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Jorge Folena

Advogado, jurista e doutor em ciência política.

18 artigos

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A ignorância como estratégia do poder fascista

Análise da magnitude da ignorância manifestada pela horda bolsonarista autoproclamada cristã, que declara apoio irrestrito a Estados que promovem guerras

Silas Malafaia, Jair e Michelle Bolsonaro (Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil)
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No domingo 25 de agosto de 2024, na Avenida Paulista, além do espetáculo de charlatanismo, mentiras e mistificação dos que estiveram no “palco” da manifestação da extrema direita, ficou escancarado o grau de cinismo e negação da realidade dos seguidores do ex-presidente, inelegível e indiciado criminalmente, que, como o covarde que é, em seu pânico diante da hipótese de ser condenado, propôs uma anistia para seus graves delitos. 

Esse comportamento dos apoiadores foi, inclusive, objeto de pesquisa realizada pelos investigadores do Monitor do Debate Político no Meio Digital da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, que apuraram que 88% dos entrevistados  naquela oportunidade acreditam que o presidente Lula não foi o vencedor da eleição presidencial de 2022; sendo a maioria dos participantes homens (62%), brancos (65%), com nível superior (67%), tendo a maioria se declarado católicos (43%), contra 29% de evangélicos, 11% de espíritas  e 10% sem religião. 

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Entre as imagens transmitidas nas redes sociais, uma ganhou repercussão internacional: o vídeo com a entrevista feita pelo repórter Joaquim de Carvalho, da TV 247, no qual três mulheres (brancas, de meia idade e de classe média), enroladas nas bandeiras do Brasil e de Israel, saíram em defesa do Estado israelense, que, segundo elas, seria “cristão”, em clara demonstração de estupidez ou cinismo, pois o atual governo de extrema-direita daquele país está praticando um genocídio contra crianças, mulheres, idosos e civis indefesos, na Faixa de Gaza, sem nenhum respeito aos valores defendidos pelo cristianismo, uma vez que  a violência do exército israelense contra o povo palestino não tem limites e o exemplo mais atual de sua crueldade ocorreu em 29/02/2024, quando soldados atiraram contra centenas de civis famintos e desesperados que tentavam chegar até os caminhões de ajuda humanitária. 

O objetivo deste texto é analisar a magnitude da ignorância manifestada pela horda bolsonarista autoproclamada cristã, que declara apoio irrestrito a Estados que promovem guerras, destruição e exploração pelo mundo, mas devotam ódio desenfreado contra qualquer governo progressista.

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Por isto, proponho esta análise sobre a existência, ou não, de uma autorização constitucional à ignorância, por extensão do instituto da liberdade, uma vez que muitos integrantes da sociedade parecem optar por agir como um rebanho que tudo aceita sem questionar, por quererem manter-se fiéis à ideia de negação desenvolvida pelo fascimo.

Considero essa pauta relevante, tendo em conta os especialistas na manipulação da ignorância alheia presentes no evento do dia 25/02 (o casal Bolsonaro, um governador, um senador e um pastor, entre outros), que mentem e agem para obter vantagens para si e os grupos que representam.

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São pessoas sem nenhuma preocupação ou escrúpulos sobre os riscos a que expõem a coletividade e o funcionamento das instituições políticas. É o que fica demonstrado pela entrevista do filho 03 do ex-presidente, concedida no território dos Estados Unidos ao jornalista de extrema-direita Tucker Carlson, que caracteriza o prosseguimento da ação golpista criminosa, que segue uma agenda internacional fascista.

A afirmação mentirosa do deputado federal por São Paulo de que há “ditadura” implantada no Brasil visa tão somente reforçar a manipulação dos seguidores, especialmente os 94% dos entrevistados na pesquisa mencionada, que acreditam haver um regime de exceção no Brasil.

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Assim, no último dia 25 de fevereiro, representantes do neopentecostalismo apresentaram-se como ícones da nova cruzada protestante, em uma guerra supostamente santa; sendo que, ironicamente, a maioria dos participantes não se declarou evangélicos (29%), mas católicos (43%), segundo dados da pesquisa antes mencionada.

Immanuel Kant, em seu texto “Resposta à pergunta: que é esclarecimento?” afirma que “esclarecimento é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso do seu entendimento sem a direção de outro indivíduo”.

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Então, ao decidir-se pelo caminho da ignorância e da negação da razão, o ser humano opta por um caminho sem direção, que, como ocorreu em diversas passagens da História, poderá levá-lo à destruição e à morte, como propõe o fascismo. 

Os inescrupulosos, que se valem da ignorância, defendem que podem, a partir do direito de liberdade, fazer o que bem entendem, inclusive mediante a propagação de notícias falsas, que distorcem a verdade e criam um ambiente de dúvidas e contradições em temas que atingem diretamente a vida das pessoas numa coletividade.

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Deste modo, por meio de um alegado exercício da liberdade individual e do direito de escolha, nos deparamos com comportamentos nocivos, que trazem em si a capacidade de destruir a democracia liberal e colocar em risco o funcionamento do próprio Estado.

A teoria do utilitarismo inglês, do século XIX, estabelece que a liberdade tem limites e pode sofrer restrições impostas pelo bem comum. Sendo assim, nem tudo é possível ao indivíduo, que, na fruição da sua liberdade, não pode causar mal aos outros integrantes da sociedade. 

Neste sentido, John Stuart Mill, em sua obra “Sobre a liberdade”, afirma que: “O princípio é que a única finalidade que justifica que a humanidade interfira, individual ou coletivamente, na liberdade de ação de qualquer de seus (...) é para evitar que outros sejam prejudicados.”

Ora, defender contra todas as evidências que a terra é plana, que a COVID-19 não é um risco para a humanidade, não apoiar as normas de saúde pública, acreditar que o presidente Lula não foi eleito em 2022 ou apoiar a prática do genocídio em Gaza sob a crença de que o Estado israelense trava uma guerra santa contra o mal no mundo, constitui apego a um comportamento estúpido, de pessoas egoístas e debochadas, a quem a Constituição não protege, pois visa normatizar a existência em sociedade, com vistas ao bem de todos.

Vale ressaltar que o Direito não tolera a ignorância, pois “ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”; da mesma forma, o direito estabelece, na sua aplicação, que “a ignorância da lei não pode confundir-se com o desconhecimento do injusto (ilicitude)”[1], sendo dever das pessoas conhecê-lo no mínimo para conviver harmoniosamente e não vir pedir desculpas e anistia, depois de praticados os delitos, como fez o ex-presidente. 

O sistema de mentiras constitui o método fascista. Assim, eles começam por negar a lei da gravidade, as leis da física, as leis da termodinâmica, a ciência, e, na vida em sociedade, as regras da convivência sadia; depois, passarão a recusar o cumprimento de qualquer lei que considerem nociva aos seus interesses privados. Como, aliás, fizeram os bolsonaristas, que não aceitaram a derrota eleitoral e partiram para o golpe de Estado; ou como faz o governo de Israel na sua trajetória de apropriação das terras palestinas, mediante crueldade, violência e desprezo contumaz pelo direito internacional.

A Constituição protege a vida, a pluralidade, o bem de todos, o progresso, a saúde, a educação, a cultura, a ciência, a tecnologia, a inovação; ou seja, todos os avanços que forem necessários e úteis para garantir a dignidade do homem, princípio fundamental da República.

Sendo assim, não são por ela permitidos comportamentos que levem à morte, à destruição e à violação do Estado Democrático de Direito, como as ideias defendidas pelos propagadores da ignorância como estratégia política, que não merecem, portanto, qualquer anistia, ainda mais porque a tentativa de golpe de Estado de 2023 violentou diretamente a própria ordem constitucional, sendo, por conseguinte, manifestamente inconstitucional qualquer proposta legislativa para anistiar os graves delitos praticados.

[1] STF, AP 595/SC, relator Luiz Fux, julgado em 10/02/2015.

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