A judicialização da política

No Brasil, quando se fala de governo de coalisão, entendeu-se governo de cooptação. Quando o presidente é fraco, a economia anda mal e sua popularidade é baixa, facilmente ele se torna uma presa de interesses subpartidários, subrepublicanos, paroquiais



✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Acabo de ler um denso e substancioso trabalho sobre o conceito de Imparcialidade dos Juizes. Uma tese de doutorado em Direito realizada na UnB, por um joven advogado da AGU, Douglas Carvalho. A tese levanta muitos argumentos teóricos, jurídicos, históricos e filosóficos - ao longo da história do pensamento ocidental - sobre a formação dessa imparcialidade ou separação dos poderes e chega a uma conclusão de que ela é uma herança do liberalismo constitucional e atende a determiandos interesses.

A tendência à judicialização da política é um fenômeno generalizado, não só em função da contratualidade das relações sociais e o avanço do braço jurídico do estado no cotidiano das pessoas, mas sobretudo em função da crise de legitimidade (e funcionamento) dos demais poderes (o Poder Legislativo e o Poder Executivo), em sociedades cada vez mais complexas e conflituosas no mundo de hoje.

A doutrina da Separação de poderes, seja na sua versão francesa (Montesquieu) ou na sua versão americana (checks and balances) corresponde ao período áureo do liberalismo, onde o Parlamento despontava como o legítimo e maior detentor da soberania popular, conforme o pensamento do abade Sieyes. Com a compexificação da sociedade e a imensa pletora de funções que a administração pública assumiu, o Parlamento foi progressivamente perdendo importância na vida das nações. Ou porque não estaja aparelhado para tratar das questões, ou porque é lento na forma de decidir ou porque só cuida de aprovar medidas que atendem aos seus próprios interesses: a doença do corporativismo.

continua após o anúncio

Nos regimes presidencialistas, como o nosso, há uma improvável e perigosa conjugação de multipartidarismo com o poder do presidente. Um presidente que precisa do apoio de uma relativa maioria parlamentar, para aprovar sua agenda e dar sustentação ao mandato presidencial. E um quadro político-partidário fragmentado, pouco representativo e corporativista. Se o poder Executivo governa através de medidas provisórias, exorbita a sua competência constitucional, ao determinar a agenda do Parlamento. Se tenta buscar o apoio dos parlamentares, tende a se tornar refém do fisiologismo. No Brasil, quando se fala de governo de coalisão, entendeu-se governo de cooptação. Quando o presidente é fraco, a economia anda mal e sua popularidade é baixa, facilmente ele se torna uma presa de interesses subpartidários, subrepublicanos, paroquiais.

Num quadro como esse, é compreensível que o poder dos Juizes conspire contra a sua alardeada imparcialidade e que seus julgamentos sejam neutros, técnicos ou ditados pelo respeito à Constituição. Entre a crise de representação política do Parlamento e a fragilidade da base de apoio do Poder Executivo, entende-se o messianismo jurídico que se instalou no imaginário da população brasileira, que ora busca um vingador público ou alguém que governe, faça a máquina do estado andar.

continua após o anúncio

Os juízes podem ter um brilhante curriculum jurídico - como Joaquim Barbosa - e serem indicados pelo partido A ou partido B, mas carecem de legitimidade política e social para decidirem ou governarem o País. O processo da decisão judicial está longe de ser neutro ou ditado pelos comandos constitucionais. Principalmente em países como o nosso, onde a interferencia do sistema político no Judiciário é reconhecidamente grande.

Os juízes votam e decidem de acordo com suas convicções, valores, visões de mundo ou interesses que considram válidos. O magistrado não julga a lide, como um santo diante das questões sociais. O magistrado decide, como uma forma de poder monocrático, que às vezes não dá satisfação nenhuma à sociedade sobre seus julgados. O famoso controle externo do jidiciário só atua em questões administrativas da prestação jurisdicional. E as corregedorias nem sempre cumpre satisfatoriamente suas funções.

continua após o anúncio

Em matéria de transparência, celeridade, acessibilidade e racionalidade, os nossos magistrados deixam muito a desejar. E já houve quem propusesse uma lei para os Juizes, de forma a conferir mais previsibilidade às decisões judiciais. Outros acham que o signo jurídico é, ele mesmo, um signo aberto, polivalente, passível de múltiplas leituras e interpretações. O instituto da Sumula vinculante viria minimizar essa liberdadede julgar dos magistrados.

O fato é que existe quem defenda que a judicialização da política (e da administração) é um mal necessário em razão da fraqueja e o despreparo dos demais poderes. A clássica separação de poderes não corresponderia ao estágio atual da nossa sociedade, que exige cada vez mais decisões adequados e rápidas para múltiplas questões difíceis e intrincadas. Agora, se Joaquim é melhor do que José para apreciar e julgar os denunciados da operação Lava-a-Jato , isso não passa de uma tipo de suspeição lançada pelos partidos sobre o Poder Judiciário, que tende a minar a credibilidade que este Poder ainda tem junto a opinião público, em face da crise política que ora atravessamos no Brasil.

continua após o anúncio

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Este artigo não representa a opinião do Brasil 247 e é de responsabilidade do colunista.

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247