Merval enterra CPI do Cachoeira e tira sarro de Dirceu
Colunista do Globo diz que um dos alvos da comissão criada por José Dirceu para "tumultuar" o julgamento do mensalão era a "imprensa livre", representada, segundo ele, pela revista Veja; hoje, Dirceu está condenado e o PT não ousou convocar Roberto Civita e Policarpo Júnior
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247 - Um dia, quem sabe, o PT poderá fazer sua autocrítica em relação à CPI do Cachoeira, destinada a investigar um dos maiores esquemas de corrupção e tráfico de influência no País, que contava com um braço decisivo nos meios de comunicação.
Criada em paralelo com o julgamento da Ação Penal 470, a comissão poderia ter desvendado o modus operandi de uma quadrilha que plantava denúncias na maior revista semanal do País, valendo-se de um esquema clandestino de arapongagem, obtendo, assim, benefícios comerciais e políticos.
Acovardado, o Partido dos Trabalhadores foi incapaz de convocar Roberto Civita, editor de Veja, e o jornalista Policarpo Júnior, braço direito de Cachoeira, no momento em que até a coincidência histórica lhe favorecia - na Inglaterra, país livre, Rupert Murdoch, maior empresário de mídia do mundo, era ouvido numa comissão parlamentar sobre os grampos do jornal News of the World, fechado em função do escândalo.
Deu no que deu. José Dirceu e José Genoino foram condenados, aguardam suas sentenças, e a CPI está prestes a ser enterrada sem ter colhido qualquer informação sobre o braço midiático de Cachoeira. A tal ponto que, na coluna deste sábado, Merval Pereira sente-se à vontade para tirar um sarro de Lula e José Dirceu, que teriam criado a CPI para intimidar a "imprensa livre" representada por Veja.
Dupla derrota do PT: tanto no julgamento da Ação Penal 470, como na CPI do Cachoeira. Derrotas que a vitória eleitoral em São Paulo conforta, mas que não subtraem.
Abaixo, a coluna de Merval:
Fiasco de CPI
Merval Pereira
A CPI do Cachoeira nasceu de estratégia equivocada do ex-presidente Lula e de José Dirceu, na tentativa de, se não impedir, ao menos tumultuar o julgamento do mensalão no STF. Já que o adiamento para as calendas gregas não foi obtido com o assédio pessoal de Lula a ministros, dos quais o mais vistosamente frustrado foi a Gilmar Mendes, que denunciou a tentativa de chantageá-lo, partiram os petistas para montar uma CPI que colocaria a oposição contra a parede.
Os alvos principais eram os oposicionistas de maneira geral, o governador de Goiás, Marconi Perillo, em particular, o procuradorgeral da República, pelo atrevimento das acusações contra o PT, e a imprensa livre, representada pela revista “Veja”.
O rolo compressor governista, no entanto, não foi suficiente para fazer da CPI uma cortina de fumaça para o julgamento do mensalão, e políticos independentes impediram que a estratégia petista desse certo. Ao contrário, o feitiço voltou-se contra o feiticeiro, e o surgimento da empreiteira Delta com seus vínculos com o bicheiro Carlinhos Cachoeira colocou o governismo numa sinuca de bico. Frustradas todas as investidas contra seus inimigos, viram- se os petistas na perspectiva de ser a CPI usada contra seus parceiros caso a investigação sobre o empreiteiro Fernando Cavendish fosse adiante. A CPI virou palco de uma batalha, fora do controle, até que oposição e situação viram que era melhor exterminá-la sem dar tempo para novos embates.
O GLOBO fez um levantamento nos 533 requerimentos que não serão votados e constatou uma “troca de chumbo” entre governistas e oposicionistas que poderia atingir a todos. A oposição propôs uma prorrogação da CPI por seis meses, mas a situação aprovou apenas até o fim do ano, mesmo assim sem nenhuma nova investigação.
Para o deputado Miro Teixeira, um dos líderes da ala independente, os dois lados queriam mesmo esse desfecho, só que alguns posam para a plateia defendendo maiores investigações, mas internamente trabalham pelo fim da CPI. Seria a “bancada do cancã”, que distrai o público com suas danças, na mordaz definição do parlamentar do Rio.
Tem razão Miro quando diz que de nada valeria dar sobrevida à CPI se não fosse para quebrar os sigilos de empresas-fantasmas do esquema de Cachoeira que receberam dinheiro da Delta. Mas essa quebra não interessava a governistas de vários matizes.
Peculiaridade da trama criminosa do bicheiro Cachoeira é que ela é pluripartidária, perfeitamente adaptada aos tempos pragmáticos de coalizões amplíssimas e sem nenhum nexo programático entre tais partidos abrigados pelo generoso guarda-chuva governista.
Cachoeira ia além e unia governistas e oposicionistas, sem distinção. O ex-senador Demóstenes Torres, expulso do DEM, e o governador Marconi Perillo, do PSDB de Goiás, que deve ser indiciado pela CPI, são exemplos goianos desse multipartidarismo. Assim como o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, representa o petismo e, se não for também indiciado, será devido à maioria esmagadora do governo na CPI.
O fato é que a construtora Delta tinha ramificações em todos os estados e por todos os partidos, sendo a mais notória ligação com o governador do Rio, Sérgio Cabral, do PMDB, que teve todo o apoio do governo federal para impedir que o sigilo da construtora fosse quebrado. A CPI do Cachoeira vai se encerrar sem nenhuma contribuição a dar e enviará os dados que recebeu sob sigilo ao Ministério Público, que investiga o esquema. Mesmo assim porque parlamentares independentes procuraram por conta própria o Ministério Público em Goiás para combinar a remessa desse material, para que não se perdesse.
Mais um fiasco a confirmar que o Congresso precisa se reciclar para não continuar com a imagem negativa que tem diante da opinião pública.
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