A legião dos "novos" ataca em defesa da Previdência de Guedes

Entre os privilegiados não há quem abra mão dos benefícios da Previdência própria. Com isso a Previdência é a maior fonte de desigualdade no país, diz ele. E a oposição parece não saber nada disso porque desconhece os números da proposta

A legião dos "novos" ataca em defesa da Previdência de Guedes
A legião dos "novos" ataca em defesa da Previdência de Guedes (Foto: Antonio Cruz - ABR)


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O questionamento de um jovem parlamentar sobre o projeto Guedes da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara ofereceu nesta sexta o que deve ser um retrato vivo dos novos deputados e senadores eleitos na onda de faca de Jair Bolsonaro. Vi o vídeo, mas, infelizmente, não encontrei quem identificasse o autor. Por isso, vou nomeá-lo como jovem parlamentar. Pelos pontos do discurso que anotei, é provável que alguém o aponte nominalmente. Entretanto, caso contrário, é possível que não tenha mesmo nome. Direi então que atende por legião.

O jovem parlamentar, ou legião, não sabe defender. Continua no ataque indiferenciado exercido com sucesso na campanha. Segue rigorosamente a escrita de Bolsonaro e de Guedes ao atacar a oposição ao projeto e os privilégios corporativos da Previdência atual, inclusive dos próprios parlamentares. Para ele, são os pobres que financiam os custos previdenciários. E entre os privilegiados não há quem abra mão dos benefícios da Previdência própria. Com isso a Previdência é a maior fonte de desigualdade no país, diz ele. E a oposição parece não saber nada disso porque desconhece os números da proposta.

O discurso, convenhamos, é ótimo, embora se esqueça que, no período de Lula, o Brasil foi o país no mundo que mais reduziu desigualdadees. Poderia perfeitamente ter sido pronunciado durante a campanha eleitoral junto com a catilinária verbal fragmentada característica da legião de bolsonaristas. No caso, porém, há outro problema. A reforma de Guedes não trata de privilégios. Manhosamente, para proteger seu objetivo central - o regime de capitalização a ser imposto a novos e velhos trabalhadores -, o tema dos privilégios só aparece nela indiretamente. Legião está levantando uma questão que Guedes voluntariamente deixou fora de pauta, para não se incompatibilizar com as elites. Quanto aos militares, ele já acertou.

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O jovem parlamentar, ou legião, reclama da oposição que não sabe números. Será que é realmente necessário manipular números, como Guedes com a poupança de 1 trilhão de reais da capitalização em dez anos, para concluir que o regime de capitalização liquidaria com a Previdência pública? Vejamos. O novo trabalhador se apresentaria a seu primeiro emprego e ouviria do patrão a pergunta crucial: você quer que eu assine sua carteira de trabalho tradicional ou a carteira verde amarela de Guedes? A tradicional, claro, pois me dá mais direitos, dirá o trabalhador. Então, tchau. Diz o patrão. E chama outro da infindável fila de 13,5 milhões de desempregados no país para que assine a pornográfica carteira apelidada de verde amarela por Guedes.

A situação não seria diferente para o trabalhador já empregado. Se a reforma passar, ele poderá ser sumariamente demitido como condição do patrão para re-empregá-lo caso aceite o novo registro pela carteira de Guedes. O patrão teria um incentivo óbvio para impor a nova carteira. Deixaria de ter que fazer as contribuições dele e dos empregados para a Previdência assim como não pagaria outros direitos trabalhistas. Já o empregado perderia os direitos à Previdência pública e seria empurrado para o regime de capitalização - uma espécie de caderneta de poupança individual, só que administrada pela banca, e sujeita a riscos e perdas especulativas ao longo do tempo sem a proteção de garantia do governo.

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Aparentemente o jovem parlamentar, ou legião, não sabe disso ou não conseguiu tirar conclusões inteligentes da reforma de Guedes, não obstante estarem visíveis para o pessoal da oposição e mesmo para mim, enquanto economista independente. Talvez legião esteja inebriado com a promessa cínica de Guedes, segundo a qual a carteira verde amarela dará ao trabalhador liberdade de escolha, no mais puro sentido neoliberal do conceito. A mesma liberdade de que gozava o escravo do século XIX que era desembarcado em Valongo. E que na nova configuração rende 1 trilhão de reais para a banca.

Legião assume uma crítica feroz da proposta de imposto sobre grandes fortunas reclamado há décadas, sem resultado, por progressistas da sociedade civil e do Parlamento. Segundo ele, se o imposto fosse adotado, não adiantaria, pois um dia iria acabar. Vamos seguir esse argumento tosco. Acaso a economia, depois do primeiro ciclo de adoção do imposto, não geraria novas fortunas? Acaso fazer fortuna não faz parte da dinâmica normal do capitalismo? Ou temos de continuar subsidiando as grandes fortunas com impostos muito inferiores ao que se aplica à renda do trabalho no mais iníquo processo de concentração de renda do mundo?

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O curioso no discurso de legião é que ele não cuida muito de defender aspectos da reforma de Guedes, concentrando-se sobretudo em atacar a oposição. Alega, com razão, que a inflação corrói as aposentadorias, sendo que este seria o maior dos males para o aposentado, esquecendo-se do fato de que pior que a inflação é o desemprego e a queda do PIB, sendo que a reforma não dá nenhuma contribuição à retomada da economia num ritmo que reduza efetivamente o desemprego. Ou seja, esse discurso do jovem parlamentar é uma fraude do tamanho da reforma de Guedes. Só tem uma desculpa: ele é um jovem parlamentar, representando a boçalidade típica de pós-adolescentes!

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