O PSDB e o silêncio das chacinas

Ao acolher o Coronel Telhada em seus quadros e, o que é ainda pior, cogitar nomeá-lo para uma Comissão de Direitos Humanos, o PSDB trai a sua história e constrange mais uma vez seus militantes



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Leio no site de um dos principais jornais de SP, e aqui mesmo no Brasil 247, que o Partido da Social Democracia Brasileira pretende indicar o vereador eleito, Coronel Telhada, para a comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de SP. Seria uma piada digna do macaco Simão não fosse dura e abjeta realidade. É um triste retrato acabado da realidade infame em que se transfigurou o PSDB. Uma traição aos ideais de Franco Montoro, Mário Covas, José Richa, FHC, José Paulo Bisol, Luiz Carlos Bresser Pereira, Célio de Castro e Ruth Cardoso, dentre tantos que assinaram a ata de fundação do partido naqueles dias de junho de 1988.

O coronel Telhada dispensa maiores apresentações: as 36 mortes que "ilustram" seu currículo são eloquentes da sua suposta "competência" para servir, primeiro à PM de São Paulo e agora à Câmara Municipal. Não há o que discutir – apenas deplorar. Telhada foi eleito com mais de 89 mil votos. É sinal, quiçá inequívoco, de que tem muito cidadão que admira o currículo do coronel, agora vereador. Fazer o quê? É o chamado "voto de direita" ou "voto da intolerância". Democracia é isso: pluralismo de ideias. Ideias?!

Sempre se soube da existência de ao menos dois PSDBs em São Paulo: uma ala mais à esquerda – de Covas e FHC, por exemplo – e uma ala mais à direita capitaneada por Geraldo Alckmin que, nunca é demasiado lembrar, foi vice de Covas. Assim, com a escolha de Alckmin para vice, fez-se na época a providencial ponte entre os intelectuais "uspianos", amasiados ao "conservadorismo liberal" de setores da elite da megalópole dita cosmopolita, e a "caipirada" mais reacionária do interior do estado. Não à toa os episódios de extermínio de policiais e de bandidos se deram nos dois governos Alckmin. Não lhe parece ao menos curioso e digno de nota esse fato?

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Não podemos deixar de lembrar ainda o emblemático caso de José Serra. Grande quadro "histórico" do PSDB, Serra é um exemplo clássico de político tucano que transitou com tamanha inesperada desenvoltura e "radicalismo" da ala mais à esquerda para a direita do partido. Sintomaticamente, perdeu várias eleições seguidas.

Do outro lado do front, em outra Casa parlamentar, na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp), numa forma completamente diversa de enxergar e pensar a questão dos Direitos Humanos, o rapper Mano Brown, ao receber o XVI Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos, proferiu as seguintes palavras referindo-se ao governador do estado de SP: "Ele é o governador que usou as mortes como instrumento de domínio (...). A mídia não mostra a realidade dos fatos. A gente está assistindo como se fosse guerra de quadrilha. Uma quadrilha com autorização do governo e a outra que está desarmada, de costas(...). Então, o que temos que fazer realmente é o impeachment".

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Nessa mesma premiação foi contemplado o jornalista da Folha de S.Paulo, André Caramante, que teve que "curtir" com sua família um exílio de 3 meses no exterior porque escreveu matérias sobre o coronel Telhada e teria sofrido ameaças.
Bom... os direitos humanos...

O PSDB ao acolher Telhada em seus quadros e, o que é ainda pior, cogitar nomeá-lo para uma Comissão de Direitos Humanos, trai a sua história e constrange mais uma vez seus militantes. Torna-se motivo de piada. Piada de mau gosto – diga-se.

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É possível encontrar algum denominador comum entre a prática violenta e o discurso cínico do "confronto seguido de óbito em combate" de Telhada, e o grito da periferia excluída vocalizado no discurso radical de Brown? Sim, afinal nem todos os mortos pela polícia são bandidos. Ademais, o fato de serem bandidos ["Telhadas", "Contes Lopes" e "Bolsonaros" à parte] não justifica o possível "justiçamento". Tampouco se deve tolerar o assassinato covarde de policiais. Sim. Decerto. Mas o equilíbrio nessa delicada balança seria uma prerrogativa própria dos grandes homens públicos. E grandes homens públicos nos dias que correm é espécie em extinção.

Ao que parece a ala mais à direita se apropriou em caráter definitivo do PSDB. Essa ala hoje está instalada no poder, no governo do estado. E, sabe-se, quem tem a máquina nas mãos tem os cargos para oferecer aos correligionários e consequentemente tem o controle da máquina partidária. É assim que, infelizmente, ainda funciona o jogo do poder – ao menos enquanto não realizamos a tão necessária reforma política. Resultado: a direita dá as cartas hoje em SP.

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Assim o partido dito da social democracia à brasileira se descaracteriza e progressivamente vai perdendo a sua identidade e credibilidade entre seus eleitores e militantes, que migram para o PT ou para o PSB. O mesmo se dá com seus principais quadros e intelectuais: migram constrangidos para outras agremiações.

Qual será o futuro do PSDB em São Paulo e no resto do Brasil? Terá força suficiente e, sobretudo, credibilidade para emplacar o neto de Tancredo Neves, ou outro candidato, em 2014? Hoje, seu telhado de vidro – na verdade, de cristal – não resistiria às primeiras pedras de granizo.

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Onde estão os intelectuais do PSDB que não se manifestam diante de piada tão infame: o completo descalabro em que se enreda o partido?

Nada se escuta para além do silêncio dos sepulcros e das chacinas.

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