O Ministro da Justiça e a injustiça como lei

Mais uma vez, estamos diante de um processo de higienização sócio-racial, legítimo e decretado por lei. O nazismo já havia nos mostrado como funciona

Ministro da Justiça, Torquato Jardim
Ministro da Justiça, Torquato Jardim (Foto: Nêggo Tom)


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"Você vê uma criança bonitinha, de 12 anos de idade, entrando em uma escola pública, não sabe o que ela vai fazer depois da escola. É muito complicado." A frase com a qual inicio este texto é do Ministro da Justiça, Torquato Jardim, e a leitura que eu faço dessa fala - e que eu creio ser a única possível - é a de que todo pobre morador de periferia e estudante de escola pública é um criminoso em potencial.  

Talvez, a declaração dada pelo ministro da Justiça de Temer seja uma tentativa de justificar a morte do garoto Marcos Vinícius, de 14 anos, baleado pelas costas, a caminho da escola, na favela da Maré, no Rio de Janeiro. O que seria um agravante, diante de um caso que já causa dor e revolta, em qualquer ser humano, cujo coração ainda não foi contaminado pelo ódio ideológico da direita racista, seletiva e higienista que usurpou o poder. 

Segundo as palavras do ministro, é possível que o adolescente pudesse ter algum tipo de envolvimento com o crime. Simplesmente por ser morador da periferia. Sem falar no preconceito manifestado contra quem estuda em escola pública, como se quem estudasse em escola privada não cometesse crimes ou não pudesse vir a ter uma má conduta. Um tipo de avaliação, no mínimo, pouco inteligente, principalmente se observarmos que os principais agentes da corrupção no país são oriundos das classes A e B, e, portanto, não estudaram em escola pública e nem moraram na periferia. 

Devo concordar com o excelentíssimo senhor ministro no que diz respeito à aparência de quem possa cometer crimes. Até porque está muito complicado para nós vermos um homem de boa aparência, de meia idade, vestindo um terno de linho fino e entrando em gabinete oficial e imaginarmos que ele não possa ser um corrupto. Não sabemos o que ele vai fazer após o expediente, quem ele vai receber em sua residência na calada da noite, com quem ele poderá estar se reunindo fora da agenda oficial, o que ele pode estar negociando por debaixo dos panos, ou o que ele fala ao telefone quando os grampos não revelam. 

A gente pode ver um agente de segurança, devidamente fardado, todo bonitinho, entrando em uma viatura e não saber o que ele vai fazer depois de cumprir o seu plantão. O que alguns fazem durante a gente já ficou sabendo através de palavras do próprio ministro. Vale lembrar que foi ele quem levantou suspeitas sobre toda a polícia do Rio de Janeiro, a associando, inclusive, ao crime organizado. Uma prova de que o ministro é dado a acusações irresponsáveis e a julgamentos generalizados, o que não condiz com a postura de uma autoridade responsável pela justiça do país.

A política de segurança adotada pelo governo Temer, e que vê na Intervenção Militar a melhor forma de combater o crime, é baseada no extermínio da população da periferia e no genocídio étnico dos que representam a maior parte de seus habitantes. Prova disso é outra declaração dada pelo mesmo Torquato Jardim, em que ele diz: "Como você vai prevenir aquela multidão entrando e saindo de todas as 700 favelas? Tem 1,1 milhão de cariocas morando em zonas de favelas, de perigo. Desse 1,1 milhão, como saber quem é do seu time e quem é contra? Não sabe."

Está mais do que claro qual é o tipo de orientação recebida pelos militares que atuam na Intervenção no Rio de Janeiro. Na dúvida, mata! Seja adulto ou criança. Depois verifica se era inocente. Já que não é possível esterilizar os pobres, como já propôs um certo candidato à presidência, a solução é abatê-los, da forma mais convincente possível, para que fique caracterizado que eles sempre são os culpados. Talvez por terem nascido pobres e na periferia. 

Mais uma vez, estamos diante de um processo de higienização sócio-racial, legítimo e decretado por lei. O nazismo já havia nos mostrado como funciona. Na visão dos adeptos da eugenia social, o pobre e o morador da periferia são inimigos do estado, pertencem a uma classe inferior de seres humanos e precisam ser eliminados do convívio social. O governo Temer acaba de assumir isso publicamente, através das palavras do ministro da Justiça, que também disse que "criança bonitinha pode virar alvo", dando a entender que as "feias" já estão automaticamente enquadradas no perfil de potenciais criminosos e que o destino da juventude pobre e da periferia é a vala.

Talvez fosse o caso de se formalizar uma denúncia, junto ao ministério público, contra as declarações do ministro. Uma vez que elas incitam o ódio de classes, o preconceito social e racial e o cerceamento do direito de ir e vir, através do qual todo cidadão está protegido pela constituição. Mas de repente você vê um juiz bonitinho, de 50 anos de idade, entrando em um órgão público e não sabe o que ele é capaz de dizer e fazer fora do tribunal, não sabe se ele realmente está do lado da justiça ou se pensa igual ao ministro que ele deveria punir. 

Na dúvida, com relação ao senso de justiça de nossas autoridades, só nos resta sentar no gramado e chorar. 

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