A dosimetria aplica dose cavalar contra a democracia
O monstrengo aprovado no Senado altera regras do Código Penal e da Lei de Execução Penal. Todas as mudanças visam a beneficiar os golpistas
No afã de criar condições para, de alguma maneira, amputar as condenações pela intentona golpista que culminou nas escabrosas cenas de depredação contra as sedes dos três Poderes no 8 de janeiro de 2023, a maioria do Senado aprovou uma chamada lei de dosimetria flagrantemente inconstitucional e casuísta.
Como apontou o jurista Lenio Streck em entrevista ao painel do programa Boa Noite 247, o texto aprovado está eivado de vícios: foi remetido diretamente à sanção presidencial quando deveria retornar à Câmara, não poderia regular sobre o passado, nem tratar de casos particulares, estando contaminado pela intenção evidente de criar uma lei para privilegiar um grupo de pessoas, sendo inconstitucional, além de tudo, por conter em si instrumento para a fragilização da própria Constituição.
O presidente Lula já declarou que vai vetar o projeto enviado pelo Senado.
Felizmente, o próprio ministro Alexandre de Moraes, que comanda o processo contra os golpistas, vai também relatar o pedido de mandado de segurança contra a votação no Senado, impetrado pelo líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara, Lindbergh Farias. Moraes foi ao ponto crucial da questão ao dizer que “a redução de penas seria um recado à sociedade de que o Brasil tolera ou tolerará novos flertes contra a democracia”.
Na verdade, ao esvaziar, por meio de expedientes viciados, instrumentos legais de defesa do regime democrático, razão maior de ser da Constituição, é a própria democracia, na definição de Streck ao Boa Noite 247, que fica reduzida a algo de segunda mão.
O monstrengo aprovado no Senado altera regras do Código Penal e da Lei de Execução Penal. Todas as mudanças visam a beneficiar os golpistas. Na barriga do monstro, porém, uma repelente perna cabeluda a assombrar o poder do povo: nos assim chamados “crimes de multidão”, as ações contra o Estado democrático de direito passam a ser, na prática, perdoadas, sendo absorvidas pelo crime de golpe de Estado.
Por artifícios como esse, na ânsia de reduzir a pena de Bolsonaro e seu grupo, a democracia mais uma vez é violentada.




