Afinal, regular a imprensa é infâmia democrática?

Alemanha, Rússia, Itália, França, e outros – inclusive Estados Unidos-, preveem regulação e limites da imprensa. Para desespero de quem acha tudo é ‘livre’



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Há movimentos sociais que só são percebidos algum tempo depois. A grande imprensa fez de tudo para estigmatizar a lei 5.250/67 – Lei de Imprensa- como ‘antidemocrática’. A cada decisão judicial, regular e sem ilegalidade, mas que condenava a imprensa em qualquer coisa, era sempre a mesmo alegação: a Lei de Imprensa era ditatorial, uma infâmia e tinha que sumir. O lóbi foi poderoso e em 2009 a lei foi revogada.

Em 1986 advoguei para Fernando Gabeira contra o respeitado Jornal do Brasil que estampou 2 primeiras páginas dizendo que Gabeira, candidato a governador do Rio, perdia votos porque defendera a liberação da maconha. O processo judicial durou 11 dias e o JB teve que dar 2 manchetes retratatórias elaboradas pelo genial John Neschling. A reação uníssona da imprensa foi falar mal da lei 5.250. Qualquer condenação judicial se torna imediatamente ‘censura’.

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Historicamente o tiro saiu pela culatra. Em desfavor da imprensa. Sem a lei específica os juízes tiveram mais poder residual, pelos códigos e leis existentes, no que em Direito se chama ‘discricionariedade’. Se a Lei de Imprensa estipulava algum limite ao jornalismo, também impedia eventual arbítrio de juízes e tribunais conservadores. O jornal O Estado de São Paulo no recente caso do filho de José Sarney, impedido de noticiar, talvez tenha sentido saudade da Lei de Imprensa.

A lógica que permeia a grande imprensa é ela se ver como um ser sagrado. Acima do Direito e da lei. Para ela não existiriam crimes de calúnia, injúria e difamação previstos no Código Penal e que valem para todos. Também não pode existir a responsabilidade civil. Qualquer uma dessas 4 responsabilizações jurídicas que afeta a qualquer ser humano capaz vivo, ou empresa, se torna imediatamente infame e recebe o carimbo de ‘censura’, se incidir sobre a imprensa.

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Dizem que José Dirceu foi ‘amaldiçoado’ porque sua meta de governo era a regulação da imprensa. O tema volta à tona agora. Mas será que o assunto é mesmo tão ‘pecaminoso’ assim? Será que jornalistas somos seres que devemos estar ‘acima da lei’? Obviamente não. É importante ver outros sistemas.

Alemanha, Rússia, Itália, França, e outros – inclusive Estados Unidos-, preveem regulação e limites da imprensa. Para desespero de quem acha tudo é ‘livre’.

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A atual Constituição alemã, no artigo 5:2 diz, sobre a liberdade de opinião e de imprensa: ‘Esses direitos encontram seus limites nas disposições de leis gerais, nos regulamentos legais sobre a proteção da juventude e no direito ao respeito da honra pessoal.’

Já a Constituição italiana, artigo 21, 3º parágrafo reza: ‘Apenas se pode proceder ao embargo por um ato motivado pela autoridade judiciária em caso de delito que a lei de imprensa prevê expressamente, ou em caso de violação das regras que esta mesma lei prescreve para a definição dos responsáveis.’

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A nova Constituição russa, de 1993, no artigo 29 que trata da liberdade de pensamento e da palavra, ao lado da proibição da censura, impõe: ‘A propaganda ou agitação incitando ao ódio e à hostilidade social, racial, nacional ou religiosa é proibida’.

Na França a Constituição ratifica a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, 1789, que no inciso X consta: ‘Ninguém pode ser assediado por causa de suas opiniões, mesmo religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei.’ E no XI está: ‘A livre comunicação dos pensamentos e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem: qualquer cidadão pode portanto falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, no entanto, pelo abuso dessa liberdade nos casos determinados pela Lei.’

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Por aí há parâmetros materiais – ‘limites’- que ‘nem’ a imprensa pode ultrapassar. Coisas como juventude, honra, ódios, ordem pública, discriminações e abusos.

A chamada grande imprensa atual no Brasil – jornalões e TVs- aproveita para superafetar dois fatores. A reeleição de Dilma, que não queria; e autossacralização, propondo uma liberdade de imprensa como ‘direito absoluto’ que não existe em lugar nenhum do mundo. Aí, chamam, malandramente, de ‘censura’ tudo que lhe contraria.

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A Constituição brasileira, totalmente democrática, no artigo 220, remetendo ao 5º, também estipula regras à liberdade de imprensa. Basicamente 4  limites: vedação ao anonimato; inviolabilidade da intimidade; da vida privada; da honra. E 4 garantias: direito de resposta; indenização por dano moral, por dano material e por dano à imagem.

Some-se a isso, a possível responsabilidade criminal do jornalista, em casos de Calúnia, Injúria e Difamação, crimes regularmente previstos no Código Penal e que podem caber a qualquer pessoa, salvo exceções expressas, como parlamentares e advogados.

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Uma regulação da imprensa pode – deve!- perfeitamente  excepcionar o jornalista com a prerrogativa profissional relativamente à exclusão de certos crimes de opinião. Sem uma lei específica a situação do jornalista ficou à discricionariedade do juiz.  Um magistrado conservador, por exemplo, não tem mais a limitação legal própria que o impeça de condenar o jornalista. Aí só a gritaria da imprensa, ou no Supremo. Por todos, o recente caso de Paulo Henrique Amorim.

Percebe-se que em muitos casos em que pessoas e empresas vão ao Poder Judiciário pleiteando uma indenização, há uma atividade social lícita. Pedir, quem se sente lesado pela imprensa, que o juiz analise o conflito e produza uma sentença é algo naturalmente possível. Se a sentença for desfavorável à empresa de comunicação não pode ser taxada, então, de ‘censura’. Este xingamento, no Brasil democrático, parece não colar mais. 

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