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Brasília

Grécia: uma questão de moeda ou cortesia?

O debate corrente parece por à frente os interesses dos banqueiros, majoritariamente alemães, em detrimento dos aspectos culturais, sociais e econômicos dos cidadãos gregos

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A despeito de motivos pessoais para cruzar a central Alemanha e chegar à Grécia, nada poderia ser mais oportuno do que reportar de perto os dois lados do último embate de europeus entre o grupo de tecnocratas, incluídos os políticos e financistas, e a sociedade grega.

Na bagagem, levei impressões de amigos alemães que não servem às bancas internacionais baseadas em Frankfurt. Uma das análises sobre o atual “Cisma” econômico em que se encontra a União Européia (UE) e o ciclo decadente do capitalismo especulativo, veio de um amigo - artista e educador. Já em sua maturidade, e há tempos comprometido com intervenções sociais por meio de expressões artísticas patrocinadas por sindicatos e cooperativas alemãs, disparou: “como podemos continuar tentando consertar um sistema financeiro que só nos retorna mais desigualdades e lança novas formas de modernidade financeira para atropelar nosso meio de vida, rebaixando nossos padrões e capacidades individuais?

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Em Frankfurt, o Banco Central Europeu está sitiado pelo movimento “Occupy”, que se alastrou a partir dos Estados Unidos. Para mim, algumas questões permaneciam no ar enquanto o avião cruzava os cumes nevados dos Bálcãs: como seria a Grécia em meio à crise, nesta minha primeira visita ao país: mais um estado periférico da comunidade européia, um jardim dos fundos para desova de produtos e negócios especulativos alemães, ou ainda seria o berço de idéias e de filosofias tais as que um dia levaram à formação de nossa civilização ocidental moderna – a dizer, a de tradições democráticas.

Cheguei a Thessaloniki no nordeste grego, à beira do mar Egeu. A segunda cidade do país abriga o maior porto de acesso ao leste europeu e outra dúzia de ativos comerciais e negócios que agora estão sob constrição operacional devido ao mais recente episódio de falência do capitalismo financeiro.

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O setor de entretenimento – bares, restaurantes e serviços em geral – está experimentando um inverno particularmente frio neste mês de março. Estabelecimentos vazios, lojas fechadas, e sorrisos contidos são parte da cena. No entanto, isto não denota uma situação sem perspectivas como se tem dito até o momento. Espera-se que a Grécia e seu povo resistam à imagem de falência instaurada.

Não muitos gregos, como fui informado, se lembram do pacto de Moscou entre Churchill e Stalin , rascunhado em um guardanapo de papel. Em nove de outubro de 1944, este dois líderes escreveram como as nações que “venceram” a guerra viam a divisão do leste meridional europeu.

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Romênia - 90% - União Soviética (URSS) e 10% outros

Grécia- Reino Unido e EUA 90% URSS 10%

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Iugoslávia e Hungria - 50% cada

Bulgária – URSS 75%

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Stalin devolveu o guardanapo a Churchill com as anotações ticadas. Estes percentuais foram alterados na seqüência do encontro, numa rodada entre seus respectivos ministros de relações exteriores.

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A cortesia aos gregos, por assim dizer, num tempo de negociações difíceis e bélicas, foi feita por Churchill em vista da geopolítica e da proteção de raízes culturais da civilização ocidental .

À título de cortesia, sob o pretexto de salvação da soberania monetária e fiscal da Grécia, ironicamente, agora é a chanceler da Alemanha Angela Merkel quem lidera a União Européia, e oferece os guardanapos que selarão o destino e, talvez o drama da mais antiga entre as sociedades de pensamento ocidental, onde o capital liberal é agora império. Sem cortesias, tudo não passará de uma questão de moeda (euro), acima de tudo?

É comum o ditado reverberado entre os jornalistas: se perguntar uma questão aos economistas, obterá duas respostas – seja sobre a questão grega ou sobre outra de dificuldade similar. Banqueiros, no entanto, têm uma visão mais clara para solucionar estas questões: salve-nos primeiro e acomodem os outros na seqüência, ou seja, as pessoas.

Da mesma forma, e na maioria das vezes, governos se pautam nos indicativos estatísticos financeiros em sua tomada de decisões. Para todas estas ciências, o direcionamento é dado sobre nem tão óbvios indícios de caos e com base no cacife das apostas.

O debate corrente parece por à frente os interesses dos banqueiros, majoritariamente alemães, em detrimento dos aspectos culturais, sociais e econômicos dos cidadãos gregos.

O colunista Clovis Rossi mencionou recentemente que desde 2008, após a quebra do Lehman Brothers, mais de U$ 4,6 trilhões foram injetados no sistema financeiro como ajuda não ortodoxa de expansão da base monetária. Isto é quase 2,5 vezes o tamanho do aclamado PIB anual brasileiro, que hoje é o sexto do mundo. E quase nada foi exigido dos bancos em troca da ajuda. Os capitais especulativos foram protegidos para salvar o sistema financeiro global.

A ajuda inicial à Grécia foi calculada em 130 bilhões de euros. Muitos duvidam que este dinheiro chegue à economia real de Thessaloniki, por exemplo. É claro que, como em outros países com dificuldades financeiras e de soberania econômica, a composição desta dívida não é feita por pequenas e médias empresas. Imagine um milhão de pequenas e médias empresas gregas (quase 10% da população do país) com empréstimos inadimplentes de cem mil euros cada uma, totalizando 100 bilhões de euros – número próximo da ajuda anunciada. Fica claro que a economia real não é a detentora destes débitos em disputa.

Portanto, por que em nome da soberania grega, a sociedade em suas células básicas de existência (negócios locais) deveria pagar os custos de uma intrincada estrutura capitalista em xeque?

A despeito do que dizem os banqueiros e respectivos porta-vozes da alta cena política, os gregos talvez devessem “congelar” seus padrões de vida por um tempo, enquanto re-definem as funções estratégicas de seus ativos, sejam estes pessoais, intelectuais, industriais, produtivos, comerciais, geopolíticos etc. Não se sugere um default unilateral da dívida ou retorno ao Dracma como unidade monetária, o que definitivamente colocaria o país no “livro negro” da comunidade internacional de forma permanente.

Da mesma forma, acredito que os 11 milhões de gregos não deveriam ser empurrados para os rincões da recessão e da pobreza, que não conhecem até agora, por uma cortesia aos banqueiros europeus. É fato que algum valor agregado deverá surgir do pacote sugestivo de 32 medidas reformatórias proposto aos seus líderes pelos contra partes da UE, os quais podem permitir melhorias no desempenho econômico nos anos por vir, incluindo a desregulamentação de categorias profissionais e a transparência nas contas do governo e do sistema tributário.

No entanto, a Grécia não deve aceitar receitas inflexíveis de tecnocratas ou mesmo de políticos da UE que buscam alimentar suas próprias bases eleitorais com um discurso maduro de austeridade e responsabilidade, para manutenção do status quo de alguns poucos na Europa parceira. Ainda mais, se esta receita for para “securitizar” um sistema de lucros sobre títulos soberanos em re-negociação, operações financeiras alavancadas com capital especulativo e um modelo de desenvolvimento à base de crédito facilitado.

Uma vez ouvi de um nadador: “quando se está no meio do mar e não sente mais seus braços, é quando realmente tem que confiar em apenas em si mesmo, e mais do que nunca, tentar chegar à praia”.

A cultura de poupança familiar, empreendedorismo, comércio e negociação, democracia, bem como o acesso a toda uma região de países vizinhos no leste da Europa são os ativos que este país deverá se apegar para construir a solução da Grécia para manter sua economia nos trilhos. Pois os bárbaros de hoje – os das bancas internacionais - não fazem cortesia.

 

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