'É preciso recuperar o espírito inicial da desoneração'

Em entrevista exclusiva ao 247, o empresário Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, critica duramente a proposta do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de acabar com os benefícios da desoneração sobre a folha de pagamento para a indústria; "a intenção original era beneficiar apenas setores afetados pela competição internacional e o custo seria de R$ 4 bilhões"; segundo Andrade, quando falam em custo fiscal de R$ 25 bilhões, isso se deve ao alargamento desncessário da desoneração; ele defende que o governo retome o espírito original da medida; na entrevista, Robson também defendeu a terceirização; "é preciso dar segurança jurídica às empresas e também a 12 milhões de trabalhadores terceirizados no País"

Em entrevista exclusiva ao 247, o empresário Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, critica duramente a proposta do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de acabar com os benefícios da desoneração sobre a folha de pagamento para a indústria; "a intenção original era beneficiar apenas setores afetados pela competição internacional e o custo seria de R$ 4 bilhões"; segundo Andrade, quando falam em custo fiscal de R$ 25 bilhões, isso se deve ao alargamento desncessário da desoneração; ele defende que o governo retome o espírito original da medida; na entrevista, Robson também defendeu a terceirização; "é preciso dar segurança jurídica às empresas e também a 12 milhões de trabalhadores terceirizados no País"
Em entrevista exclusiva ao 247, o empresário Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, critica duramente a proposta do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de acabar com os benefícios da desoneração sobre a folha de pagamento para a indústria; "a intenção original era beneficiar apenas setores afetados pela competição internacional e o custo seria de R$ 4 bilhões"; segundo Andrade, quando falam em custo fiscal de R$ 25 bilhões, isso se deve ao alargamento desncessário da desoneração; ele defende que o governo retome o espírito original da medida; na entrevista, Robson também defendeu a terceirização; "é preciso dar segurança jurídica às empresas e também a 12 milhões de trabalhadores terceirizados no País" (Foto: Leonardo Attuch)


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247 - Nos próximos dias, o Brasil viverá uma batalha em torno de um tema que é de vital importância para as empresas: os impostos que incidem sobre a folha de pagamentos. A questão deveria ter sido votada no último dia 20, quando, em Brasília, o empresário mineiro Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria, recebeu o 247 para uma entrevista sobre discutir as questões que hoje inquietam os empresários. Como não houve entendimento no Congresso, acabou adiada para o próximo dia 10. "Imagina a pressão que haverá sobre os parlamentares", diz Andrade.

Entidade que representa todas as cadeias produtivas do setor industrial, a CNI tem liderado um intenso trabalho, nos últimos meses, para convencer o Executivo e o Legislativo a retomar o espírito inicial da desoneração, medida que visava ampliar o desempenho de setores afetados pela concorrência internacional e que, depois, foi estendida a diversos setores da economia. "Este foi o erro", diz ele. "Se tudo tivesse sido mantido como previsto, o custo seria de R$ 4 bilhões por ano – e não de R$ 25 bilhões, como falam agora". A proposta da CNI é retomar o espírito inicial da desoneração. Confira, abaixo, trechos da entrevista concedida à colunista Tereza Cruvinel e ao editor Leonardo Attuch:

247 – Como a CNI avalia a proposta do ajuste fiscal que praticamente elimina a desoneração fiscal sobre a folha de pagamento?

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Robson Andrade – Nós somos completamente contra o fim da desoneração e o aumento das alíquotas que o ministro Joaquim Levy está propondo. O governo deveria dar a opção até para que as empresas voltassem ao sistema antigo. Aí nós vamos fazer a conta e vamos escolher. Do jeito que está posto hoje é pior.

247 – O fim da desoneração representa R$ 25 bilhões e é um dos pontos principais do ajuste. Há esperança de reverter isso?

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Andrade – O problema é que a desoneração perdeu seu espírito inicial. E o que era esse espírito inicial? Era beneficiar a indústria. Por que a indústria? Porque a indústria é que vinha tendo problemas de competitividade com os importados. Construção civil, por exemplo não tem esse problema. Meios de comunicação, comércio, call-center, atacadistas, transportadores… todos foram beneficiados. O benefício foi ampliado de uma maneira não pensada. Mesmo na indústria, não deveriam ter sido todos os setores.

247 – A que se deve esse alargamento?

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Andrade – O governo avaliou que aquela medida dava uma imagem boa. Na época da bonança, o ministro Guido Mantega era cortejado em todos os setores. Só tinha aplauso.

247 – Como se deve, então, corrigir as distorções?

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Andrade – Volta para o que era preciso. O que a CNI defende é que sejam desonerados apenas setores da indústria afetados pela concorrência internacional. Isso tem um impacto fiscal de R$ 4 bilhões. Hoje, falam em R$ 25 bilhões porque ampliaram demais o benefício.

247 – O relator da medida provisória na Câmara, deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ), tem adotado uma outra linha. Ele fala em mexer na proposta do ministro Levy, mas para proteger setores como alimentos, Tecnologia da Informação, transportes e cesta básica. Isso faz sentido?

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Andrade – Nós imaginamos que ele esteja focado em alguns setores com muita mão de obra. Mas onde os call-centers estão instalados? Só onde tem incentivo fiscal. Será que precisam de mais incentivo? A gente tem conversado com o Executivo, com o ministro Joaquim Levy, com os deputados, como o líder Picciani e com o presidente Eduardo Cunha. Qual é o ponto? Essa medida não foi criada para beneficiar a tudo e a todos, mas sim para resolver um problema de competitividade da indústria. É isso que deve ser levado em consideração. Mas a pressão do governo está muito forte. E também do Legislativo. Como a votação ficou para o dia, imagina a pressão que os setores beneficiados farão sobre os parlamentares.

247 – Qual é a situação atual da indústria brasileira?

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Andrade – É muito grave. A indústria está parada, está demitindo. Vou te dar o exemplo da siderurgia. O Brasil tem capacidade de produzir 45 milhões de toneladas de aço. As indústrias estão produzindo 25 milhões e temos ainda 7 milhões de importados. Estamos consumindo 32 milhões, com capacidade de 45 milhões.

247 – Nesse clima, as empresas mostram disposição para investir?

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Andrade – Investir é quase impossível. Como investir em siderurgia? O mesmo acontece no setor imobiliário, que está vivendo uma crise aguda. Não tem lançamento, não tem investimento. Eu acredito que 2015 vai ser um ano de muito baixo investimento. Não tem entusiasmo. O governo fala em despertar o chamado espírito animal. Mas o empreendedor brasileiro já tem esse espírito, pois, do contrário, nem sobreviveria. Agora, o investimento depende das perspectivas do mercado, que hoje não são positivas. 

247 – Qual é hoje o nível de confiança da indústria?

Andrade – Muito baixo. Cerca de 40% dos empresários industriais apontam falta de confiança para investir.

247 – A confiança piorou depois do anúncio do ajuste fiscal?

Andrade – O empresário sabe que o ajuste fiscal é necessário. O problema é que não existem muitas alternativas. Quando um governo faz um ajuste, só olha do lado da receita, porque as despesas são engessadas. A margem de manobra é muito pequena. Muitos gastos, de despesas vinculadas, têm determinação legal, como saúde, educação etc. Olhando de fora, a gente critica muito, mas é muito difícil. Se um funcionário trabalhar ou não trabalhar, ele ganha do mesmo jeito. Ele não pode ser demitido, a não ser em casos muitos especiais. Só existem pressões de aumento e de gasto. Quando um ministro fala em corte, eu fico pensando: vai cortar na infraestrutura e em gastos que são essenciais para o país se desenvolver. E aí ficamos presos nessa roda de baixo crescimento.

247 – A retomada das concessões poderia elevar a confiança empresarial?

Andrade – É um bom projeto. Mas entre o anúncio e os leilões, vai tempo. Além disso, os fundos de pensão não estão com muita disposição de investir em projetos sem retorno garantido. Qual é a saída? No nosso entendimento, abrir cada vez mais para o capital estrangeiro. E é também preciso melhorar a regulação.

247 – O sr. poderia citar exemplos?

Andrade – O sistema de aeroportos, por exemplo, não tem regulação adequada. A Infraero não tem recursos para investir para ficar com 49%, como é a regra atual. As notícias que temos é que os vencedores dos leilões passados estão propondo renegociação das condições de pagamento. E foram feitos investimentos importantes. Os aeroportos de Brasília e Guarulhos, por exemplo, ficaram muito bons.

247 – A CNI defende o capital estrangeiro também no petróleo e no pré-sal?

Andrade – Como é que a Petrobras vai participar dos leilões se está endividada e sem recursos? Hoje, a empresa estrangeira não pode participar sem a Petrobras. Por isso, a indústria que fornece para o setor de óleo e gás está parada. Não tem investimento. No passado, vivemos uma época de bom investimento, com as refinarias, mas tudo parou. Vamos analisar, por exemplo, a situação dos estaleiros. O nossos não têm condição de competir com os de Cingapura, da Coréia, da Holanda. Não têm clientes globais. Os únicos clientes são a Petrobras e seus sócios. Hoje, estive com o presidente da Federação das Indústrias de Pernambuco, que me falou de um alto índice de demissão na indústria naval pernambucana, como tem na Bahia, tem no Rio Grande do Sul, tem no Rio de Janeiro e assim por diante.

247 – Como reverter esse quadro?

Andrade – Tem que abrir o mercado e mudar essa regulação do petróleo. A Petrobras não pode ter esse monopólio. Só assim vamos reativar a cadeia industrial de óleo e gás.

247 – Mas e a política de conteúdo nacional? Ela deve ser mantida?

Andrade – Sim, a política de conteúdo nacional tem que ser mantida, mas temos que aperfeiçoá-la. Existem setores em que nós não temos como fornecer e eu soube outro dia que as multas da Agência Nacional do Petróleo chegavam a R$ 10 bilhões para as empresas que não tinham cumprido as regras de conteúdo nacional. Tem um exagero aí. Agora, se você acabar com a política de conteúdo local, imediatamente você fecha todos os estaleiros.

247 – Muitas empresas importantes da indústria naval, da engenharia e da engenharia, que poderiam ser importantes investidores nas concessões, estão afetadas pela Lava Jato. O sr. defende os acordos de leniência?

Andrade – Ninguém pode ser contra que se faça uma apuração rigorosa sobre qualquer caso de corrupção. Todos nós somos a favor. No entanto, no mundo inteiro, a empresa que participou paga uma multa. No mundo, as empresas não são impedidas de continuar trabalhando. Se um executivo participou de uma ilegalidade, a empresa não é corrupta. Veja o caso da holandesa SBM.

Lá na Holanda e também aqui, eles pagaram uma multa. Essas empresas que estão na Lava Jato quantos trabalhadores têm? E o fato é que eles não têm nada a ver com isso.

247 – A CNI não deveria também discutir o fim das doações empresariais de campanha?

Andrade – Esse é um tema muito complexo. Nos Estados Unidos, as empresas podem doar. Lá, fazem doações legais, apoiam parlamentares. Se não me engano, não podem fazer para campanha presidencial. Se você tirar a capacidade das empresas de fazer doação legal, quais os setores vão poder doar? Algumas entidades recebem recursos e não são consideradas empresas. Por exemplo, igrejas. A atuação dos grupos de interesse numa sociedade é legítima. Também por isso, temos que legalizar o lobby no Brasil.

247 – O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) defende que empresas com contratos com o setor público sejam impedidas de doar. É uma boa medida? 

Andrade – É bom que sejam proibidas doações de empresas com contratos com setor público. Isso já acontece nas concessões. Mas será que a lei está sendo cumprida? As concessionárias não doam, mas seus controladores, sim. O problema de proibir as doações empresariais é que vamos deixar as ações de lobby e de influência nas mãos de poucos setores. E de setores que talvez não sejam os mais desejáveis. Além disso, o Brasil não tem cultura de fazer doação de pessoa física. Ou vamos permtir as empresas, ou vamos ter financiamento público. Mas será que o financiamento público resolve ou vai ter uma concentração muito forte em alguns partidos? Uma contraparte nossa nos Estados Unidos recebe recursos das empresas e distribui para os candidatos.

É uma estrutura organizada de defesa de interesses.

247 – Embora o tema da desoneração parece longe de um desfecho satisfatório para a indústria, os setores empresariais tiveram uma vitória no tema da terceirização, que ainda não passou no Senado. Como a CNI encarou esse debate?

Andrade – A decisão tomada na Câmara dos Deputados atende parcialmente a os interesses empresariais. Só houve uma falha, ao não permitir a terceirização nas empresas estatais. Isso é o maior absurdo que existe. E o governo deve se preocupar para corrigir isso no Senado. Até porque os maiores terceirizadores do Brasil são Petrobras, Eletrobras, Furnas e Correios.

247 – Mas não é importante separar atividade-meio da atividade-fim?

Andrade – A fronteira é muito tênue.  Quando os representantes municipais dos Correios recebem a correspondência, isso é atividade-meio ou atividade-fim? Quando uma empresa de energia subcontrata uma empresa para colocar poste e trocar luminária, faz atividade-meio ou atividade-fim? O mais importante é criar segurança jurídica para as empresas e para os trabalhadores. Nós temos mais de 12 milhões de trabalhadores que chamam de terceirizados no Brasil. Muitos deles não têm segurança jurídica.

247 – Voltando ao tema da confiança, como o sr. avalia o noticiário econômico no Brasil?

Andrade – Há um certo pendor para o pessimismo, o negativismo. Dizem assim: 'a vinda dos chineses é boa, mas em compensação continua tendo o problema da Lava Jato, da Petrobras'. A confiança vem muito da mídia, até porque o ambiente econômico é formado por expectativas. Em maio de 2013, eu fui à França. No dia seguinte, o governo editou um decreto determinando que a venda de empresas estratégicas tivesse aval oficial. Eles fizeram isso porque a GE pretendia comprar uma parcela importante da Alstom. O governo fez isso para defender a empresa francesa. Eu fiquei pensando: se algo assim fosse feito no Brasil, seria um deus-nos-acuda. No dia seguinte, os jornais não deram uma palavra. Por quê? Porque são nacionalistas.

247 – Nossa elite é menos nacionalista?

Andrade – Nós temos uma cultura de que o que vem de fora é melhor. Somos colonizados. A indústria brasileira é muito diversificada, é muito competente. Nosso custo, dentro da indústria, comparado ao de outros países não é muito diferente.

Temos um problema de produtividade, porque nossa mão de obra não é tão qualificada. E também um custo alto da mão-de-obra, não em razão dos salários, mas dos encargos. O Brasil tem muitas oportunidades, não só na infraestrutura. Imagina essa população consumindo. Há muitas oportunidades na agroindústria, na linha branca. Tenho certeza de que o momento atual é passageiro.

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