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Flávio de Leão Bastos Pereira

Professor, doutor e mestre em Direito Político e Econômico, Pós-doutorado em Direitos Humanos e Novas Tecnologias (Mediterranea Reggio Calabria International Centre for Human Rights Research, Itália). Especialista em Genocídios e Direitos Humanos (Zoryan Institute e University of Toronto, Canada). Professor convidado da Technische Hochschule Nürnberg Georg Simon Ohm (Alemanha).

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O Putsch de Brasília

Da Omissão à Intervenção Federal: um país que aprende pela dor

Bolsonaristas invadem Congresso, STF e Palácio do Planalto. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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 A República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito, tem por fundamento, dentre outros, o pluralismo político; o poder é exercido pelo povo, por meio de representantes eleitos ou diretamente. 

 O excerto acima compõe, em parte, a essência do regime democrático inaugurado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro de 1988 e que foi, na data de 8 de janeiro de 2023, um domingo, alvo de grupos terroristas que, financiados e articulados com movimentações síncronas em outros Estados da Federação, invadiram prédios públicos na capital federal e destruíram importantes símbolos da democracia brasileira, como o Plenário do STF e o Brasão que o guarnece; valiosas obras de arte pertencentes ao povo (https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/01/08/veja-lista-de-objetos-depredados-nas-tres-sedes-do-poder-em-brasilia.ghtml), como a tela “As Mulatas”, de Di Cavalcante e que guarnece um dos salões do Palácio do Planalto; depredaram os prédios que sediam os três Poderes da República e que, a julgar pelas informações iniciais divulgadas pela imprensa, não terão condições de abrigar, em grande parte, os trabalhos diários de seus agentes políticos e administrativos, até porque, constituindo cenas de crimes, encontram-se sob análise da Polícia Federal. 

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 Uma resposta institucional sem precedentes deve ser iniciada esta semana.

 Não chegamos ao dia mais ameaçador para nossa democracia, desde 1985 (início da redemocratização), repentinamente, mas caminhamos dia a dia em direção ao imponderável.

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 Em dezembro de 2022 publiquei pelo Brasil 247 artigo no qual revelava minha percepção com certa “tolerância” para com o extremismo de direita, no Brasil (https://www.brasil247.com/blog/negacionismo-e-tolerancia-com-o-extremismo); antes, em novembro de 2022, também abordei de forma crítica a evidente submissão da democracia brasileira e de nossa Constituição a testes constantes pelo extremismo de direita e seus golpismos (https://www.brasil247.com/blog/a-democracia-e-a-constituicao-colocados-a-prova-o-extremismo-de-direita-e-seus-golpismos), verificando certa tolerância por parte de algumas autoridades e pela própria sociedade.

 A tentativa de golpe de Estado que surpreendeu o Brasil e o mundo neste domingo, 8 de janeiro de 2023 com a invasão dos prédios que abrigam os Poderes constituídos da República (o Putsch de Brasília, como denominei acima), comprova que nossos temores eram procedentes.

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 A experiência internacional vem comprovando já há algumas décadas, mais especificamente desde queda do Muro de Berlim, em 1989, que a maior ameaça à paz mundial vem das ações coordenadas em âmbitos nacionais, mas também na esfera internacional e de forma articulada, pela extrema-direita e seus adeptos radicalizados, inclusive como reconhecido pelo Ministro Barroso, do Supremo Tribunal Federal (https://www.gazetadopovo.com.br/eleicoes/maior-ameaca-a-democracia-hoje-e-a-extrema-direita-diz-barroso/). 

 Assim, não há tinta suficiente para descrevermos os inúmeros exemplos, reiterados, de tolerância e de omissões para com tais grupos radicais, bolsonaristas, nazifascistas etc., que vinham arquitetando nos últimos anos a tentativa de golpe de Estado levada a cabo neste dia 8 de janeiro de 2023.

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 Os discursos antidemocráticos e ofensivos ao regime democrático proferidos desde 2019 pelo anterior Presidente da República, enquanto líder dos mencionados grupos radicais; as absolvições de acusados de manifestações neonazistas por autoridades judiciárias; a tolerância com a manutenção de acampamentos golpistas perante bases militares; a ordem judicial que permitiu a manutenção de um dos mencionados acampamentos em Belo Horizonte, decisão posteriormente revogada pelo Ministro Alexandre de Moraes; a não identificação de financiadores do setor privado e que vêm conferindo suporte econômico aos grupos terroristas que atacaram a capital federal; a chocante omissão da Procuradoria-Geral da República nos últimos anos, diante de tantos ataques à democracia, dentre outros exemplos, encontram-se na causa dos atos golpistas de invasão e de vandalismo nos prédios dos três Poderes, de 8 de janeiro. 

 O ápice dos atos terroristas poderia ter sido alcançado com os vandalismos praticados em Brasília, ainda em dezembro de 2022, quando ninguém foi preso; ou, ainda, com a tentativa de explosão de uma bomba pelo radical bolsonarista George Washington de Oliveira (https://www.metropoles.com/distrito-federal/preparado-para-matar-ou-morrer-diz-bolsonarista-que-armou-bomba-perto-do-aeroporto-de-brasilia). Porém, foram além, de forma sem precedentes na história do país. 

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 Mas, ensina a história que a caminhada rumo à opressão é uma espiral que sempre pode piorar quando o tempo de meias-palavras ou meias-medidas se perder e tal fato não for percebido por quem tenha o dever de agir. 

 No dia 7 de janeiro de 2023, um dia antes dos ataques à capital federal, já era fartamente anunciado pela imprensa que dezenas de ônibus com golpistas rumavam até Brasília, para serem recebidos nos acampamentos em frente ao QG do Exército, na capital (https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/07/onibus-com-bolsonaristas-chegam-a-qg-do-exercito-em-brasilia.htm). 

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 Ainda assim, puderam entrar livremente na capital, tendo inclusive sido “escoltados” pela Polícia Militar do DF (https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/08/pm-escolta-terroristas-bolsonaristas.htm), com alguns agentes flagrados em “conversas” com os extremistas (https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/agentes-da-pm-sao-filmados-conversando-com-manifestantes-golpistas-durante-invasao-no-df/), postura bem distante daquela adotada diante de manifestações de movimentos sociais como, por exemplo, os povos indígenas recebidos com bombas de gás lacrimogênio e muita violência em 22 de junho de 2021 quando pediam o arquivamento do Projeto de Lei 490/2007 (https://www.brasil247.com/brasil/pm-de-brasilia-volta-a-atacar-indigenas-com-grande-violencia-videos). 

 A impensável falta de ação do governador do Distrito Federal Ibaneis Rocha e de seu Secretário da Segurança Pública Anderson Torres, deixaram a capital e os prédios públicos à mercê de uma turba radicalizada e violenta, que destruía o que via pela frente. 

 O Governador Ibaneis demitiu seu Secretário de Segurança Anderson Torres (https://www.brasil247.com/brasil/governador-do-df-demite-secretario-de-seguranca-anderson-torres-que-facilitou-a-acao-dos-terroristas-bolsonaristas), mas foi também cautelarmente afastado pelo Ministro Alexandre de Moraes (STF), com fundamento no Código de Processo Penal em seu artigo 319, inciso VI, que permite ao magistrado impor medida cautelar diversa da prisão consistente na suspensão do exercício de função pública quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais (https://www.metropoles.com/brasil/moraes-manda-afastar-ibaneis-rocha-do-cargo-de-governador-do-df-por-90-dias). 

 Em sua decisão, Alexandre de Moraes é claro em sua fundamentação jurídica uma vez que aponta a necessidade de que o Governador se veja afastado cautelarmente para que não se valha de sua função para prejudicar o andamento das investigações inviabilizando provas ou ameaçando eventuais testemunhas; é, também, muito feliz ao alertar que a omissão das autoridades foram causa do golpe de Estado tentado em  Brasília, recordando uma das memoráveis frases do Primeiro-Ministro Winston Churchill: um apaziguador é alguém que alimenta um crocodilo esperando ser o último a ser devorado. 

 Os golpistas poderão ser denunciados e condenados, em princípio, pelos crimes previstos nos artigos 2º, 3º, 5º e 6º (atos terroristas, inclusive preparatórios) da Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016; e, nos artigos 288 (associação criminosa), 359-L (abolição violenta do Estado Democrático de Direito) e 359-M (golpe de Estado), 147 (ameaça), 147-A, § 1º, III (perseguição), 286 (incitação ao crime), todos do Código Penal brasileiro.

 A inércia do governo do Distrito Federal levou o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva a assinar o decreto de Intervenção Federal na segurança pública da capital, medida cabível para a situação em nosso entender, embora de aplicação excepcional, nos termos do artigo 34, inciso III (para pôr fim a grave comprometimento da ordem pública) e inciso VII, alínea “a” (para assegurar a observância da forma republicana, do sistema representativo e do regime democrático). 

 Em princípio, fundamentou-se a intervenção citada no inciso III, acima transcrito, que deverá durar até 31 de janeiro de 2023.

 A efetivação de cerca de 300 prisões, anunciadas pelo governo, é apenas o inicio de um longo caminho. 

 A tutela da democracia brasileira requer resposta imediata nas searas jurídica, política e histórica, sob o princípio do Estado democrático de Direito. A sociedade brasileira e a comunidade internacional merecem, ainda, explicações.

 As ameaças prosseguem, inclusive com alertas já publicados pela FUP (Federação Única dos Petroleiros) de que grupos extremistas poderão bloquear e atacar refinarias com o objetivo de suspender no país o fornecimento de combustível.

 Como se vê, trata-se de organização criminosa e golpista.

 A democracia brasileira, contudo, sairá fortalecida e amadurecida.

 Importante, contudo, é que a punição dos responsáveis sedimente a experiência necessária à construção de um futuro estável e democrático, com a sociedade pacificada. 

 Sem anistia!!!

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