Financiamentos de campanhas eleitorais e o princípio da moralidade – escárnio?

A representação parlamentar nos evidenciou tratar-se em muitas “oportunidades oportunistas” de uma representação não no interesse público nos temos constitucionais, mas de uma auto representação, nos termos dos seus próprios interesses, de seus partidos e dos doadores de suas campanhas



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Percebemos nitidamente a inquietude social quando aos poucos as características sociais que conferem o status de cidadania plena, ligadas a dignidade da pessoa humana, caminham para pulverização – vide crescimento da precarização do trabalho com a aprovação legislativa da terceirização irrestrita, alcançando agora também a atividade-fim com todas as suas conseqüências; a reforma previdenciária, que doerá quase exclusivamente no bolso do cidadão comum, excluídas as castas mais abastadas; a ameaça do provável aumento de uma carga tributária quase confiscatória; etc. Nesse mesmo compasso, nossos representantes, nossos políticos detentores de mandatos, parecem intocáveis em meio à maior crise política, moral, econômica e de credibilidade que encontra às claras como causas precípuas a incompetência e a corrupção (em sentido amplo – atécnico) de uma putrefata política praticada como nunca antes vista na história desse país.

Prescrita nota inicial de lamentação passemos a introdução da temática central que nos dispusemos a tratar. Há uma casta dominante de notáveis aristocratas ocupantes de cargos políticos que nos representam, que detém o poder de fato e que reparte nossos ativos econômicos em um hemisfério. Em hemisfério oposto, um povo de maioria sofrida de representados que deteria em tese o poder de direito, mas que assume todo o passivo que a incompetência e os desvios da casta dominante promoveram. É exatamente nessa lógica que o presente arrazoado se desenrolará, seguindo a lógica tupiniquim de distribuição do poder de fato que se estabeleceu no país n mais profundo e soberbo desvio de finalidade.

Normalmente os casos de abuso de poder econômico estão vinculados ao gasto não declarado à Justiça Eleitoral e não ao volume de recursos que determinado candidato ou partido político arrecadou. Considerando a disparidade que a atual legislação permite na arrecadação de recursos para campanhas eleitorais, torna-se imprescindível debater a necessidade de criação de novos critérios para o financiamento do processo eleitoral brasileiro, pois, ao fim e ao cabo, tal arrecadação terá influência na livre concorrência entre os candidatos, comprometendo inelutavelmente a paridade e a própria democracia.

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Generalidades:

A Lei 13165/2015 conhecida como Reforma Eleitoral, modificou substancialmente as regras de financiamento das campanhas eleitorais:

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“As campanhas eleitorais deste ano serão financiadas exclusivamente por doações de pessoas físicas e pelos recursos do fundo partidário”.

Que reste claro, que mesmo antes da aprovação da mini-reforma eleitoral, o Supremo já havia decidido no sentido da inconstitucionalidade das doações de empresas a partidos e candidatos.

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No Brasil, o financiamento das campanhas políticas permanece híbrido, parte público, parte privado, sendo certo que sua maior parcela vem da iniciativa privada, fato que promove consequências que será objeto da nossa exposição. Antes da reforma porém, tanto pessoas físicas quanto pessoas jurídicas eram autorizadas a fazer as doações. O beneficiário podia tanto ser o candidato, quanto o partido político, que transferia o recurso para os candidatos.

A permissão, para pessoas jurídicas estava limitada a 2% do faturamento bruto anual, mas, embora este percentual pareça pequeno, era esta a principal fonte de recursos das campanhas.

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Imagine que uma empresa que tenha faturamento anual de 4,1 bilhões de reais. Esta empresa poderia doar 82 milhões de reais para um determinado partido ou para um determinado candidato. Neste momento nascia comprometimento do candidato não com o interesse público que deveria representar, mas com a doadora que capitalizou sai campanha.

Atualmente, as empresas não podem oferecer doações para campanhas. Para pessoas físicas, as regras não mudaram: podem doar até 10% do seu rendimento bruto do ano anterior ao da campanha. Além de doações em dinheiro, pessoas físicas podem doar bens, e o limite para estas doações passou de 50 mil para 80 mil reais.

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Candidatos podem doar para outros candidatos e partidos, e podem, também, utilizar recursos próprios para a campanha, mas, em ambos os casos, os valores não podem extrapolar os gastos da campanha. Doações ocultas ou não identificadas estão proibidas.

Também são proibidas as doações por parte de entidade ou governo estrangeiro, órgão da administração pública direta ou indireta, entidade de classe ou sindical, entidades beneficentes e religiosas, entidades esportivas e organizações não governamentais que recebem recursos públicos.

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Caso sejam descumpridas a regulação supra, os doadores são penalizados com multa de 5 a 10 vezes a quantia doada em excesso, os partidos podem perder uma parcela dos recursos a que tem direito do fundo partidário e os candidatos podem ter seu registro cassado e perder o direito de ser eleito nos próximos oito anos.

No que diz respeito ao financiamento público das campanhas, os recursos são provenientes do fundo partidário, que é constituído de dotações da União, multas, penalidades, doações e outros recursos atribuídos por lei. Todos os partidos registrados no TSE têm direito a uma fração do fundo, exceto os que tiverem as contas rejeitadas.

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O fundo partidário é distribuído entre os partidos de duas maneiras:

· 5% dos recursos são divididos igualmente entre todos os partidos;

· 95% são divididos proporcionalmente, de acordo com a quantidade de votos que cada partido obteve para a Câmara dos Deputados nas últimas eleições gerais.

Todos os meses, o TSE libera os recursos do fundo partidário por meio de duodécimos (valor fixo, correspondente à décima segunda parte) e multas eleitorais (valor variável, que depende do valor arrecadado a cada mês)..

Nossa Compreensão sobre a temática central:

Muito embora em decisão absolutamente esdrúxula em ADI 2.306, em 21 de março de 2002, relatada pela ministra Ellen Gracie, o Supremo já tenha entendido a partir daquela composição ministerial, por apertada maioria, que o princípio da Moralidade só é obrigatório para Administração Pública, não alcançando os atos do Poder Legislativo a partir de uma hermenêutica deveras pobre do art. 37 da Constituição Federal, acreditamos que esta tese não deva mais prosperar pela nova composição da Casa Suprema e pela avidez social por moralidade dados os últimos anos de malfeitos da política que restaram desvendados, com especial menção às Casas Congressuais que tão bem nos representam, “só que não”. Daquela unidade ministerial só permanecem os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio, quando naquela oportunidade o Decano posicionou-se em favor de uma interpretação restritiva/literal do princípio da Moralidade ao passo que Marco Aurélio votou em favor da ampliação de sua hermenêutica, sendo certo que imersos estavam em uma outra conjuntura política menos degradada diante dos olhos de todos. O princípio da Moralidade não deve amesquinhar-se na moralidade administrativa em sentido estrito, mas na moralidade do Estado. Leitura diferente perfaz um Estado cm tendências totalitárias, não democrático.

Em verdade, a representação parlamentar nos evidenciou tratar-se em muitas “oportunidades oportunistas” de uma representação não no interesse público nos temos constitucionais, mas de uma auto representação, nos termos dos seus próprios interesses, de seus partidos e dos doadores de suas campanhas, formando-se muitas vezes verdadeiras organizações criminosas que movimentam bilhões com inscrição eleitoral de fachada. São aditivos para os crimes de caixa 2, lavagem de dinheiro, corrupção, etc.

Assim, a deliberação da temática em foco, à priori, é de competência das Casas Congressuais. Entendemos inobstante, que devem respeitar o princípio da Moralidade quando a partir de uma reforma político-eleitoral vierem a rediscutir a questão dos financiamentos de campanha em uma leitura consentânea com o espírito e princípios constitucionais vigentes. Entendemos mais, que o controle repressivo de constitucionalidade advindo do STF dos atos legislativos vindouros deve atender aos anseios do princípio da Moralidade em toda sua essência normativa, não permitindo prospere propostas que atentem contra a moralidade e o interesse púbico, atendendo aos sombrios interesses políticos de auto locupletamento. Deve neste momento o Supremo ser ativo quando chamado a pronunciar-se exigindo que a moralidade pública alcance a imoralidade política que contamina.

Sabemos porém que a nossa cultura política de auto beneficiamento da classe política prevalece. Nesta senda, somente por meio de iniciativa popular ou ativismo judicial que o atual quadro poderá ser revertido para um modelo mais razoável. A eterna discussão sobre reforma política demonstra que os parlamentares brasileiros pouco se interessam em modificar as regras eleitorais.

Ademais, o financiamento das campanhas é apenas a ponta do iceberg, pois, divisão dos recursos do Fundo Partidário e distribuição do tempo de televisão para propagandas eleitorais são outros temas espinhosos que também influenciam excessivamente na vontade do eleitor.

Diversamente de como sucede na livre iniciativa, que convive com as desigualdades dos agentes econômicos próprias do capitalismo, o processo eleitoral deve se aproximar cada vez mais da isonomia concorrencial entre candidatos políticos.

Entendemos que não apenas a repressão do abuso do poder econômico, como também a proteção da influência do poder econômico no processo eleitoral é condição sine qua non para o alcance da legitimidade do exercício do poder político como parte do livre exercício da cidadania na busca por justiça social.

A nosso sentir é momento de se retirar das mãos dos candidatos a cargos políticos a possibilidade de escambiar favores por dinheiro. Seria o momento de enxugar e trazer novamente o ideal de eleições baratas em condições de paridade aos candidatos. Um cargo político não mais encarado como uma oportunidade de estrelar “Quem quer ser um milionário?”, mas como um múnus público reverberante da mais estrita vocação.

Nem tudo é de todo ruim, como nem tudo é de todo bom, assim que no regime militar que tínhamos as fotos dos candidatos com seus respectivos números de inscrição eleitoral abaixo, o que hoje nos possibilitaria campanhas baratas e com maior controle das possibilidades de traficar favores aditivos da corrupção. Liberar-se-ia, fruto das possibilidades tecnológicas contemporâneas, que se colocassem de forma regulamentada as plataformas políticas nas redes sociais, na ambiência virtual propiciando um acesso nada oneroso e amplamente democratizado à toda sociedade, com os candidatos em condições de igualdade para disputa eleitoral, por certo muito mais justa e leal e cm maior probabilidade de atendimento ao princípio da Moralidade.

Termos em que, com eleições baratas e isonômicas seriam financiadas apenas com recursos públicos (exatamente por passarem a ser baratas), absolutamente proibida injeção de doações de entes privados (PJ ou PF), dando solução de continuidade aos descompromissos do exercício de cada político eleito com seu múnus público, quase sempre renegado com o fito de enamorar com os favores que a corrupção tem a ofertar.

Enquanto o sistema permitir que dinheiro privado patrocine campanhas o sistema de corrupção e de tráfico de influências não terá fim. Não se alcançará o ideal eleitoral de uma concorrência leal entre candidatos com tamanho a disparidade de recursos percebidos. No concernente a possibilidade pública de financiamento, o sistema precisa ser barato e simplificado, pois trata-se de dinheiro público que deve sempre respeitar as prioridades constitucionais, como a de atribuir dignidade a pessoa humana na prestação dos direitos fundamentais, que em períodos de crise cada vez mais se distancia de um mínimo existencial inegociável.

O voto distrital é outra possibilidade de barateamento e maior racionalidade do processo eleitoral, terminando com o famigerado e injusto sistema proporcional, mas a temática articularemos em futuro próximo.

A sociedade precisa conhecer deste debate e dele participar ativamente como forma do exercício de sua soberania. Consulta popular, senão por meio de plebiscito ou referendo através de audiências púbicas amplamente divulgadas, ouvidas as vozes que as ruas passarão a bradar. Isso é democracia, que permaneceria representativa, mas com respeito a sua essencial faceta participativa, em maior ou menor grau. A casta política dos notáveis, detentora do poder de fato, não pode perseverar seu massacre ao povo, em tese o real detentor do poder nos termos da Constituição de 1988, quando apenas o seu exercício restou delegado. O povo precisa se fazer ouvir e retomar o que lhe é legítimo na repartição constitucional do Poder. Urge o término da dominação que a Casta política impõe ao povo, um inaceitável escárnio não amparado pela ordem constitucional!

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