Confusão política, fascismo e caos institucional

O cientista político e colunista do 247 Aldo Fornazieri não acredita em um cancelamento das eleições presidenciais de outubro; "O Brasil precisa relegitimar o comando político quase que desesperadamente. Se a situação política e institucional está caótica, a economia entraria em nova recessão. A não eleições geraria ainda mais incertezas do que a sua realização está gerando", diz ele; "Existe um colapso da noção de autoridade, pois Executivo, Legislativo e Judiciário estão desmoralizados e boa parte dos cidadãos não acredita em saída política. Esta é uma massa disponível para ser manobrada pela ideologia fascista. Daí a urgência de articular uma frente e adotar medidas antifascistas e de defesa da democracia"

Confusão política, fascismo e caos institucional
Confusão política, fascismo e caos institucional


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A confusão política está instaurada no país e perpassa as esquerdas e chega à centro-direita. As esquerdas estão demorando em demasia para formar uma frente antifascista, não para concorrer às eleições, embora isto fosse desejável, mas para defender a democracia e para barrar a violência política que ameaça as suas lideranças. Algumas iniciativas positivas, contudo, se revelaram nos últimos dias: a presença de Boulos e de Manuela D'Avila no encerramento da caravana de Lula e Curitiba e o ato que se fará no Rio de Janeiro com os partidos de esquerda e progressistas em repúdio ao fascismo e em defesa da democracia. Ciro Gomes precisa ser convidado e precisa participar dessa frente.

Mas é nas análises que setores de esquerda continuam a semear confusão. Uns temem que as eleições de 2018 possam não ocorrer. Como já se disse em outros artigos, não há nem ambiente interno e nem internacional para que as eleições não ocorram. O Brasil precisa relegitimar o comando político quase que desesperadamente. Não há a menor condição de continuar com Temer ou com um substituto de Temer para além deste ano. Se a situação política e institucional está caótica, a economia entraria em nova recessão. A não eleições geraria ainda mais incertezas do que a sua realização está gerando.

É improvável que a detenção dos amigos de Temer (com a posterior soltura) tenha força suficiente para afastá-lo do poder. Não porque Temer seja forte. O governo acabou quando foi decretada a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro. Mesmo com o governo acabado, tirar Temer não interessa a um conjunto de forças, notadamente ao PMDB. Tudo incerto com Temer, as incertezas ficariam maiores sem ele. Ninguém vai querer arriscar.

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Note-se que a intervenção no Rio fracassou. Não porque as Forças Armadas sejam incompetentes, mas porque não têm muito o que fazer naquela situação. Foram chamadas, de forma oportunista e eleitoreira, para uma missão que não é sua. Até agora, no período que marca a intervenção, se tem a execução de Marielle e uma montanha de cadáveres.

A centro-direita (PSDB e agregados) está atônita. Não tem credibilidade. As confusões de Alckmin acerca dos atentados à caravana de Lula deixou muita gente perplexa. Depois da execução de Marielle, FHC vê risco de fascismo, de barbárie, o que é verdade, e apela para a unidade. Mas ele e o PSDB foram artífices da quebra do consenso democrático ao apoiarem o golpe. Perdidos, buscam uma tábua de salvação. Sua confusão deverá aumentar se Joaquim Barbosa se tornar candidato.

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Outra confusão se situa nas expectativas em torno dos desdobramentos que envolvem Lula. As esquerdas continuam mobilizando as base em atos convocados para os 45 minutos da vigésima quarta-hora, quando não para a vigésima quinta, como foi o caso da reforma da Previdência. Há uma confiança excessiva de que Lula levará o habeas corpus e que possa ser candidato às eleições. Não se o que fazer se o HC for negado. A única coisa que parece estar corretamente definida, mas que vem sendo questionada por setores petistas, é a de que Lula será candidato até o fim, mesmo que esteja preso.

Mas é preciso não jogar Lula na vala comum de Temer e de outros investigados na Lava Jato. Alguns analistas escreveram que o ministro Barroso, do STF, é inimigo comum de Lula e de Temer. Trata-se de um erro brutal qualquer aliança tática com os criminosos do PMDB - agora MDB - para enfrentar a Lava Jato. Se é para enfrentá-la, o PT e as esquerdas precisam enfrentá-la sozinhos. Sem se misturarem com golpistas.

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Lula deve ser defendido porque é inocente e porque foi condenado sem provas. Já, Temer e sua quadrilha, vêm cometendo crimes de corrupção no Porto de Santos há anos, segundo investigações. Não deve ser defendido. Se são vítimas de erros judiciais, que se defendam. A confrontação à Lava Jato deve ser feita pelos seus erros e não por seus acertos. Deve ser confrontada pelo seu caráter persecutório, pelos seus atos de exceção e pela violação dos direitos e das leis. O jejum de Dallagnol para ver Lula preso, além de ser ridículo, prova, mais uma vez, o caráter persecutório da Lava Jato. É urgente, contudo, que as esquerdas se reapropriem da bandeira do combate à corrupção - inclusive da corrupção do Judiciário, nas várias formas e na forma de seus privilégios - por todos os danos que a corrupção causa ao povo e ao país.

Base paramilitar do fascismo

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Não resta dúvida de que os grupos que se articulam em torno da candidatura Bolsonaro, do MBL, do Vem Pra Rua, do Ceticismo Político e de outros movimentos, estão constituindo as bases políticas do fascismo no Brasil. Mas a execução de Marielle e os atentados contra a caravana de Lula estão indicando que o fascismo está passando de uma fase política para uma fase paramilitar. Dois grupos armados são facilmente mobilizáveis para constituir milícias paramilitares fascistas: 1) os milicianos, particularmente no Rio de Janeiro, e grupos de policiais militares e civis que atuam à margem da lei ou na linha limítrofe entre o legal e o ilegal em vários estados; 2) fazendeiros e agroboys, que sempre foram armados.

Numa situação de caos político e institucional, de anomia social, de crise econômica e, diante da percepção de que dificilmente a extrema direita chegará ao poder pela via das eleições, a opção paramilitar poderá ser incrementada. E, mesmo admitindo-se a hipótese, hoje improvável, de vitória de Bolsonaro, a organização de milícias paramilitares fascistas seria ainda mais facilitada. Existe um colapso da noção de autoridade, pois Executivo, Legislativo e Judiciário estão desmoralizados e boa parte dos cidadãos não acredita em saída política. Esta é uma massa disponível para ser manobrada pela ideologia fascista. Daí a urgência de articular uma frente e adotar medidas antifascistas e de defesa da democracia.

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Caos Institucional

Depois que a crise varreu o Executivo e o Legislativo, o Judiciário se instituiu em artífice do caos constitucional e institucional. Era o único poder que poderia usar o freio de arrumação. Mas ao invés disso, soltou o freio e jogou o país rumo ao abismo. Validou e ele mesmo promoveu inúmeros ataques à Constituição: não reagiu a um impeachment sem crime de responsabilidade, chancelando o golpe; de forma inescrupulosa, o STF, com o prego derradeiro de Cármen Lúcia, abriu mão do poder de controle constitucional da própria Corte para salvar Aécio Neves, conferindo poder judicial ao Senado; contra a Constituição, validou a prisão após condenação em segunda instância derrubando o princípio da presunção de inocência; no caso Maluf, dois ministros negaram o habeas corpus e um o concedeu; Cármen Lúcia se negou a colocar novamente em exame o instituto inconstitucional da prisão após segunda instância por interesse pessoal de prejudicar Lula; uma turma do STF mantém a prisão de condenados em segunda instância e a outra manda soltá-los, e assim vai. São dezenas de atos ilegais e contra a Constituição cometidos pelo STF e por juízes de tribunais inferiores.

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É preciso perceber o seguinte: qualquer Suprema Corte tem o poder de criar norma onde há vácuos, fendas, na Constituição e nas leis. Mas nenhuma Suprema Corte pode criar normas contra a Constituição, contra sua letra e contra o seu espírito, sua intenção e seus princípios. O STF está criando normas contra a Constituição, está interpretando contra o espírito e a letra da Constituição e está julgando contra a Constituição. Isto é o fim da ordem constitucional. É o caos institucional.

O fim, a desmoralização da autoridade constitucional e judiciária é campo fértil para o crescimento do fascismo. Neste momento trava-se uma luta tenaz entre a democracia e o fascismo. Se os democratas forem ingênuos, se acreditarem num judiciário corrompido, desmoralizado e tomado de ideologia, o que resta de democracia correrá riscos terríveis. Por outro lado, não se pode crer que os fascistas utilizarão métodos democráticos e pacíficos na luta política. É preciso preparar-se e organizar-se para detê-los.

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