da filosofia hegeliana, a tese desses autores era aplicar a dialética, a práxis e o conceito de totalidade aos fenômenos da cultura moderna e contemporânea, vendo aí os entraves políticos e ideológicos para a transformação da sociedade. Neste ponto, avulta-se, pela importância, os conceitos de alienação e reificação, produzidos pela mercadoria, a divisão técnica e social do trabalho e o dinheiro. Num contexto de sofisticação dos meios de dominação e manipulação das necessidades humanas, essas categorias filosóficas pareciam abandonar o chão da fábrica para abranger os paraísos de consumo, em que se tornaram as sociedades capitalistas mais desenvolvidas.

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Para além da crítica puritana e ascética ao hedonismo dessa sociedade "hightec", onde todos podem democraticamente comprar o que quiserem para apascentar sua angústia, os críticos culturais neo marxistas consideram o caráter desumano (coisificante) da generalização do acesso aos bens de consumo, não pelo consumo em si, pelas pela permanente criação de novas necessidades e a obsolescência calculada das mercadorias compradas. Processo este tão bem descrito pelo nosso poeta Carlos Drummond de Andrade, no verso "Eu etiqueta", e terrivelmente ilustrado por Franz Kafka, no conto "a metamorfose".

Curiosamente, o "marxismo cultural" foi responsável pelo resgate filosófico do humanismo marxista, diante da representação das ideias de Marx como sendo um discurso anti humanista de da história "como um processo sem sujeito". Todo o trabalho de autores como Agnes Heller, Lucaks, Bloch, Benjamin, Fromm e outros, de apresentar uma espécie de humanismo marxista ou uma antropologia filosófica marxista foi totalmente ignorado por esses apóstolos neoliberais do mercado desregulado.

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A ideia perversa de interditar o debate filosófico sobre o caráter alienante e desumano da cultura contemporânea nas universidades públicas, agora transformadas em incubadoras de empresas e empresários ou mão de obra para o mercado, parece assemelhar & agrave; famosa frase do ministro de Hitler, que disse:"quando ouço falar em cultura, tenho a vontade de puxar o revólver". Entende-se porque. A reflexão filosófica pode não ajudar a empregar precariamente os 14 milhões de desempregados no Brasil, mas pode colocar em questão o atual regime de terror implantado entre nós pelos amigos dos milicianos do Rio de janeiro.

Para que serve a filosofia, a sociologia e a história, finalmente? - Para nos dá uma perspectiva crítica,contextual e denunciatório da catástrofe que se abateu sobre o povo brasileiro, a partir do golpe parlamentar de 2016.

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As ciências humanas e hermenêuticas não são uma alavanca para perfurar poços, cacimbas, riachos etc.Mas ferramentas indispensáveis à autonomia, a liberdade, à individualização dos seres humanos. Pode não contribuir para a acumulação de capital, ou auferir lucros no mercado financeiro, mas ajuda a construir cidadãos e cidadãs livres e iguais.

Mas isso não interessa ao novo ministro da educação.

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