Gilmar suspende decisão que obrigava bancos a ressarcir clientes

O ministro do STF Gilmar Mendes, suspendeu, sozinho, a obrigação legal dos bancos compensarem seus clientes por perdas financeiras decorrentes dos planos econômicos das décadas de 1980 e 1990; decisão monocrática suspende, até fevereiro de 2020, o pagamento dos valores já arbitrados pela Justiça, em processos de ações individuais já julgados e nos quais não caberia mais recursos, mas não afeta os poupadores que aderiram ao acordo homologado no início do ano pelo Supremo

Gilmar suspende decisão que obrigava bancos a ressarcir clientes
Gilmar suspende decisão que obrigava bancos a ressarcir clientes (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)


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Alex Rodrigues, repórter da Agência Brasil - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, suspendeu, sozinho, a obrigação legal dos bancos compensarem seus clientes por perdas financeiras decorrentes dos planos econômicos das décadas de 1980 e 1990. A decisão monocrática, do dia 31 de outubro, suspende, até fevereiro de 2020, o pagamento dos valores já arbitrados pela Justiça, em processos de ações individuais já julgados e nos quais não caberia mais recursos. A decisão não afeta os poupadores que aderiram ao acordo homologado no início do ano pelo Supremo.

A petição que originou o Recurso Extraordinário julgado por Mendes foi apresentada pelo Banco do Brasil e pela Advocacia-Geral da União (AGU). O banco e a instituição pública encarregada de representar a União no campo judicial alegaram que o prosseguimento das ações individuais já ajuizadas e o cumprimento das sentenças judiciais já proferidas "têm desestimulado a adesão dos poupadores" ao acordo assinado pela AGU, Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e entidades representativas de consumidores, como o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e a Frente Brasileira Pelos Poupadores (Febrapo).

Assinado no fim de 2017 para tentar pôr fim a uma disputa judicial que se arrasta há décadas nos tribunais de Justiça, o acordo foi homologado pelo STF em março deste ano. Ele vale para quem já tinha ingressado com ação judicial individual ou coletiva a fim de reaver as perdas financeiras decorrentes da entrada em vigor dos planos econômicos Bresser (1987), Verão (1989) e Collor 2 (1991), ou para seus dependentes, e que optasse por aderir ao acordo homologado pelo STF.

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Desde o início, divulgou-se que a adesão ao acordo seria voluntária. E ainda que o acerto previsse descontos de 8% a 19% sobre os valores a que muitos poupadores têm direito e o pagamento de quantias acima de R$ 5 mil seja feito em parcelas semestrais para quem tem direito a mais de R$ 5 mil (podendo levar até dois anos), muitos poupadores aderiram ao acordo, temendo que, se continuassem com ações individuais, demorariam ainda mais para ver seus direitos reconhecidos.

Em sua petição, o Banco do Brasil expôs o argumento de que, mesmo com a homologação do acordo coletivo, continuou tendo que suportar o prosseguimento de milhares de cobranças dos expurgos inflacionários. Ao pedir, junto com a AGU, a suspensão de todas as liquidações e execuções de sentenças judiciais pelo prazo de 24 meses, o Banco do Brasil argumentou que as sentenças questionadas desestimulam a adesão dos poupadores, refletindo, nas palavras do ministro Gilmar Mendes, "o insignificante número de adesões pelos clientes do Banco do Brasil, o que prejudica o objetivo maior do acordo, que é garantir o direito dos particulares e facilitar opagamento da dívida pelas instituições".

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Procurado pela Agência Brasil, o Banco do Brasil informou que a suspensão dos processos está prevista na cláusula oitava do acordo que a Febraban assinou com as entidades que representam os consumidores. "Essa matéria também foi objeto de requerimento na petição que submeteu o acordo para homologação do STF, quando foi assinada por todos os intervenientes do acordo e já contemplava a possibilidade de suspensão de todos os processos", acrescenta o banco, em nota.

Justificativas

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Já o ministro Gilmar Mendes, na decisão monocrática, sustenta que, ao homologar uma das ações extraordinárias sobre o tema que o STF analisou no início do ano, já tinha determinado a suspensão das ações individuais por 24 meses a fim de "possibilitar que os interessados, querendo, manifestem adesão à proposta nas respectivas ações, perante os juízos de origem competentes, com o intuito de uniformizar os provimentos judiciais sobre a matéria e privilegiar a autocomposição dos conflitos sociais". Segundo Mendes, mesmo com sua determinação, os tribunais de Justiça "têm dado prosseguimento às liquidações e execuções das decisões sobre a matéria, o que tem prejudicado a adesão ou ao menos o livre convencimento dos particulares sobre o acordo em questão".

"Nesses termos, entendo necessária a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos, seja na fase de conhecimento ou execução, que versem sobre a questão, pelo prazo de 24 meses a contar de 5/2/2018, data em que homologado o acordo e iniciado o prazo para a adesão dos interessados", determina o ministro.

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Representante legal de vários poupadores e assessor de outros escritórios de advocacia que ajuizaram ações individuais e coletivas, o advogado Alexandre Berthe disse à Agência Brasil que a decisão do ministro contraria o próprio acordo e aumenta a insegurança jurídica, conforme indica o número de pedidos de esclarecimentos ajuizados ao processo após a determinação vir a público.

"Imagine um advogado tentando explicar para um poupador idoso que não entenda nada de Direito e a quem o advogado já tinha informado sobre o ganho de causa que o ministro Gilmar Mendes, agora, mandou suspender o pagamento da ação. Este cliente estava esperando receber este dinheiro daqui para o Natal e, agora, o advogado tem que explicar que ele pode ter que esperar por mais dois anos", argumentou Berthe, lembrando que, legalmente, nada pode suspender um processo transitado em julgado.

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"Fica parecendo, ou subentendido, que um ministro pode suspender a execução de decisões judiciais transitadas em julgado daquelas pessoas que optarem por não aderir a um acordo que, a nosso ver, é péssimo para muita gente", acrescentou Berthe, avaliando que, em sua decisão, o ministro foi muito além do pedido apresentado pelo Banco do Brasil e pela AGU, que solicitavam a suspensão apenas das execuções individuais de sentenças cujos poupadores tenham sido beneficiados por uma decisão dada em ação ajuizada pelo Idec contra o extinto Banco Nossa Caixa, que foi incorporado pelo Banco do Brasil. Em sua decisão, o próprio ministro aponta que Banco do Brasil e AGU requisitaram a suspensão das liquidações e execuções dos expurgos inflacionários decorrentes apenas do Plano Collor II (1991).

"A decisão do ministro, no entanto, afetou a todos os outros processos individuais, incluindo os que envolvem outros bancos – que podem optar por executar as sentenças já proferidas para encerrar logo o processo. A meu ver, o ministro Gilmar Mendes extrapolou o pedido original, contrariando o próprio acordo homologado pelo STF. Esperamos que ele ratifique sua decisão, esclarecendo-a melhor", concluiu o advogado.

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Por e-mail, a AGU afirmou que a suspensão de tramitação dos processos já tinha sido solicitada na época em que se pleiteava a homologação do acordo, de modo a incentivar a adesão. Segundo a AGU, isso já havia sido plenamente atendido e, portanto, a nova decisão do ministro Gilmar Mendes "apenas reforça o que já havia sido determinado pelo Supremo", conferindo segurança jurídica ao acordo.

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