Morrer e voltar da morte. Relatos de pessoas que se foram... e voltaram

Extraordinários relatos de pessoas que tiveram morte clínica ou estiveram perto de morrer e recuperaram-se intrigam médicos e cientistas. São o produto de fenômenos químicos do cérebro ou prova da sobrevivência do espírito?

Extraordinários relatos de pessoas que tiveram morte clínica ou estiveram perto de morrer e recuperaram-se intrigam médicos e cientistas. São o produto de fenômenos químicos do cérebro ou prova da sobrevivência do espírito?
Extraordinários relatos de pessoas que tiveram morte clínica ou estiveram perto de morrer e recuperaram-se intrigam médicos e cientistas. São o produto de fenômenos químicos do cérebro ou prova da sobrevivência do espírito? (Foto: Gisele Federicce)


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Por: Eduardo Araia

 

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O paciente de 44 anos que deu entrada no hospital naquela noite apresentava parada cardíaca e extremidades arroxeadas. Ao ser entubado, a parte superior de sua dentadura saiu do lugar e um médico colocou-a sobre o carrinho de atendimento. A equipe insistiu por um bom tempo na ressuscitação cardiopulmonar e, 90 minutos depois, ele foi levado para a UTI, ainda em coma, entubado e com ventilação artificial.

Uma semana depois, o médico reencontrou o paciente. Este, ao vê-lo, apontou para uma funcionária e exclamou: “Aquela enfermeira sabe onde está minha dentadura!” E disse ao perplexo médico: “Sim, você estava lá quando a ambulância me trouxe para o hospital. Você tirou minha dentadura da boca e a pôs em cima do carrinho.”

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O médico perguntou ao paciente o que ele lembrava da ocasião e se surpreendeu com o que ouviu. O homem se viu na maca, de uma perspectiva de cima, e assistiu ao esforço de médicos e enfermeiras para recuperá-lo. Ele descreveu em minúcias a pequena sala em que fora atendido e o aspecto das pessoas presentes. Disse que buscou, sem êxito, mostrar à equipe que ainda vivia e que as manobras de ressuscitação deveriam continuar. O paciente ficou tão impressionado com o ocorrido que confessou não temer mais a morte. Quatro semanas depois, já recuperado, recebeu alta.

 

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Relatos do gênero existem desde o passado mais remoto

 

Esse caso, parte de um estudo holandês com 344 pacientes abordado em 2001 na revista médica inglesa The Lancet, exemplifica a chegada definitiva das experiências próximas à morte ao campo de estudo da ciência. Já não era sem tempo: culturas dos mais variados cantos do mundo e de todas as épocas possuem descrições que se encaixam no gênero. Mas essas experiências só começaram a atrair a atenção do meio científico no fim do século 19, quando o geólogo suíço Albert von St. Gallen Heim publicou uma coletânea de testemunhos pessoais dessas experiências, concedidos por alpinistas que haviam se acidentado nas montanhas (como ele próprio), soldados feridos em combate, operários que haviam caído de andaimes e indivíduos que quase haviam morrido por afogamento ou outros acidentes. Depois disso, surgiram regularmente relatos de pessoas ressuscitadas após serem declaradas clinicamente mortas, outras que, durante acidentes ou doenças, temeram morrer, e indivíduos que, mesmo agonizando, conseguiram narrar suas experiências.

A atual fase de interesse pelo fenômeno começou em meados dos anos 1970, quando o psiquiatra americano Raymond Moody debruçou-se sobre mais de cem casos do gênero. Criador do termo near-death experience (traduzido como “experiência de quase morte”, ou EQM) e autor de um livro clássico sobre o assunto, Vida Depois da Vida, ele identificou 15 elementos originais comuns a essas ocorrências: inefabilidade (não conseguir descrever o que ocorreu em virtude de sua natureza); ouvir-se declarado morto; sentir paz; ouvir barulhos incomuns; ver um túnel escuro; sentir-se fora do corpo; encontrar seres espirituais; encontrar uma luz brilhante ou um ser de luz; rever a vida em síntese; ver um reino onde todo o conhecimento existe; ver cidades de luz; ver um reino de espíritos desnorteados; passar por um resgate sobrenatural; passar por uma fronteira ou limite; retornar ao corpo.

Após novos estudos, ele acrescentou à lista quatro efeitos posteriores recorrentes: a frustração ao relatar a experiência para outras pessoas, uma avaliação mais abrangente da vida, o fim do medo da morte e a corroboração de visões fora do corpo.

 

Redução do oxigênio do cérebro?

 

Desde o trabalho de Moody, as pesquisas no setor começaram a se multiplicar. Vários estudos mostraram que entre 4% e 18% das pessoas ressuscitadas após paradas cardíacas têm uma EQM. Duas linhas básicas de explicação surgiram a partir daí. A primeira busca explicar o fenômeno em bases fisiológicas – seria efeito, por exemplo, da redução ou da ausência de oxigênio no cérebro, ou da ativação de uma área do lobo temporal direito ligada à religiosidade e adormecida no restante do tempo. A segunda é muito mais ousada: propõe que a consciência pode existir independentemente de um cérebro em funcionamento, ou que, pelo menos, ela seja mais complexa do que a ciência supõe atualmente.

Uma avaliação isenta do assunto indica que ele não se acomoda facilmente na explicação orgânica. Diversos estudos mostram que é impossível predizer a ocorrência ou o tipo de EQM a partir de variáveis como idade, gênero, raça ou histórico de doença mental. As alucinações produzidas pela escassez ou falta de oxigênio no cérebro são assustadoras e deixam o paciente agitado e belicoso – um panorama muito diferente do encontrado nos casos de EQM. Outra alternativa fisiológica, a de que as EQMs seriam induzidas por remédios dados a pessoas agonizantes, não resistiu a estudos comparativos os quais mostraram que pacientes que recebem medicamentos relatam menos EQMs do que aqueles que não receberam nenhum medicamento. E existem poucas evidências empíricas de que as EQMs como um todo são atribuição exclusiva de neurotransmissores ou atividades em pontos determinados do cérebro, ou ainda de modelos psicológicos específicos, como mecanismos de defesa ou a determinação de tomar desejos por realidade.

As EQMs também não mostraram diferenças substanciais quanto à cultura ou à religião. Num estudo realizado nos Estados Unidos e na Índia, por exemplo, os psicólogos Karlis Osis e Erlendur Haraldsson não acharam nenhuma relação direta entre a religiosidade e as visões no leito de morte, mas descobriram que o sistema de crenças da pessoa influenciava o modo com que ela interpretava sua experiência. As mesmas conclusões foram tiradas pelo psicólogo americano Kenneth Ring após entrevistar 102 sobreviventes de crises de quase morte.

 

 

Médicos e pesquisadores começam a se interessar

 

“Se ficamos apenas no fisiológico para explicar o que ocorre nessas ocasiões, estamos restritos”, avalia o médico intensivista (plantonista de unidades de terapia intensiva) José Roberto Pereira Santos, de Vitória (ES), que estuda o tema desde 1995. “Como explicar que um cérebro que está parado produza aquelas visões, que chegam a mexer com o psiquismo das pessoas envolvidas?” Médicos e pesquisadores reunidos na Primeira Conferência Médica Internacional sobre as Experiências de Quase Morte, realizada na França em 2007, concordam com o raciocínio. Eles não negam que a EQM é mediada por mudanças químicas no cérebro, mas ressaltam que “seu teor extremamente rico e complexo não pode ser reduzido a uma mera ilusão”.

O que particulariza as EQMs e as exclui dos modelos científicos atuais é seu poder de expandir a espiritualidade e promover transformações interiores em quem as vivencia. Pesquisadores que comparam EQMs com experiências místicas como as de Santa Teresa de Ávila e São João da Cruz, por exemplo chamam a atenção para as semelhanças apresentadas pelos dois fenômenos, como a inefabilidade, a visão de uma luz brilhante ou de um ser luminoso e a sensação de estar diante de algo maior do que si próprio. Para o teólogo britânico Paul Badham, a EQM não apenas “partilha muitas das características das mais profundas experiências religiosas conhecidas da humanidade” como permite que pessoas comuns tenham uma iluminação mística antes acessível apenas em ocasiões raras.

 

 

Em geral, essas ocasiões proporcionam uma substancial – e benéfica – mudança de valores, crenças e de atitude em relação à morte e um novo significado para a vida. “Os indivíduos que vivem EQMs tendem a se ver como partes integrais de um universo benevolente e dotado de sentido, no qual o ganho pessoal, particularmente o obtido à custa de outrem, não é mais relevante”, avalia o psiquiatra americano Bruce Greyson, diretor da Divisão de Estudos da Percepção da Universidade da Virgínia (EUA). “Efeitos posteriores reportados mais frequentemente incluem aumentos na espiritualidade, preocupação com os outros e apreço pela vida; um senso elevado de propósito; e redução do medo da morte, de atitudes materialistas e da competitividade.”

Cada vez mais acuados pelas agressões geradas contra a natureza e os próprios semelhantes, os homens precisam de uma transformação radical – e, nesse sentido, pensadores tão diversos como o psiquiatra Carl Jung, o historiador Arnold Toynbee e o médico Albert Schweitzer escreveram que “nada menor do que uma revolução espiritual mundial bastará” para salvar a civilização humana. As EQMs e experiências místicas semelhantes podem ser parte dessa revolução, afirma Kenneth Ring. A evolução constante das técnicas de ressuscitamento ajuda a trazer um número cada vez maior de pessoas das fronteiras da morte para dar seu testemunho e fazer a consciência coletiva da humanidade avançar. E, ao provocar os cientistas no sentido de explicá-las, as EQMs podem também estar colaborando para lançar as bases de uma ciência mais abrangente e sintonizada com a espiritualidade.

 

 

A hipótese do sono

 

Em 2006, pesquisadores da Universidade de Kentucky (EUA) liderados pelo neurologista Kevin Nelson propuseram que as EQMs estão ligadas a um distúrbio do sono denominado “intrusão REM” (REM é a abreviatura em inglês para a fase do sono em que ocorrem os sonhos). Nesse distúrbio, a mente da pessoa desperta antes do seu corpo. Isso explicaria, por exemplo, por que pessoas que têm EQMs sentem-se paralisadas enquanto tentam dizer aos circundantes que estão acordadas. Segundo os pesquisadores, as EQMs usariam os mesmos mecanismos do cérebro envolvidos nos sonhos.

A equipe de Nelson testou 55 pessoas que tiveram EQMs e 55 indivíduos como controle. No primeiro grupo, 60% relatou alguma história ligada à intrusão REM. Numa edição do Journal of Near-Death Studies, porém, os médicos Jeffrey Long e Janice Miner Holden afirmaram que, se 40% dos integrantes do grupo negaram ter episódios de intrusão REM, a ideia de Nelson “parece questionável, na melhor das hipóteses”. O neurologista promete testar mais sua teoria.

 

O corpo em duplicata

 

Em 2006, neurologistas suíços ofereceram uma nova interpretação para uma das características das experiências de quase morte: a “saída do corpo”. Segundo Olaf Blanke, da Faculdade de Medicina da Universidade de Genebra (Suíça) e líder do grupo, ela é causada por “perturbações de um processo complexo de coordenação, que se pode atualmente localizar no cérebro”. Os cientistas descobriram essa correlação ao pesquisar, por estímulos elétricos, a localização de áreas-chave do cérebro ligadas a formas mais graves de epilepsia.

“A representação corporal fica perturbada (...) enquanto se estimula eletricamente a junção temporoparietal”, afirma Blanke. “Nesse momento, o cérebro gera uma imagem do corpo, mas ela é deslocada, como que projetada sobre o corpo, à frente ou atrás dele. Nos dois primeiros casos, os pacientes reconheceram ainda sua própria imagem; no último, ao contrário, eles sentiram outra presença, sombria e ameaçadora.”

 

O que há para se ler:

Raymond Moody Jr., Vida Depois da Vida, A Luz que Vem do Além (Butterfly), Investigando Vidas Passadas (Cultrix), Reencontros (Nova Era); Kenneth Ring, Lições da Luz (Summus) e Rumo ao Ponto Ômega (Rocco); site da International Association for Near Death Studies: www.iands.org.

 

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