MEC ao 247: “Serra quer politizar o Enem”

Presidente do Inep rebate artigo de ex-governador José Serra; já visto como pré-candidato a governador de São Paulo, tucano registrou no Estadão que Ministério da Educação deveria pedir desculpas a estudantes por polêmica na correção de redações do Enem; "Sim, pedimos desculpas, mas aos milhões estudantes que, antes do Enem, não tinham esse exame para ter acesso ao ensino superior", rebateu reitor Luís Cláudio Costa; amanhã Estadão publicará artigo dele em resposta a Serra; ministro Aloízio Mercadante evitou polêmica

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247 _Visto como candidato a governador de São Paulo em 2014, pelo PSDB, partido que ajudou a fundar, ou pelo PPS, para onde pode ir, o tucano José Serra não perdeu a chance de  cutucar o potencial adversário Aloizio Mercadante, ministro da Educação. Em artigo no jornal O Estado de S. Paulo (abaixo), Serra tomou como tema as redações do Enem que continham erros de ortografia e conteúdos parcialmente fora do tema proposto para cravar que o Ministério da Educação deveria pedir desculpas aos estudantes.

"Pedimos desculpas sim aos estudantes, mas desculpas porque antes eles não tinham esse exame para ter acesso a milhões de vagas no ensino superior", rebateu, em entrevista ao 247, o presidente do Inep – Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa Anísio Teixeira --, Luiz Cláudio Costa, referindo-se veladamente aos períodos de governo de Fernando Henrique Cardoso.

Ex-reitor da Universidade de Viçosa, Costa devolveu a Serra a provocação. "Serra, por quem temos apreço, não deve ter lido o edital do Enem nem ter informações sobre como as provas e as redações, em particular, são corrigidas", disse. "Erros ortográficos não determinam uma nota zero, necessariamente, e fuga parcial do conteúdo proposto também não, se na maior parte da redação o tema tiver sido defendido corretamente", lembrou. O ministro Aluizio Mercadante preferiu não se manifestar em relação à crítica do ex-governador paulista.

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Um artigo com o título As Desculpas do MEC, assinado pelo professor Costa, foi encaminhado ao Estadão. A intenção é responder a Serra em espaço semalhante ao em que saiu a crítica.

"Serra politizou uma questão técnica", afirmou o presidente do Inep, responsável pelo Enem, ao 247. Ele fez suas contas. "De 4,1 milhões de redações, apenas seis foram apresentadas como tendo problemas. Mas mesmo estas foram corrigidas e obtiveram notas de acordo com os critério do edital do Enem, uma peça de acesso universal. Me debrucei sobre essa questão, temos análises detalhadas: os examinadores das redações não erraram".

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O titular do Inep explica que as regras do Enem permitem que "desvios eventuais" não sejam punidos com a perda completa dos pontos em jogo nas redações. O exemplo que ele dá é o do texto que obteve a nota máxima, de 1.000, apesar de ter a palavra trouxe escrita com dois esses no lugar do xis. "A redação é de excelente conteúdo", assegura Costa. "Podemos discutir se, daqui por diante, erros desse tipo passarão a merecer punição e em que grau, mas, diante do edital atual, não havia porque derrubar a nota em razão desse desvio que pode ser considerado eventual".

O representante do MEC igualmente não admitiu problemas nas notas em torno de 500 para duas redações que, em seus conteúdos, apresentavam a letra do hino do Palmeiras, numa, e uma receita para o macarrão instantâneo Miojo em outra. "A punição para essas brincadeiras foi mais severa do que permite a norma de correção", acredita Costa. "Antes e depois de cada desvio do tema, o candidato atacou corretamente o assunto. As provas foram corrigidas por dois examinadores, e ambos deram praticamente as mesmas notas. Não erramos".

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- Mas o MEC resolveu, após a divulgação das redações com problemas, mudar os critérios de correção. Por que, se o sr. diz que não houve erros de correção?

- Estamos aqui para evoluir, não somos arrogantes, responde o ex-reitor da Univeridade de Viçosa. Sobre desvios do tema, vamos punir os que considerarmos que não levaram o exame a sério, até mesmo em respeito aos demais concorrentes. Quanto a questão ortográfica, o assunto pode ter sim um debate mais profundo. As notas mil, np futuro, antes de serem confirmadas, poderão ir para uma banca de examinadores para validação ou não.

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O presidente do Inep lembrou ao 247 que as 4,1 milhões de redações do Enem foram corrigidas por 5,6 mil professores, todos de nível universitário, a maioria com mestrado e doutorado. Cada texto mereceu leituras por parte de dois examinadores diferentes.

"Nossos critérios são rigorosos, transparentes e de acesso universal", acentuou. "Publicamos edital com regras e disponibilizamos os gabaritos e as provas feitas". Como termo de comparação, Costa afirmou que o SAT, o vestibular nacional dos Estados Unidos, nem apresenta o gabarito de respostas certas aos candidatos. "Lá, eles dão as notas e pronto. Ninguém tem acesso à correção nem mesmo ao gabarito. No ano passado, quando os técnicos americanos vieram conhecer o Enem, ficaram positivamente muito impressionados com a nossa tecnologia". Para ele, há uma "análise crítica com lente de aumento negativo sobre o Enem. Repito: de 4,1 milhões de redações, encontraram problemas em apenas seis".

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O professor lembrou que, entre todas, apenas 2.084 mereceram nota máxima. "Temos consciência de que estamos procurando fazer o melhor, mas queremos melhorar sempre".

Abaixo, artigo do ex-governador José Serra:

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O MEC deve desculpas aos estudantes - JOSÉ SERRA

Estamos assistindo a um espetáculo que mostra o improviso, a incúria técnica e o desrespeito com que o Ministério da Educação (MEC) decide a sorte de milhões de estudantes Brasil afora. Provas de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que valem 50% do exame, vieram a público, numa reportagem de O Globo: textos com erros ortográficos clamorosos, como enchergar, rasoavel e trousse, mereceram a nota máxima, de 1.000 pontos.

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Um candidato entediado e brincalhão resolveu incluir um parágrafo ensinando como se prepara macarrão instantâneo. Atribuíram-lhe 560 pontos -56% de eficiência. Outro redigiu quatro parágrafos. O segundo e o terceiro transcreviam o belo hino do meu querido e ora sofrido Palmeiras. Uma beleza em si, que estava, no entanto, fora do lugar. Só o primeiro e o último aludiam ao tema proposto, com conteúdos praticamente idênticos. Mesmo assim, ganhou 500 pontos - ou 50% da prova. Quantos horrores não se repetiram em milhões de provas?

O MEC ainda tentou justificar o desatino na atribuição das notas. Nas redes sociais as milícia ou os mercenários petistas tentavam justificar os critérios e davam curso a teorias conspiratórias: os críticos estariam querendo pôr fim ao Enem. O exame, como evidencia a história, foi criado pelo ministro Paulo Renato Souza, no governo FHC, para avaliar a eficácia do ensino médio e, então, propor ações para elevar a sua qualidade, que sabemos, no mais das vezes, sofrível. Partiu do próprio Paulo Renato a diretriz para que faculdades e universidades passassem a incorporar, de forma descentralizada e autônoma, o desempenho dos estudantes no Enem entre seus critérios de seleção. Em 2002,340 instituições já o faziam. Coube ao" então ministro Fernando Haddad dar uma resposta simples e errada a um problemas difícil: a transformação do Enem no maior vestibular do mundo ocidental. Isso sob o pretexto de que iria acabar com... a angústia do vestibular!

Sem que houvesse infraestrutura adequada e saber acumulado para tanto - até hoje o MEC não dispõe de um banco de questões digno desse nome -, o governo petista decidiu que o Enem funcionaria como prova de seleção para o ingresso dos estudantes nas universidades federais. Os desastres sucederam-se: quebras de sigilo, problemas de impressão, ideologização do exame, arbitrariedade na correção das redações... Tudo isso concorreu, na verdade, para aumentar a angústia dos estudantes, aquela com que pretendiam acabar. O Enem transformou-se, assim, numa grande máquina discricionária, de deboche, que aprova ou reprova alunos segundo a vontade de uma burocracia que não é técnica, não é lógica nem é transparente.

No ano passado assistimos a uma revolta dos estudantes com as notas atribuídas às redações - que decidem, mais do que qualquer prova, a sorte dos candidatos. Já era patente que algo de muito errado ocorria nessa área. E neste ano somos confrontados com o descalabro. Ao menos uma parte dos corretores nada corrigiu. É plausível que nem tenha lido os textos na íntegra. Pior: um dos maiores vestibulares da Terra não dispõe da tecnologia necessária para avaliar a qualidade da correção.

Ora, um exame dessa natureza e com tais características exige uma sofisticada tecnologia de aferição da qualidade do próprio processo. Afinal de contas, trata-se da vida de milhões de estudantes. É razoável - com z e acento agudo - supor que o Enem se transformou numa máquina de selecionar pessoas segundo critérios arbitrários. O exame que deveria servir às reformas no ensino médio se transformou num mau diagnóstico e num vestibular incompetente.

É uma tolice e uma mentira afirmar que os críticos querem pôr fim ao Enem. Até porque, reitere-se, ele não foi criado pelos governos petistas. Como não foi o Bolsa-Família, que eles também herdaram. Mas o PT tem avocação e o talento para se adonar de propostas e programas que não são originalmente seus e depois anunciar que estão sob ameaça. Tenta transformara crítica à sua inépcia gerencial em sabotagem.

Para corrigir erros e desvios é preciso admitir a existência do problema, ter uma vontade de acertar maior do que a arrogância, ser dotado de uma honestidade intelectual maior do que a propensão ao embuste e ter uma disposição para trabalhar maior do que a preguiça. Chamados a dar uma explicação para as barbaridades que vieram à tona, os técnicos responsáveis pelo Enem, sob o comando do ministro Aloizio Mercadante, criaram teorias mirabolantes. Chegou-se mesmo a dizer que os textos estavam absolvidos, pois Miojo e Palmeiras não desrespeitam os direitos humanos...

Um dos fundamentos dos direitos humanos é a igualdade das pessoas perante a lei e o respeito ao mérito de cada uma. Se começa a ficar claro que a prova que vale 50% do exame que decidirá o ingresso ou não de um estudante na universidade sofre a mais escancarada arbitrariedade, se o instrumento que vai hierarquizar a fila dos candidatos a uma vaga depende menos do desempenho de cada um do que dos bons ou dos maus bofes do corretor, se os estudantes têm fraudadas suas expectativas e violada sua esperança de uma avaliação justa, então, pode-se afirmar que estão sendo agredidos os direitos fundamentais dos postulantes - que direitos humanos são, a menos que o ministro da área consiga provar irrevogavelmente o contrário.

Em vez de oferecer explicações esfarrapadas, o MEC precisa pedir desculpas a milhões de estudantes brasileiros. Uma das críticas que o petismo faz às universidades públicas paulistas é a de não aderirem ao Enem em seus respectivos vestibulares. Tenho outra proposta: que o MEC, que transformou o Enem num mega vestibular, aprenda um pouco com o vestibular dessas universidades, por exemplo. Seria mais prudente e construtivo.

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