Juristas questionam procedimentos usados por Moro em delação

Magistrados e professores de Direito afirmam que, se denúncias feitas por advogados dos acusados sobre prisões e coações forem comprovadas, ‘operação poderá cair por terra’; “O que está sob suspeita é o comportamento do juiz com uma série de procedimentos que fogem da lei, como prender para vigiar e coagir para delatar", diz o jurista e professor Luiz Flávio Gomes

Magistrados e professores de Direito afirmam que, se denúncias feitas por advogados dos acusados sobre prisões e coações forem comprovadas, ‘operação poderá cair por terra’; “O que está sob suspeita é o comportamento do juiz com uma série de procedimentos que fogem da lei, como prender para vigiar e coagir para delatar", diz o jurista e professor Luiz Flávio Gomes
Magistrados e professores de Direito afirmam que, se denúncias feitas por advogados dos acusados sobre prisões e coações forem comprovadas, ‘operação poderá cair por terra’; “O que está sob suspeita é o comportamento do juiz com uma série de procedimentos que fogem da lei, como prender para vigiar e coagir para delatar", diz o jurista e professor Luiz Flávio Gomes (Foto: Valter Lima)


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Rede Brasil Atual

Magistrados, advogados e professores de Direito têm questionado, nos últimos dias, alguns dos pontos jurídicos observados na condução da Operação Lava Jato – que apura denúncias de corrupção entre empreiteiras, políticos, dirigentes e ex-dirigentes da Petrobras – e o instrumento da delação premiada. Primeiro, o fato de o Brasil não ter regulamentado até hoje o crime de perjúrio (que é o ato de mentir durante depoimento em juízo) e, em segundo lugar, a legalidade dos procedimentos que estão sendo adotados pelo juiz federal Sérgio Moro na condução do caso.

O questionamento sobre o crime de perjúrio foi colocado na última semana por cientistas políticos e advogados durante encontro em São Paulo e, pouco tempo depois, mencionado pelo ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), José Múcio Monteiro, em Brasília. Eles lembraram que, em países onde é comum a técnica da delação, como Itália e Inglaterra, o perjúrio é objeto de legislações rigorosas aplicadas aos réus que assinam o acordo para tal prática. No Brasil, no entanto, isso não acontece.

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Por aqui, o crime de perjúrio é chamado de falso testemunho, conforme estabelece o artigo 342 do Código Penal, que diz ser ilegal "fazer afirmação falsa, negar ou calar a verdade" em inquéritos policiais ou processos judiciais. A lei prevê prisão de um a, no máximo, três anos para quem cometa tal infração, além do pagamento de uma multa. A pena só aumenta no caso de ficar comprovado que o infrator recebeu algum tipo de propina para contar a mentira.

“Não é que a não existência do crime de perjúrio no país vá atrapalhar o rumo das investigações da Lava Jato. Mas corrobora a importância de as delações serem observadas de forma mais criteriosa, até mesmo para evitar que o vazamento de tudo o que é dito, antes de a veracidade das informações ser comprovada pela Justiça, não leve a acusações que prejudiquem pessoas sem envolvimento com o caso”, alertou o cientista político Alexandre Ramalho.

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‘Inocentes e bandidos’
O debate sobre o tema tomou mais força depois das declarações feitas por Múcio Monteiro, que assumirá no TCU a responsabilidade pelos processos relacionados à operação depois da aposentadoria do antigo relator, o ministro José Jorge Vasconcelos. Ao falar sobre o tema em entrevista ao blog do jornalista Ricardo Noblat, Monteiro afirmou que embora considere o processo “doloroso, mas necessário” para o país, sente preocupação em relação ao tema. “Acho que muita coisa ainda virá, mas temos de ter cuidado para não trazer a emoção para o processo, para não cometer injustiça, que pode ser de dois tipos: pôr inocente na cadeia ou pôr bandido em liberdade”, acentuou.

Magistrados, no entanto, defendem que mesmo sem a lei de perjúrio, os delatores pegos em falsas informações não ficarão sem punição.

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"No direito brasileiro o réu pode permanecer calado ou até falsear a verdade, confessar o que não cometeu. Isso porque não é vigente para ele, o acusado, a lei de falso testemunho, que funciona para peritos, testemunhas, contadores, tradutores ou intérpretes em processos judiciais e administrativos", diz o juiz federal aposentado Pedro Paulo Castelo Branco, professor de Direito Penal da Universidade de Brasília (UnB) – que atuou nos processos envolvendo o ex-presidente Fernando Collor e Paulo César Farias, na década de 1990. "Mas no caso de estar sendo feita uma delação premiada, se o que o delator denunciar não for verdadeiro, lhe poderá ser imputado o crime de falso testemunho sim, porque durante a delação essa pessoa ainda está atuando como depoente, e não como réu”, explicou.

‘Vigiar e coagir’
O jurista e professor Luiz Flávio Gomes, presidente do Instituto Avante Brasil, também é da opinião de que o delator a proferir inverdades poderá ficar em maus lençóis, ao perder todos os privilégios negociados no processo de delação, motivo pelo qual o que o preocupa de fato, conforme disse, não é um falso depoimento e sim, a adoção de procedimentos, por parte do juiz que comanda as investigações, considerados por ele pouco comuns.

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“O que está sob suspeita é o comportamento do juiz com uma série de procedimentos que fogem da lei, como prender para vigiar e coagir para delatar. Se os advogados dos empresários (que há poucos dias criticaram várias atitudes do juiz federal Sérgio Moro, responsável pelo caso) provarem que está acontecendo mesmo isso, toda a operação cairá por terra”, enfatizou.

De acordo com Gomes, a delação premiada, em si, na forma como é regulada pela lei 12.850/13 – que dispõe sobre investigação criminal no país –, se por um lado pode revolucionar os métodos investigativos no Brasil, por outro “pode servir de instrumento de arbítrio, despotismo e tirania, com gravíssimas violações aos direitos e garantias fundamentais contemplados no nosso estado de direito”, segundo destacou.

“O grande risco que, ao mesmo tempo, pode se constituir em fonte de uma enorme frustração coletiva consiste na futura declaração de nulidade de muitas das diligências (judiciais ou policiais) da Operação Lava Jato, tal como já ocorrera com as operações Satiagraha e Castelo de Areia”, acrescentou ele. Luiz Flávio Gomes também criticou o fato de o juiz Sérgio Moro não ter permitido até hoje o acesso dos advogados de defesa dos acusados aos depoimentos dos delatores.

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Questionamentos ao juiz
Nesta terça-feira (25), o Supremo Tribunal Federal (STF) divulgou que o ministro Teori Zavascki – responsável pelo julgamento dos casos relacionados à Lava Jato no tribunal – encaminhou a Moro questionamentos apresentados pelo advogado Fábio Tofic Simantob, que atua na defesa do vice-presidente da empresa Engevix, Gerson Almada, preso na última fase da operação. Simantob perguntou formalmente ao STF o motivo pelo qual os políticos citados na investigação não têm tido seus nomes divulgados.

O advogado argumentou que a Polícia Federal, comprovadamente, sabia de relacionamentos existentes entre o doleiro Alberto Yousseff e deputados desde setembro de 2013, mas o magistrado teria omitido a informação até março passado. “A omissão sobre a presença de políticos tem o objetivo de impedir que o caso seja remetido ao Supremo, já que deputados federais, por terem foro privilegiado, só podem ser investigados pelo STF”, frisou. No documento apresentado ao STF, Simantob relembrou, ainda, a atitude que tem sido adotada por Sérgio Moro de impedir os réus de citarem nomes de políticos acusados de receber propina.

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O magistrado, que todas as vezes em que é abordado pela imprensa evita se pronunciar a respeito e já disse que não dará mais declarações sobre isso, já afirmou que a sua determinação em proibir os réus de citar políticos em suas delações tem o objetivo de “preservar a autoridade do Supremo”. Mas Moro tem sido alvo de críticas diversas de advogados que, embora o considerem preparado, levantam dúvidas sobre o seu trabalho. “Ele é acusador, não tem se mostrado, neste caso, equidistante da Polícia Federal nem do Ministério Público como um juiz precisa ser”, acusou o advogado Alberto Zacharias Toron, que defende o presidente da UTC, Ricardo Ribeiro Pessoa, no caso.

Acareação entre diretores
Enquanto a polêmica promete se estender nos próximos dias, simpatizantes do juiz também partiram em sua defesa. “Toda a crítica que alguém possa fazer a Sérgio Moro é mera especulação. Ele é muito bem preparado tecnicamente e é experiente nesta matéria”, acentuou o procurador regional da República e ex-conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Wellington Cabral Saraiva.

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No Senado, o clima é de espanto com o vazamento de algumas delações. Citado como um dos políticos que teriam sido beneficiados com recursos do esquema para sua campanha pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa, o líder do PT na Casa, Humberto Costa (PT-PE), que colocou seus sigilos fiscal e bancário à disposição da Justiça, fez um discurso duro neste sentido, no plenário.

“Causa-me espécie o fato de que, ao afirmar a existência de tal doação, o senhor Paulo Roberto não apresente qualquer prova, não sabendo dizer a origem do dinheiro, quem fez a doação, de que maneira e quem teria recebido. Sou defensor da apuração de todas as denúncias contra a Petrobras e qualquer outro órgão do governo. Porém, isso deve ser feito com o cuidado de não macular a honra e a dignidade de pessoas idôneas”, salientou.

Os integrantes da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga o caso no Congresso receberam autorização de Sérgio Moro para convocar novamente o ex-diretor Paulo Roberto Costa. A comissão fará uma acareação entre ele e o também ex-diretor da estatal Nestor Cerveró, que deram depoimentos conflitantes na Casa, em audiências passadas. Os dois devem se encontrar em reunião marcada para terça-feira (2).

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