A juventude perene de Luiz Melodia

O negro roqueiro era e continua sendo subversivo, difícil de rotular, de encaixar nas prateleiras



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Meu irmão conversou com Luiz Melodia depois de um show, em BH, e ouviu dele (claro que cito com a fidelidade possível uma conversa sem gravador ocorrida há mais de dez anos): “Tenho uma obra interessante, tenho talento e se as gravadoras e as rádios não dão valor, elas é que estão perdendo.” Disse isto sem afetar modéstia, conhecedor de seu público, seguro do que semeou. E meu irmão, também músico, soube que, como todos ali, era um privilegiado pelo bom gosto, um membro da confraria (não pequena) de apaixonados por Melodia. É difícil não esnobar pessoas que desconhecem ouro, e ali todos conheciam.

Lembro da primeira vez que ouvi um disco inteiro do Menestrel do Estácio - o “Pérola Negra” (disco de estréia) – ouvi duas vezes seguidas, o vinil lançado no ano em que nasci (‘73), e eu tinha naquela tarde meus 18 anos, o disco parecendo inédito, sem data. Quantos artistas me causaram tanta impressão? Todos admiradores de Melodia que conheço descrevem sua descoberta em termos semelhantes, daí seu publico ser compacto e caloroso,indiferente à rádios que pouco o tocam, às TVs que o exibem esporadicamente, que nos importa?

Luiz Melodia parece concordar conosco: o azar é todo deles.

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As entrevistas o mostram nada bom moço, afirmando seu talento e nele reconhecendo o motor do boicote contra si - “Excesso de talento e ousadia”, declarou certa vez à revista Bizz nos anos’80, discorrendo sobre suas perambulações pelas diversas gravadoras que pouco ou nada fizeram para que seus discos fossem divulgados, seus desentendimentos com a imprensa interessada em folclores pessoais e pouco em seu trabalho, sua recusa em vestir o figurino “sambista de terninho e pandeiro” cobrado por “intelectuais” nos anos ’70.

O negro rockeiro (embora não restrito ao rock, o estilo de Melodia abrange também xotes, reggae, blues, entre tantos gêneros) era muito para mentes estreitas – um atrevimento em si , uma fuga da senzala estética e de atitudes,o negro de jeans, autor de letras sofisticadas (que para primários são simplesmente desprovidas de pé e cabeça) era e continua sendo subversivo, os classificadores esperam submissão a categorias estabelecidas e artistas como Melodia são difíceis de rotular, encaixar nas prateleiras – o boicote sendo a solução, pois.

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O segredo da juventude de Luiz Melodia parece ser precisamente sua posição marginal ao “Mainstream” – a não obediência aos prazos industriais para lançamento de seus discos, e aos esquemas surrados de divulgação que exaurem os artistas, tornando-os previsíveis e repetitivos. Melodia lança discos fiel ao seu ritmo de criação (como declarou na referida entrevista à “Bizz”, “só para nascer se leva nove meses, não tem por que lançar discos todo ano”) e só vai a programas com os quais se sintonize minimamente. Ter um público que não deserta mesmo com dificuldades em encontrar alguns de seus discos e de assistir shows fora dos grandes centros deve ser mesmo rejuvenescedor.

Embora muito de seu repertório em shows seja composto por seus clássicos setentistas, ele não parou seu relógio na década de’70 – tem lançado álbuns interessantes (enquanto escrevo ouço seu precioso “14 quilates” de’97) acompanhado de artistas como Barão Vermelho, entre outros de gerações seguintes à sua, com público que, como eu, estava nascendo quando ele lançou seus discos antológicos e que parece entendê-lo melhor que os jovens dos anos ’70. Não são raros os rappers ou aficionados por rap que o respeitam e admiram.

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Longa vida a Luiz Melodia, que completou 60 anos em 2011 nos presenteando com sua juventude perene.

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