A transferência de Lula. Ou a síndrome do petista convencido

A única avaliação eleitoral possível de ser ouvida hoje sem causar algum ruído aos ouvidos é "estou convencido que Lula efetivado como candidato estará no segundo turno". Fora essa, entramos no terreno da previsão ou do "eu acho"

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lula (Foto: Celso Marcondes)


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"Eu estou convencido: se Lula for impugnado, qualquer candidato apoiado por ele vai pro segundo turno".

A frase, dita por uma importante liderança do PT, me veio aos ouvidos no intervalo de um evento. Faz quase um mês, mas passei a ler e ouvir o mesmo raciocínio com mais intensidade. Já não são poucos os "convencidos" por essa inevitabilidade do pensamento contemporâneo.

O "eu estou convencido" aparece com frequência nos discursos de Lula. Ele costuma usar a frase para abrir a apresentação de ideias bem solidificadas. Por exemplo: "Eu estou convencido que o meu governo realizou o maior conjunto de programas sociais de combate à fome e à miséria da história deste país ". Claríssimo, verdade factual, como diria um jornalista amigo meu.

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Às vezes, porém, é pura retórica ou simples vício de linguagem. Versado na arte do bem falar, Lula também usa o "estou convencido" como artifício para chamar a atenção sobre questões para as quais ele vai apenas expressar a sua opinião, sem apresentar uma verdade inconteste.

O problema é que muito petista de carteirinha passou a usar a frase a torto e a direito, como dizia minha mãe.

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Ora, quem nos dias turbulentos de hoje pode afirmar que é "certeza" o PT, sem Lula, ir para o segundo turno? De onde tiraram isso? Das pesquisas, seguramente não foi. Pois ao mesmo tempo em que essas mostram a possibilidade de boa parte dos potenciais eleitores de Lula apoiar um candidato indicado por ele, também deixam evidente o enorme desalento que reina nas ruas, combustível sólido para engrossar o potencial de abstenções, votos nulos e brancos. Desalento que é amplificado, dizem os números, se o nome de Lula for eliminado das cédulas.

As pesquisas também apontam que Ciro Gomes colhe benefícios da supressão arbitrária de Lula na disputa. E, as pesquisas não medem, entre a chamada "classe média progressista" de São Paulo, Guilherme Boulos transita, legitimamente, com uma certa facilidade.

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O petista convencido abstrai parte das informações fornecidas pelas pesquisas, assim como relativiza a gravidade da situação do país. Daí conclui que "a transferência" de Lula já garantiria ao menos uns 15% dos votos a qualquer candidato.

Pode ser que isso aconteça? Sim, pode ser, mas não há nenhuma base para afirmar isso como uma certeza.

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Em junho de 2018 há outros quatro candidatos com índices próximos a 10% quando Lula é retirado do pleito. Além deles, uma quantidade significativa de eleitores reafirma sua confiança apenas e tão somente em Lula.

Hoje nenhum outro candidato unifica o PT, tampouco desperta qualquer tesão na sua militância. Pode ser que com um chamamento de Lula isso ocorra no futuro próximo. Pode ser, mas as variáveis são múltiplas, nada seguras. E pode não ser suficiente. Não foi para a eleição de Haddad em 2016 em São Paulo.

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Cravar "Lula será presidente ou então um outro apoiado por ele" pode até sugerir uma defesa envergonhada do chamado "Plano B". "O segundo turno é nosso de qualquer jeito", vaticinam.

A situação do país é absolutamente caótica em todas os terrenos. As liberdades democráticas são aviltadas a cada dia. O Partido da Justiça não está em recesso e vai produzir novos fatos. Várias categorias profissionais ameaçam greve, os caminhoneiros não estão satisfeitos com o andor dos acordos. Vai ter Copa, mas está difícil dela encantar o povo.

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Até outubro, tudo pode acontecer num Brasil sem governo, em profunda crise econômica e sem um candidato forte a unificar o dito "mercado".

A única avaliação eleitoral possível de ser ouvida hoje sem causar algum ruído aos ouvidos é "estou convencido que Lula efetivado como candidato estará no segundo turno". Fora essa, entramos no terreno da previsão ou do "eu acho".

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A previsão é livre. Mas só o psicótico tem certeza sobre tudo. A certeza, quando não há base sólida para ela, trava o diálogo com aqueles que têm dúvidas, impede de ouvir e, pior, inibe ou desvia o foco da ação. Faz bem sustentar uma certa ignorância.

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