Celso de Mello, um campeão de pragmatismo

Nesse embate em que leigos e especialistas falaram à vontade, não tenho a menor dúvida. Falando como leigo, é claro: Celso de Mello admitirá os embargos



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Nesta quarta-feira o ministro Celso de Mello, o decano da Suprema corte,  dará seu voto e decidirá, finalmente, a questão dos embargos infrigentes no STF . Seu voto pode reabrir o julgamento do mensalão para doze réus condenados pelos crimes de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

Nesse embate em que leigos e especialistas falaram à vontade, não tenho a menor dúvida. Falando como leigo, é claro: Celso de Mello admitirá os embargos.

Senão, vejamos, e começando pelo que poderiamos chamar de “estilo” Celso de Mello. Não o conheço pessoalmente.  Mas creio que posso, com pouco risco de erro, definir a linha de raciocínio que adotará.

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Se pudessemos definir o juiz pelos seus votos, eu diria que o ministro em em questão é, em primeiro lugar, de um homem pragmatico. Num segundo momento, um cidadão do seu tempo. Um homem da idade moderna.

Desde 1989 no STF, Celso de Mello tem participado de julgamentos de grande importância e repercussão, como aquele que definiu a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa e sua aplicação às eleições municipais de 2012. Ou o que reconheceu a união homoafetiva, por exemplo.

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São dois votos – especialmente o segundo - claramente determinados pela visão pragmática do ministro.

Parte da mídia – e da população – pode ter se surpreendido com o fato de Celso de Mello ter votado contra a validade da Ficha Limpa no pleito de 2012, em que foi voto vencido.

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A maioria dos seus colegas entendeu que a lei era perfeita e deveria ser aplicada já em 2012.

A argumentação de Celso de Mello foi a de que, até encerrados os todos os prazos de recursos, e seja proferida a sentença, ninguém pode ser considerado culpado. Muito justo, não é mesmo?

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A votação da Ficha Limpa seria seguida por outra questão polêmica, a do aborto de anencéfalos, ainda em 2012.

 

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O ministro votou a favor da interrupção da gravidez de fetos anencéfalos, dessa vez acompanhando a como a maioria do STF.

Mello defendeu a separação entre Estado e igreja e afirmou que o direito da mulher precede o do "feto sem vida”.

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O caráter pragmático dessas afirmações não admite questionamentos maiores. Assim como o voto sobre a Ficha Limpa que apenas repete um dos postulados do Direito Processual.

Em junho de 2011, Celso de Mello já havia sido o relator da ação que decidiu, por unanimidade, liberar protestos a favor das drogas.

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Para Mello, é garantido a todos o "direito de livremente externar suas posições, ainda que em franca oposição à vontade de grupos majoritários", uma decisão também lógica e pragmática diante do avanço mundial do consumo da erva.

De seu voto restou ainda a frase favorável às chamadas “marchas da maconha”, que tiveram sua época no Brasil e em várias partes do mundo. “Trata-se da expressão concreta do exercício legítimo da liberdade de reunião”, definiu Celso de Mello.

Ainda no mesmo ano, o ministro votaria de forma favorável aos casais gays, e o Supremo reconheceu, em decisão unânime, a equiparação da união homossexual à heterossexual.

Dois anos depois, em maio de 2013, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovaria a resolução obrigando os cartórios a celebrarem casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, outra realidade que, a cada dia, vem sendo incorporada aos hábitos e à legislação de vários países.

Em maio de 2008, Celso de Mello já votara forma favorável ao uso de células-tronco embrionárias em pesquisas e acompanhou a maioria dos ministros, que entenderam que a prática não viola o direito à vida.

Na ocasião, Mello foi enfático ao afirmar que  o Estado não pode ser influenciado pela religião. E defendeu a continuidade das pesquisas com as células-troco embrionárias, que permitiriam ao brasileiros o exercício concreto de um direito básico, que é o direito à busca da felicidade e também o direito de viver com dignidade.

Lá atrás, em 1994, Celso de Mello, assim como a maioria dos ministros do Supremo, havia votado pela absolvição do ex-presidente Fernando Collor de Mello acusado de crime por corrupção passiva.

Os magistrados argumentaram falta de provas para condenar Collor por ter se beneficiado diretamente de esquemas articulados por Paulo César Farias (PC Farias).

A coerência dos votos anteriores do ministro, como sempre pragmático nas suas decisões, é tão acentuada que foi utilizada inclusive por seus adversários.

Nos últimos dias, circulou nas redes sociais, a lembrança de um episódio envolvendo Celso de Mello com o falecido Ministro da Justiça do governo Sarney, o célebre advogado Saulo Ramos, já falecido.

No seu notável livro “Código da Vida”, onde relata com um brilho invulgar vários momentos da sua carreira, Saulo descreve, na página 170 da primeira edição, um diálogo telefônico muito esclarecedor entre o ex-ministro e Celso de Mello, que havia sido indicado para o Supremo pelo próprio Saulo Ramos.

Saulo e Celso tinham razoável intimidade. Afinal haviam trabalhado juntos na Consultoria-Geral da República, onde Celso, durante certo tempo, foi  secretário de Saulo Ramos.

Estava em questão, no Supremo, a validade da documentação que permitiria a Sarney, já como ex-presidente, candidatar-se ao Senado pelo Amapá.

Preocupado porque a relatoria do processo poderia cair, como acabou caindo, nas mãos do  Ministro Marco Aurélio Mello, muito ligado ao ex-presidente Collor, adversário tradicional de Sarney, Celso de Mello ligou para o seu ex-patrono Saulo Ramos que o tranquilizou.

Disse que o advogado de Sarney, dr. José Guilherme Vilela, era muito competente e que o caso era simplérrimo. Lembrou ao preocupado ministro Celso de Mello que desde a faculdade se aprende que existem dois municípios, um civil, outro eleitoral. Aliás esse acabaria  sendo o entendimento do Supremo ao julgar o mérito da questão, apesar de Celso de Mello ter votado contra.

E Saulo Ramos escreve no seu “Código da Vida”:

“Apressou-se ele próprio (Celso de Mello) a me telefonar, explicando:

-      Doutor Saulo, o senhor deve ter estranhado o meu voto no caso do presidente.

-      Claro...O que deu em você?

-      É que a Folha de S. Paulo, na véspera da votação, noticiou que o presidente Sarney tinha o voto certo do ministros que enumerou e citou meu nome como um deles. Quando chegou a minha vez de votar o Presidente já estava vitorioso...Não precisava mais do meu voto. Votei contra para desmentir a Folha de S. Paulo. Mas fique tranqüilo. Se meu voto fosse decisivo eu teria votado a favor do Presidente.

Não acreditei no que estava ouvindo. Recusei-me a engolir e perguntei:

-      Espera um pouco, deixa eu ver se compreendi bem. Você votou contra o Sarney porque a Folha de S.Paulo noticiou que você votaria a favor?

Diante da resposta positiva, Saulo Ramos não se conteve: Quer dizer que se o Presidente estivesse perdendo, você votaria nele?

Celso de Mello ainda insistiu: - Entendeu?

- Entendi. Entendi que você é um juiz de merda!

Saulo Ramos escreve: " Bati o telefone e nunca mais falei com ele". 

O ex-ministro não precisava ser tão grosseiro . E comentar, por exemplo, "poxa, Celso, como você é pragmático, cara". 

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