Lula, da Casa Branca para o mundo

Brasil desponta como potência de novo tipo, ou seja, destinada a aportar novos valores a um sistema internacional esgotado por conflitos e polarizações

O principal saldo da recente viagem do presidente Lula a Washington, para além das trocas de impressões, das decisões e  do comunicado conjunto, foi sua dimensão simbólica. Na pessoa de Lula, sucedendo a figura sempre constrangedora, quando não ausente, de Bolsonaro, era o Brasil que recuperava ali sua plena presença mundial como nação senhora de sua importância e merecedora de pleno reconhecimento.

Esse aspecto de simbolismo positivo havia sido perdido quando o Brasil caiu presa do mais caricato e violento expoente da extrema-direita mundial. Importa sobremaneira que a figura de Jair Bolsonaro seja sucedida por Lula, sua nêmesis. Importa que as ofensas de um dêem lugar ao ideário de justiça redistributiva encarnado ubiquamente por Lula. Neste momento, porém, o que talvez mais deva ser valorizado é a constatação da imensa necessidade que o mundo sentia de que um Brasil íntegro,  democrático, humano, pacífico e soberano recuperasse o lugar a ele destinado no concerto das nações.

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Aproximar ainda mais identidades políticas e históricas tão coincidentes como as que existem entre Brasil e Estados Unidos já seria um saldo suficiente para coroar de sucesso a visita de Lula à Casa Branca. De pronto, houve a reafirmação do compromisso democrático comum dos chefes de Estado em seu combate ao extremismo de direita. 

Os dois países manifestaram coincidências no  entendimento de que a questão climática é de extrema emergência. Nesse contexto, a preservação da Amazônia constitui  prioridade internacional e o Brasil se apresenta como receptor de recursos e executor de ações inadiáveis para o planeta, em conjunto com outros países amazônicos. Lula obteve de Biden a adesão de Washington ao Fundo Amazônia. São apenas 50 milhões de dólares, mais relevantes como gesto que abre espaços para o concurso de outros países. 

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Com as visitas à Argentina e Uruguai, com o retorno do Brasil ao encontro da  Comunidade de Estados Latino-americanos e do Caribe, e agora com o percurso na Casa Branca, Lula se credencia para a visita ao maior parceiro comercial do Brasil, a China, escala privilegiada do périplo internacional de Lula pelas maiores instâncias de poder do planeta. 

O objetivo parece ser o de equilibrar alinhamentos para obter concessões de todos os lados e lograr o reconhecimento do Brasil como potência de novo tipo, ou seja, destinada a aportar novos valores a um sistema internacional esgotado por conflitos e polarizações e, ao mesmo tempo, tão carente de consensos.

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Na questão ucraniana, o Brasil fez questão de fazer pública a versão de que atendia pedido ou pressão americana para condenar a "invasão russa". Ao mesmo tempo, reafirmou sua negativa a ceder obuses para a artilharia de Kiev.

Para além da agenda  posta agora em movimento pela visita a Washington, a volta de Lula ao palco internacional se reveste de contornos geopolíticos ponderáveis. O Brasil de Lula se apresenta e será chamado a papéis internacionais de ponta por sua importância, tamanho, população, recursos, economia e qualidade de liderança. Para coroar, a visita de Lula cercou-se de transcendência pelo seu significado interno, no Brasil, até pouco tempo conflagrado pelo bolsonarismo fascista e suas tentativas de golpear o resultado das urnas e o processo democrático. Ainda que minimizada pela mídia conservadora (com a exceção de O Globo), a recepção de Lula na Casa Branca como eleito, empossado e em pleno exercício de seu cargo consagra Lula como presidente do Brasil em palco privilegiado, além de lançar uma pá de cal nas esperanças dos golpistas. Logo nos Estados Unidos, a que tantas vezes os bolsonaristas procuraram alardear adesão, as honras se dirigiram a um visitante muito especial: Lula.

Leonardo Attuch

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Leonardo Attuch é jornalista e editor-responsável pelo 247.