Somos ódio!

O ódio ao pobre é desta maneira, o ódio ao trabalho que tenta se emancipar, se liberar das grades de ferro do patronato e do Estado, que quer ser livre, essa palavra perigosa e que assombra aos que nos mandam



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Para os do "andar de cima" avançar na realização dos direitos sociais não nos leva a de fato, sermos, uma nação. Garantir na mesa de cada brasileiro três refeições diárias, segundo essa casta, nos dizeres de Lula da Silva, branca e de olhos azuis, é um atraso histórico e impede o desenvolvimento do Brasil como potência. Para essa etno-classe dominante, um negro vestido de jaleco branco, com um "Dr" antecedendo seu nome e procedendo cirurgias de alta complexidade não cai bem; uma negra administrando empresas e chefiando um batalhão de engravatados é algo inadmissível.

Esse "distributivismo" é perverso para o país, como contou um dos quadros da direita em recente programa conduzido pelo intragável William Waack. O argumento é que essa "estranha mania" de produzir políticas sociais gera déficit nas contas públicas e daí o atual quadro de insuficiência econômica em que nos encontramos.

É estranho! Soa cínico e perverso! É como se os criadores do imenso leviatã de miseráveis em que se tornou o Brasil saíssem a justificar que as opções que foram tomadas por eles mesmos ao longo de trágicos cinco séculos fossem corretas. É como se não fosse correto, justo e mesmo necessário tomar novos rumos, romper com o ciclo vicioso gerador de pobreza que sempre fez do Brasil o mais injusto país do mundo. Ora bolas... Romper com a metástase da miséria e que consumia três quartos dos povos do Brasil é e sempre foi o principal imperativo para a vida nacional. Não é a inflação, pura e simples... É o povo!

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Esse tipo de concepção é de um atraso abismal. Herança de quatro séculos de escravidão, reflexo objetivo e direto da ação política do agrarismo brasileiro, aliás, segmento da gestão e operação da própria escravidão brasileira e que não casualmente, fundou as principais instituições e que ai estão ainda hoje, "equilibrando" o país.

Não é um fenômeno qualquer!

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É a matriz fundamental da vida econômica e política desse país e que, tragicamente, não fora superada. Achar que o racismo, a discriminação e o ódio aos negros, portanto, aos pobres do país, desapareceria com a assinatura de um decreto de abolição do trabalho compulsório de negros e negras em um muito distante 13 de maio de 1888 é de uma ingenuidade sem-fim.

O ódio, sobretudo, o ódio para com pobres e negros é algo impressionante no Brasil. Esse carácter sócio-histórico se atualiza, se renova e ganha novos padrões de complexidade. Não é algo atávico, isolado das relações sociais e políticas e que o tempo irá, tão somente, "resolver".

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Nada disso! O tempo não resolve, é a ação humana racional, politizada e humanizadora que rompe com esse trágico ciclo. De outra maneira, tal qual uma virose, esse ódio racial, posto que, de fato, é do que se trata, é componente vivo e ativo nas próprias relações entre capital e trabalho no país.

E os "de cima" simplesmente odeiam quem ousa alterar essa disparatada relação produtiva para padrões, digamos, mais ou menos modernos. Uma negra parideira, desdentada e moradora de uma quebrada de periferia mas que sabe ler é algo grave para a forma-mundo e que nos é imposta pelas elites agrárias desse país; um caboclinho mirrado, de nariz largo e de cabelos crespos e estudando o melhor da ilustração do pensamento social e clássico do Brasil é algo, pelo menos, estranho aos "donos do Brasil"; uma moça negra que se nega a transar com um playboy do "alfa ville" de palmeiras imperiais expressa não só a negativa sexual pura e simples, mas denota de outra feita, uma evolução social e política, um movimento teórico e de sensibilidades e que antes, se processa em toda a classe.

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E esse é o problema! Os "de baixo" devem ficar quietos; devem aceitar o que vem dos "de cima"; devem tão somente, existir na existência alheia; devem ser no que os outros são; devem estar a partir das determinações dos bem estabelecidos.

Somos movidos a ódio e não podemos negar isso. Fruto de nossa colonização e de suas torrentes incontáveis de sangue inocente; dos infinitos casos de abusos e massacres e que ainda apetecem frouxos neste país fora-da-lei; somos ódio em forma de povo espraiado em unidades federadas. Temos ódio de Zumbi dos Palmares porque, imaginem, este negro rebelde ousou resistir a forma mais degradante e humilhante que o juízo possa conceber: o trabalho não-remunerado feito por homens e mulheres sem alma, sem corpo, sem vida, sem vez ou voz.

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Odiamos porque não sabemos! E o não saber é o ódio acontecendo de forma educada e ideologizada. Nada sabemos sobre as resistências sempre acontecidas neste país e sempre e violentamente reprimidas porque, já sabemos, o povo não pode ter terra, chão, propriedade, saberes, sensibilidades, participação política ou atuação social diferenciada. Pode apenas e simplesmente, trabalhar, trabalhar e trabalhar...

O ódio ao pobre é desta maneira, o ódio ao trabalho que tenta se emancipar, se liberar das grades de ferro do patronato e do Estado, que quer ser livre, essa palavra perigosa e que assombra aos que nos mandam.

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De novo... Ódio é não-saber, é fazer com que não se saiba, é fracassar a escola pública por meio de estruturas arruinadas, professores debilitados e estudantes imbecilizados ante ao vivido e às possibilidades de consumo e que nossa desgraçada sociedade oferece.

O ódio nesse país tem outras frentes de compreensão. Não se limita a matar, esganar e humilhar... Ódio bom e eficaz na terra do samba e do carnaval é o não-saber! Se não sei, não me inspiro, não me identifico, não tenho referências, não luto, não me junto aos meus iguais, não terei, portanto, companheiros, camaradas e irmãos, daí... Não mudo nada e que está em minha volta de pobreza, abandono e solidão. Nosso ódio é a principal inteligência administrativa e que nos impuseram, é a principal arma das elites brasileiras contra mim ou você.

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Finalmente... Entendemos nosso ódio ou não nos entendemos, ou não entendemos a tessitura das relações sociais que marca esse país de assassinos livres, de heróis esquecidos e de genocidas homenageados em praças, escolas e livros.

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