Para FHC, chegou a hora de Dilma "beijar a cruz"

Isso significa se abrir para novas privatizações em vários setores da economia; no entanto, ele afirma que o PT não se mostra arrependido e prevê que não ocorrerá uma guinada na política econômica; a solução, sob a ótica de FHC, seria trocar os "oficiantes nas eleições de 2014"; "fazem malfeito, como quem não está gostando, o que o PSDB fez e faria bem feito, se estivesse no comando", afirma

Para FHC, chegou a hora de Dilma "beijar a cruz"
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247 - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso propõe que a presidente Dilma Rousseff assuma de vez um viés privatista e faça, com gosto, o que o PT, segundo ele, vem fazendo de forma envergonhada até agora. No artigo "Beijar a cruz", ele propõe uma agenda radical de privatizações, como receita para estimular o crescimento econômico. Leia abaixo:

Beijar a cruz - FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Já passou da hora de o governo do PT beijar a cruz. Afinal, muito do que ele renegou no passado e criticou no governo do PSDB passou a ser o pão nosso de cada dia da atual administração. A começar pelos leilões de concessão para os aeroportos e para a remodelação de umas poucas estradas. No início procurava mostrar as diferenças entre “nós” e “eles”, em seu habitual maniqueísmo. “Nossos leilões”, diziam, “visam a obter a menor tarifa para os pedágios”. Ou, então, afirmavam, “nossos leilões mantêm a Infraero na administração dos aeroportos”. Dessas “inovações” resultou que as empresas vencedoras nem sempre foram as melhores ou não fizeram as obras prometidas. Pouco a pouco estão sendo obrigados a voltar à racionalidade, como terão de fazer no caso dos leilões para a construção de estradas de ferro, cuja proposta inicial assustou muita gente, principalmente os contribuintes. Neles troca-se a vantagem de a privatização desonerar o Tesouro pela obsessão “generosa” de atrair investimentos privados com o pagamento antecipado pelo governo da carga a ser transportada no futuro...

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Ainda que renitente em rever acusações feitas no passado (alguns insistem em repeti-las), a morosidade no avanço das obras de infraestrutura acabará por levar o governo petista a deixar de tentar descobrir a pólvora. Já perdemos anos e anos por miopia ideológica. O PT não conseguiu ver que os governos do PSDB simplesmente ajustaram a máquina pública e as políticas econômicas à realidade contemporânea, que é a da economia globalizada. Tomaram a nuvem por Juno e atacaram a modernização que fizemos como se fosse motivada por ideologias neoliberais e não pela necessidade de engajar o Brasil no mundo da internet e das redes, das cadeias produtivas globais e de uma relação renovada entre os recursos estatais e o capital privado.

Sem coragem para fazer autocrítica, o petismo foi pouco a pouco assumindo o programa do PSDB, e agora os críticos do mais variado espectro cobram deste o suposto fato de não ter propostas para o Brasil... Entretanto, a versão modernizadora do PT é “envergonhada”. Fazem malfeito, como quem não está gostando, o que o PSDB fez e faria bem feito, se estivesse no comando.

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Agora chegou a vez dos portos. Alberto Tamer – e presto homenagem a quem faleceu deixando um legado de lucidez em suas colunas semanais –, na última crônica que fez no Estado de S. Paulo: “Foi Fernando Henrique Cardoso que abriu os portos”, recordava o esforço, ainda no governo Itamar Franco, quando Alberto Goldman era ministro dos Transportes, para dinamizar a administração portuária, abrin­do-a à cooperação com o setor privado, pela Lei 8.630 de 1993. Caro custou tornar viável aquela primeira abertura quando eu assumi a Presidência. Foi graças aos esforços do contra-almirante José Ribamar Miranda Dias, com o Programa Integrado de Modernização Portuária, que se conseguiu avançar.

Chegou a hora para novos passos adiante, até porque o Decreto 6.620 do governo Lula aumentou a confusão na matéria, determinando que os terminais privados só embarcassem “carga própria”. Modernizar é o que está tentando fazer com atraso o governo Dilma Rousseff. Mas, aos trancos e barrancos, sem negociar direito com as partes interessadas, trabalhadores e investidores, sem criar boas regras de controle público nem assumir claramente que está privatizando para aumentar a eficiência e diminuir as barreiras burocráticas. Corre-se o risco de repetir o que já está acontecendo nos aeroportos e estradas: atrasos, obras malfeitas e mais caras etc. No futuro ainda dirão que a culpa foi “da privatização”... Isso sem falar do triste episódio das votações confusas, tisnadas de suspeição e de resultado final incerto no caso da última Lei dos Portos.

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A demora em perceber que o Brasil estava e está desafiado a dar saltos para acompanhar o ritmo das transformações globais tem sido um empecilho monumental para as administrações petistas. No caso do petróleo foram cinco anos de paralisação dos leilões. Quanto à energia em geral, a súbita sacralização do pré-sal (e correspondentemente a transformação da Petrobras em executora geral dos projetos) levou ao descaso no apoio à energia renovável, de biomassa (como o etanol da cana-de-açúcar) e eólica. Mais ainda, não houve preocupação alguma com programas de poupança no uso da energia. Enfim, parecem ter assumido que, já que temos um mar de petróleo no pré-sal, para que olhar para alternativas?

Ocorre, entretanto, que a economia norte-americana parece estar saindo da crise iniciada em 2007/8 com uma revolução tecnológica (de discutíveis efeitos ambientais, é certo) que barateará o custo da extração dos hidrocarburetos e colocará novos desafios ao Brasil. A incapacidade de visão estratégica, derivada da mesma nuvem ideológica a que me referi, acrescida de um ufanismo mal colocado, dificulta redefinir rumos e atacar com precisão os gargalos que atam nossas potencialidades econômicas ao passado. Não é diferente do que ocorre com a indústria manufatureira, quando, em vez de perceber que a questão é o de reengajar nossa produção nas cadeias produtivas globais e fazer as reformas que permitam isso, faz-se um política de benefícios esporádicos, ora diminuindo impostos para alguns setores, ora dando subsídios ocultos a outros, quando não culpando o desalinhamento da taxa de câmbio ou os juros altos (os quais tiveram sua dose de culpa) pela falta de competitividade de nossos produtos.

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As dificuldades crescentes do governo em ver mais longe e administrar corretamente o dia a dia para ajustar a economia à nova fase do desenvolvimento capitalista global (como o PSDB fez na década de 90) indicam que é tarde para beijar a cruz, até porque o petismo não parece arrependido. Melhor mudar os oficiantes nas eleições de 2014.


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